Vasco e Bangu estiveram na linha de frente do combate à discriminação racial no futebol

Quinta-feira, 02/02/2017 - 13:41
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Infelizmente, ainda hoje no futebol vemos atos racistas em estádios dos mais diversos locais do mundo. Um crime que mancha o esporte mais popular do planeta. Porém, essa luta sempre conta com jogadores, dirigentes e a maioria dos amantes do futebol, que tentam acabar com a prática lamentável. Mas, os casos de preconceitos raciais já foram bem maiores, mas dois clubes cariocas deram o ponta pé inicial para esse monstro ser derrotado: Bangu e Vasco, que se enfrentam nesta quinta (2), pela segunda rodada da Taça Guanabara.

A história conta que o futebol foi trazido para o Brasil em 1895 por Charles Miller, após uma viagem de estudos à Inglaterra. No mesmo ano, houve o que é considerado o primeiro jogo no país, entre funcionários da São Paulo Gás Company e da estrada de ferro São Paulo Railway, que venceu o amistoso por 4 a 2. Ainda em 1895, os clubes começaram a ser fundados, mas a prática era restrita às pessoas brancas, com descendência européia.

Os mais pobres e negros eram impedidos de praticar e podiam apenas assistir às partidas, isso, se estivessem em lugares separados dos brancos. No início do século XIX, não era comum negros terem espaço nos gramados brasileiros. O primeiro caso considerado de um clube no Brasil que escalou um atleta negro em sua equipe foi a Ponte Preta (SP), em 1900.

Quatro anos depois, no dia 17 de abril de 1904, era fundado por ingleses que trabalhavam na Companhia Progresso Industrial do Brasil, na fábrica de tecidos do bairro, o Bangu Atlético Clube. No ano seguinte, o Gigante da Zona Oeste teve o primeiro negro a entrar em campo em sua história gloriosa. O time alvirrubro era formado por cinco ingleses, três italianos, dois portugueses e um brasileiro, o operário negro Francisco Carregal, que era muito bem tratado pelos demais companheiros, e era considerado um dos xodós da equipe.

Alguns meses depois de sua fundação, o Bangu colocava, sem restrições, operários e negros no time, misturados aos ingleses. A equipe banguense abria suas portas para outros jogadores como Carregal, a exemplo do goleiro Manuel Maia. O Alvirrubro também aboliu a distinção entre os torcedores nos estádios. Na maioria dos campos de futebol, pobres e negros não podiam assistir aos jogos nas arquibancadas, espaço reservado aos brancos da alta sociedade. O Gigante da Zona Oeste decidiu não compartimentar o público de seus jogos em espaços separados.

O Bangu foi campeão carioca da segunda divisão em 1911 com quatro negros e seis operários na equipe. Entre 1907 e 1909, o Alvirrubro preferiu manter os negros no elenco e se afastar da Liga Metropolitana de futebol, em virtude de uma mensagem racista enviada ao clube que dizia o seguinte: "Comunicamos-vos que o Diretório da Liga resolveu por unanimidade que não sejam registrados como atletas pessoas de cor".

Vasco foi primeiro clube do Brasil a ter um presidente negro

imageMuitos acreditam que o Vasco foi o primeiro clube do Rio de Janeiro a ter jogadores negros em sua equipe, mas de fato, esse título é do Bangu, que permitiu a entrada de negros em sua equipe em 1905, enquanto o Gigante da Colina só teve esse prazer na década de 20, até porque o clube só começou a suas atividades futebolísticas em 3 de maio de 1916. Porém, o Cruzmaltino foi a primeira instituição brasileira a ter um presidente negro.

Em 1904, os sócios do Vasco, numa atitude inédita até então no Brasil, elegeram para a presidência do clube Cândido José de Araújo (imagem ao lado), um negro, que foi reeleito para o cargo em 1905. Foi durante a sua presidência que o Gigante da Colina conquistou seu primeiro campeonato de remo, esperte pioneiro no clube.

Exclusão por não aceitar retirar negros de sua equipe

O Vasco muitas vezes leva a fama de ser o pioneiro no país a abrir espaços a atletas negros pelo fato de ter conquistado a competição mais importante entre os primeiros clubes a permitirem a presença destes atletas em suas equipes. O Cruzmaltino saiu da Terceira Divisão, para conquistar o título da Primeira Divisão do Carioca em 1923, com quatro jogadores afrodescendentes no time.

Pelo fato de o Vasco ter sido campeão, times adversários como America, Botafogo, Flamengo e Fluminense fundaram outra entidade para administrar o futebol e excluíram o Vasco, que respondeu com uma carta intitulada como, "Resposta Histórica", na qual defendeu seus jogadores e mostrou sua disposição em lutar contra o racismo.

imageIndignados com a vitória dos vascaínos, America, Botafogo, Flamengo e Fluminense tentaram eliminar os negros do futebol, alegando que estes, por serem humildes, se sustentavam do esporte e seriam profissionais, algo que não era permitido na época, pois o esporte no Brasil ainda vivia no amadorismo. Com medo de represálias, o Bangu, pioneiro na luta contra o racismo no futebol carioca, se adequou à determinação. Já o Vasco lutou por seus atletas e não aceitou expulsar os afrodescendentes do elenco. Com isso, ficou de fora do Campeonato Carioca de 1924 e não pôde defender seu título.

A atitude vascaína foi reconhecida em 1925. Vendo que o Vasco ganhou grande popularidade em todo o Brasil por conta de sua luta contra o preconceito racial, os clubes acabaram com a determinação de excluir os negros e a equipe vascaína foi reintegrada ao futebol carioca.

Envolvidos por um história de luta por igualdade racial, Bangu e Vasco se enfrentam nesta quinta-feira (2), às 16h30, em Moça Bonita. A Rádio FutRio transmite o jogo ao vivo.




Fonte: FutRio