Dorival fala da relação de clubes com técnicos, tentativas de contratação e momento do Vasco

Domingo, 25/08/2013 - 09:46

É de 20 de abril de 1993 a lei 8.650, sancionada pelo então presidente Itamar Franco, que regulamenta a relação de trabalho dos treinadores profissionais de futebol no Brasil. Nos nove artigos da lei, alguns poucos direitos, como a ampla e total liberdade na orientação técnica e tática da equipe e o apoio e a assistência moral e material assegurada pelo empregador, além de dois deveres apenas: zelar pela disciplina do grupo e manter sigilo profissional. Na época, há 20 anos, Dorival Júnior ainda era jogador de futebol e já fazia críticas à insegurança da função de técnico, ocupação que ele exerce há 10 anos. Do início, no Figueirense, em 2003, até a sua segunda passagem pelo Vasco, o discurso chegou próximo à uma indignação com a condição dos treinadores no futebol brasileiro.

Dorival encabeça o grupo de treinadores – como Vagner Mancini, Caio Júnior, entre tantos outros – que fundaram na semana passada a Federação Brasileira de Técnicos de Futebol. Entre as ideias, está a criação de um código de ética entre os profissionais e, ainda, uma série de sugestões que melhore a relação entre clubes e treinadores no país, onde, para Dorival, não existe respeito para com os técnicos.

- No futebol brasileiro, infelizmente, vivemos uma prostituição muito grande – diz o treinador.

O termo é forte, mas se explica quando o próprio treinador cita casos que tomaram conhecimento no processo de criação da FBTF de técnicos que não têm contrato, não recebem nada pelas rescisões e são tratados apenas como profissionais descartáveis. Dorival provoca a imprensa para assumir sua parcela de culpa na “estupidez” (outro termo usado pelo treinador) da relação, compara a realidade brasileira com a europeia - embora observe um processo de rotatividade que chega próximo ao futebol brasileiro -, mas também admite que os salários dos técnicos de ponta são díspares num país que ainda vive em desigualdade social.

A entrevista com Dorival Júnior, realizada antes do treinamento do Vasco da última sexta-feira, no hotel da delegação vascaína em Brasília, é dividida em duas partes. Sobre o time vascaíno, que na tarde deste domingo enfrenta o Corinthians, o treinador faz algumas revelações. Ele admite que esperava a contratação de Emerson Sheik, que esteve muito próxima, conta que houve a tentativa pela contratação de Paulo Henrique Ganso, por empréstimo, com o São Paulo, e ainda diz que na sua chegada houve sim a preocupação de sair o quanto antes do risco de rebaixamento. Em 11º lugar, com 19 pontos, o fantasma ainda está na mente de Dorival.

- Deve ser uma preocupação de todos times. Ninguém pode dar bobeira – diz o treinador.

Confira a íntegra da entrevista com Dorival Júnior, treinador do Vasco.

GLOBOESPORTE.COM: Na criação da federação de treinadores, vocês levaram em conta a lei de 1993, que é do uma lei de apenas nove artigos, que parece bem básica? O que vocês pretendem acrescentar à lei e à discussão?

Dorival Júnior: Sim, conhecemos essa lei. E ela é bem subjetiva, né? A fundação da Federação foi no sentido de atacarmos alguns pontos que estão sendo muito claros nos últimos anos na vida de um profissional. Primeiro, a gente quer criar um código de ética. Isso é o principal, porque se não nos respeitarmos como profissionais, como e por que vamos exigir respeito? Esse é o primeiro ponto a ser atacado. A ideia geral é criar condição para que o profissional brasileiro seja respeitado, o que não vem acontecendo infelizmente. No futebol brasileiro, infelizmente, repito, vivemos uma prostituição muito grande. E acabam acontecendo “n” fatos envolvendo profissionais, pessoas envolvidas, empresários e agregados, pessoas que interferem diretamente no andamento de um trabalho.

Pretendem então acrescentar algo nessa relação de trabalho, via leis no Congresso Nacional?

Sim, nossa ideia é criar um novo texto, algumas novas leis. Isso tudo tem sido trabalhado com um departamento jurídico que já temos. Foi disponibilizado um e-mail para que todos possam fazer sugestões e acrescentar alguns pontos. Depois, temos que levar tudo isso a um deputado que possa encaminhar o texto para uma votação. Estamos tentando a aproximação com alguns ministros de Estrado para que tentemos diminuir esse prazo, logicamente quando o texto estiver concluído. A ideia é que isso seja logo votado. A lei atual é muito aleatória. Queremos complementá-la.

Alguns pontos das propostas de vocês falam em combater a alta rotatividade e nova forma de regularizar o pagamento de dívidas com os técnicos, além de pagar tudo o devido no contrato no ato da rescisão. Isso é muito raro hoje em dia, não acha?

Com relação a esse item (de pagamento de rescisão no ato), temos outras sugestões que estão sendo estudadas. A ideia é que a partir do momento em que houver o desligamento do profissional, que logo haja o acordo e depois, só a partir de ser homologada essa rescisão, só então o clube pode contratar outro profissional para colocar no lugar. Inclusive sem poder colocar um treinador dos juniores para assumir. Mas claro que isso precisa ser um processo rápido. Saiu, tem a lei, define como vai ser pago, acordo feito e homologado, acabou! Não que vá pagar tudo de uma vez, isso não existe, sabemos que não vai acontecer. Agora, queremos que se respeite um pouco mais o profissional. Não queremos holofotes, valorização, nada, só respeito profissional, o que não existe, infelizmente. Tudo gira em torno do treinador, tudo é responsabilidade do treinador, então fica uma situação muito cômoda. Para o jogador, ele sabe que a qualquer momento vai trocar o treinador, então ele fala: “ah, deixa, hoje eu não sou titular, amanhã ele vai cair e eu vou voltar a brigar”. Para a diretoria também é simples, porque tudo que envolve o time é da responsabilidade do treinador. E para os próprios treinadores (fica cômodo), porque fica essa rotatividade acentuada nos clubes. E fica aquela situação, de logo em seguida de dois, três resultados negativos, ter sempre alguém, até sem conhecimento do profissional, às vezes, oferecendo o nome do treinador. Mas muitas vezes ele também fica sabendo. Isso tem que acabar. Ou o futebol brasileiro coloca alguns pontos que devem ser respeitados ou vai continuar essa mesmice, sem você conseguir se sentir confortável no trabalho, sem conseguir desenvolver um trabalho. Quem executa não pode ter essas incertezas, essa insegurança que a gente convive. Então o trabalho na realidade é o que menos importa. Nós temos que fazer resultados, do dia para a noite, não importa de que maneira.

Um ponto que você tocou, de comodidade, não esbarra também no diretor executivo, que foi um profissional que surgiu também para melhorar essa relação do treinador com os dirigentes amadores? Acha que melhorou a relação?

Acho que melhorou, houve uma evolução nessa confiança. Mas a passionalidade ainda fala mais alto. O número de pessoas agregadas, entre presidente, diretores, conselheiros, é mais forte. E muitas vezes o diretor não quer tomar a posição que é tomada. Então tem que ser fortalecida a posição dos diretores executivos também, tendo mais liberdade para que esses profissionais possam fazer um trabalho.

Hoje há um processo também de ex-treinadores virarem diretores, como René Simões foi no Vasco mesmo, o próprio Ricardo Gomes agora, o Antônio Lopes, no Atlético-PR e até Leão outro dia cogitou essa possibilidade. Isso pode ser um fator positivo?

Acho que é um caminho. Mas o cara não pode achar que só por ser treinador ele vai exercer outra função por causa do conhecimento anterior. Lógico que é importante a vivência de treinador de vestiário, como é a experiência daquele treinador que era atleta. Com certeza vai ter ganho maior, porque ele já conhece a prática, o vestiário, as dificuldades. Vejo um avanço muito grande, com a chegada dos executivos no futebol.

Pelo que entendi, sua sensação é de que o diretor executivo, muitas vezes, precisa engolir algumas decisões dos dirigentes amadores, mesmo no departamento do qual cuida. Na hora de manter um técnico, por exemplo.

Não só para manter um técnico, mas para confirmar contratações, outras coisas. O poder político do clube ainda é muito maior. Desde o presidente, da diretoria e dos pseudo-conselheiros, que pressionam, que vivem da passionalidade, do resultado da quarta e do domingo, que não acompanham o trabalho, que não têm noção do que se passa num treino. Acho que isso tudo tem ser superado para que o futebol possa evoluir. É preciso modificar essa estrutura arcaica que existe.

Os treinadores de clubes menores, do interior, sofrem ainda mais dificuldades? Li declarações suas a respeito da preocupação de uniformizar essa relação.

Exatamente, esses vivem muito mais dificuldades. Tive sorte de começar em clube de série A, no Figueirense. Era auxiliar técnico do Muricy Ramalho por seis meses, depois fui diretor de futebol e tive a oportunidade de iniciar com um grupo que tinha praticamente definido, porque não houve consenso à época para contratar técnico. Mas em clubes pequenos é muito pior. Muitas vezes, eles (os treinadores) não recebem nada na rescisão e na maioria das vezes não são nem registrados, não podem nem buscar seus direitos. Essa é realidade. A criação da FBTF é muito mais direcionada aos profissionais que estão iniciando, começando, indepdententemente se na séria A, B, C ou D, será mais importante para eles do que para aqueles que já têm caminho traçado, um caminho desenvolvido. O que vai valer para um, vai valer para todos. Tudo vai ser exigido na mesma proporção, com certeza vai ser um ganho considerável essa modificação de padrão de respeito que, na realidade, inexiste nesse país.

Agora, na Europa também vemos uma certa instabilidade para trabalho de treinadores. Evidentemente que há as exceções, como do Arsene Wenger, no Arsenal, do Alex Ferguson, no Manchester, como aqui também há com Tite, Cuca, Oswaldo de Oliveira. Não acha?

É, acho que a Europa vem se utilizando de um artifício que se parece muito com o brasileiro. Isso não é bom. Os grandes trabalhos lá e aqui foram desenvolvidos quando houve um bom tempo de permanência. Um exemplo de como aqui o tempo não é minimamente respeitado. Há pouco tempo houve a aposentadoria do Ferguson, um dos mais vitoriosos, um dos mais respeitados treinadores. Ele assume em 1986 o Manchester United e a primeira conquista só vem na temporada de 89/90. Ele passou 1986, 1987 e 1988 e ganha o primeiro título, que não é a o da Liga Inglesa ainda, na temporada 1989/1990. Levanto uma questão: ele levou de três a quatro anos para estruturar um trabalho dentro desse clube. Que treinador brasileiro passaria não do terceiro, quarto ano, mas do terceiro, quarto mês, se não houvesse uma conquista de um título regional? Olha só a cultura. Ou melhor, a falta de cultura do nosso futebol. Olha o quanto é danoso para clubes, profissionais, para todo mundo. Acho que, nesse aspecto todo, a imprensa brasileira tem uma participação muito grande. Há intolerância e a impaciência, coisa muito grande. Isso eu já dizia antes, quando ainda era atleta. Parei em 2000, mas já falava sete ou oito anos antes, sempre debatia esse assunto. Então de lá para cá, a cultura da crítica, ela, na minha concepção, praticamente se iniciou dentro do futebol. Não falo isso em defesa própria, porque graças a Deus nunca discuti com ninguém, nunca tive atrito com ninguém (da imprensa) nesses anos todos. Trabalhei em vários estados, onde senti a combatividade que existe, mesmo assim nunca respondi. Meu interesse é de mudar o futebol, não quero dar recado para ninguém. Muito pelo contrário, estou num clube que me propicia uma condição de trabalho e poderia muito bem ficar quieto. O interesse é de tentar mudar essa concepção do futebol, todos nós temos que dar uma parcela nisso. O futebol brasileiro vem caindo a cada ano e todos nós que vivemos do futebol e fazemos parte de uma maneira ou de outra, direta ou indiretamente, não assumimos a responsabilidade. Chamo a atenção da imprensa de um modo geral que modifique essa maneira de pensar, está na hora de dar uma mexida em tudo isso. O futebol tem cosias muito maiores para serem debatidas, melhoradas, trabalhadas, do que essa cultura de se tirar treinador toda semana. Até a 10ª rodada foram 10 treinadores que saíram dos seus clubes na Série A do futebol brasileiro. Ou seja, será que não estamos fazendo alguma coisa errada ou será mesmo que ninguém presta? Um treinador que foi campeão brasileiro, que teve oscilações de resultados de três, quatro, cinco rodadas, será que não serve mais, será que desaprendeu? Refiro-me ao Abel Braga, no Fluminense, que para mim é uma grande referência.

Agora, o próprio Abel disse que, se fosse dirigente, ele também demitiria o treinador. Disse que, de certa forma, concordava com a demissão. Não é difícil para o dirigente ver que o time não reage, como parecia ser o caso do Fluminense?

Sim, verdade, isso acontece. Aconteceu comigo no Atlético-MG (2011). Chegou um momento em que eu mesmo reconheci que não tinha mais o que fazer, porque não conseguia mais tirar de onde para melhorar o time. Citei Abel apenas como exemplo de treinador vitorioso, que, em três ou quatro meses, se inverteu completamente a avaliação, as coisas do clube, sem que saibamos o que houve lá dentro. O ritmo de trabalho continuou o mesmo? O que ele pediu foi feito ou não foi feito? Enfim, ele se colocou dessa maneira. Eu também concordei com o presidente do Atlético (Alexandre Kalil) naquele momento. Tentei fazer o máximo, mas não consegui resposta e achava que era melhor sair. Se no ano anterior (2010), fizemos bem ao Atlético, no ano seguinte isso não vinha sendo. Mas, em compensação, a maioria das trocas de treinador não segue esse modelo. São três ou quatro rodadas de oscilações que definem a saída do treinador. O que é muito pouco, muito pouco tempo. Às vezes o profissional já conhece a deficiência da equipe, mas não pode ainda atacá-las porque tem jogadores fora de combate, não tem elenco muito forte, muito qualificado e esses que estão fora fazem muita falta. E na grande maioria das vezes se manda embora o treinador, que é uma forma de dar resposta para a torcida, para a imprensa. Não estou protegendo treinador, mas acho que é uma estupidez o que tem acontecido no futebol brasileiro, essa forma cômoda de se demitir, de se responsabilizar o técnico, que não é responsável total pelas conquistas, mas também não pode ser o único responsável pelas derrotas.

A cobrança excessiva, talvez também não existe por causa dos altos salários de treinadores no Brasil?

Se compararmos com a realidade do futebol mundial, da Europa, o profissional brasileiro está bem abaixo. Se compararmos com a realidade do nosso país, nossos salários são acima da média, concordo, mas é um sistema, nós fazemos parte do sistema. Não queremos isso, não queremos salários milionários, queremos respeito e condição de trabalho. Fato que não temos, não acontece. Precisamos mudar um pouco essa condução das coisas, temos que contribuir de alguma forma. Acho que essa fundação é importante por isso, desde que, claro, ela não seja apenas montada, mas que ela crie vida, se fortaleça.

É como é ver o seu filho (Lucas Silvestre, auxiliar do Vasco), entrar nesse mercado tão instável? Ele quer seguir a carreira de treinador.

Acho que ele vai criar a identidade dele. No Vasco, não é meu filho, é um profissional que está sendo cobrado. Se houver algum problema, ele vai ser demitido. Eu o vejo como um profissional dedicado. Agora, se não quiser melhorar, se ele estagnar, vai procurar outro caminho. Agora, sobre a questão da instabilidade, de desencorajá-lo a seguir na profissão, nunca fiz isso. Porque também fui jogador numa família que teve um dos grandes jogadores do futebol brasileiro, que foi o Dudu, meu tio (ídolo do Palmeiras nos anos 1960, 1970), e sempre fui cobrado por isso. Em determinado momento, eu tive que aprender a conviver com essa condição. Então ele (o filho) vai ter a vida própria dele, se ele acha que daqui a pouco vai ter condição de dar um passo maior, ótimo. Ele já vai ter experiência, já vai ter muitos pontos prospectados em relação ao que é a profissão, como se deve agir e ao próprio desenvolvimento de trabalho, a maneira de se comportar.

Vamos falar de Vasco. Quando você chegou, na primeira conversa com o Ricardo, com os dirigentes, houve algo como: “Olha, primeira missão é escapar do rebaixamento”?

Olha, vou ser sincero. Quem diria que um dia as grandes equipes do futebol brasileiro corressem riscos de cair, como todo ano correm? Como é agora o caso do Palmeiras, que vemos na Série B pela segunda vez em pouco tempo, do São Paulo, que está lá embaixo na tabela. E o São Paulo, se falássemos antes, todos apontariam, talvez, como postulante ao titulo. Então acho que é uma preocupação de todos nós, independentemente da colocação que tenhamos tido no ano anterior. Temos equipes que brigaram pelo título num ano e agora brigam contra o rebaixamento. E o contrário também acontece. Acho que o futebol brasileiro é muito dinâmico, é igual demais, e ninguém pode dar bobeira, ninguém. Temos que pensar que temos pontos a alcançar e a primeira coisa, o básico, é se afastar da zona de rebaixamento. Superando esse risco, aí sim vamos pensar em busca de título ou outros objetivos.

Apesar da contusão de jogadores importantes, como Guiñazu e Sandro Silva, o Vasco hoje tem um elenco mais forte, com algumas chegadas, como de Juninho e Fagner. Sei que você tem batido na tecla de que é preciso ser realista, mas ainda tem muito campeonato pela frente e o Vasco mostra evolução, como você mesmo sempre cita. Dá para chegar ao fim do Brasileiro ali próximo para conquistar ao menos uma vaga na Libertadores de 2014?

Acho que é o que venho dizendo. Temos que ser realistas. O Vasco primeiro tem que ter uma estrutura de equipe. Estamos melhorando a cada rodada, mas não temos ainda estrutura de equipe definida. Isso vai acontecer com o tempo, com o passar dos jogos, com crescimento de alguns jogadores, com a recuperação de outros, mas vai passar também pela parte de que precisamos continuar atentos ao mercado. O Vasco ainda precisa demais de alguns nomes para ganhar mais corpo. Ainda estamos no meio de um caminho que eu penso ser o mais difícil, que é o dessa montagem para que o time se estruture. A nossa realidade é não iludir o torcedor. Que ele continue fazendo a sua parcela, que continue nos incentivando, que continue acreditando para que o time continue melhorando. E nos preparemos, nos estruturemos para conseguirmos um salto de qualidade em curto espaço de tempo. É isso que queremos, mas não é tão simples assim. Isso vai acontecer com trabalho, dedicação e acima de tudo uma palavra que é chave: investimento. Se não acontecer isso, dificilmente você alcança qualquer outra condição. Até porque temos equipes que já ultrapassaram esse momento, que vivem outro patamar e que para serem alcançadas vai depender de muito trabalho da nossa parte.

Você teve realmente a esperança de contar com o Sheik, entre os reforços que o clube contratou?

Sim, foi uma situação concreta que estava quase finalizada e seria fundamental se acontecesse, seria um belo de um reforço. Um jogador de peso, que aí sim faria com que nossa equipe já tivesse outra condição. Não aconteceu, foi uma pena, teria sido importante.

Houve um momento que também houve realmente uma tentativa pelo Ganso? Isso de fato aconteceu? Era outro jogador para dar esse peso ao time.

É, nós tentamos, conversamos, mas não conseguimos. Depois, ele fez sete jogos e já não havia condição. Tentamos por empréstimo ao São Paulo, já que não havia condição de investimento.

Por falar em Ganso, devido à sua marcante passagem pela Vila Belmiro, você acaba respondendo muito sobre Neymar, mas pouco sobre Ganso. Ele ainda vai ser aquele jogador que surgiu daquela maneira?

Poucas pessoas observam um problema. Eu já percebia isso quando era atleta, o período que você leva afastado, por lesão, por falta de contrato, outra coisa, é o mesmo tempo, pode ter certeza, que vai ser o tempo de recuperação completa do jogador. Nesse intervalo, ele vai fazer uma boa partida de vez em quando, mas na maior parte delas vai ser abaixo do melhor, às vezes nem conseguindo atingir próximo do seu nível. A partir do momento que se cumpra esse período, é outra coisa. Com poucos jogadores aconteceu algo diferente, poucos, fatos isolados. A grande maioria, a partir de dois, três meses de parada, leva o mesmo período de recuperação daquele que teve da recuperação física, de voltar a jogar. E o Ganso teve três lesões, uma atrás da outra. Na minha opinião, ele está já no meio do caminho, mas ainda um pouco distante das melhores condições, que, acho eu, devem acontecer ano que vem. Agora isso não quer dizer que não vá buscar boas apresentações, oscilando um pouco com abaixo disso.

Naquele episódio na final do Paulistão, em 2010, você se sentiu desrespeitado? (Ganso se recusou a ser substituído na final em que o Santos foi campeão sobre o Santo André, em 2010).

O fato do Paulo (Ganso) eu nunca expliquei. Num momento da partida, estávamos sem dois jogadores, expulsos. Um deles foi no primeiro tempo. E o Paulo, depois, abaixou no banco dizendo que estava exausto, que não aguentava mais. E eu disse para ele: “Você vai ficar aí, você é quem está segurando melhor a bola, não posso te tirar agora”. Ele falou que ia ficar. E o jogo continuou correndo. No momento da expulsão do terceiro jogador, depois que saíram Leo (lateral do Santos) e Nunes (do Santo André), pouco depois o Roberto Brum foi expulso. Aí o que veio na minha cabeça: aquele pedido do Paulo de saída. Lá em cima o Ivan (ex-auxiliar técnico de Dorival) me falou que o Ganso estava dando sinais de cansaço e tudo. Então foi automática a minha alteração. Quando ele viu que ia sair, ele se sentiu importante, disse que não ia sair, que ia ficar. E isso (o episódio) foi levado para o outro lado, sempre do desrespeito. Mas não foi isso, foi em razão da primeira conversa. Não esperava a reação dele, sou sincero, fiquei desconcertado. Aí quem estava atrás, o Robinho, disse, “professor, tira o André, tira o André” (atacante que hoje está no Vasco) para que eu pudesse colocar um zagueiro, que eles estavam colocando um jogador bem alto, um atacante. Faltavam poucos minutos e coloquei um zagueiro e ele não saiu.

Foi diferente do caso do Neymar. Quando acabou o jogo ele (Neymar) já tinha se desculpado, disse que estava realmente descontrolado, falou comigo no vestiário. Só que eu não deixaria de puni-lo, falei isso para ele. E a diretoria não entendeu assim, porque existe uma punição administrativa dada pela diretoria, multa, essas coisas, mas o elenco não entende isso.

A mensagem que fica é de que o craque pode fazer o que quiser.

Exatamente. O jogador só entende quando você, como treinador, vai lá e dá o comando. E é isso que era necessário. Mas a diretoria não entendeu dessa forma, achou que a punição técnica não era necessária e que eu estaria punindo o clube. Não entendo assim, acho que disciplina cabe em qualquer lugar, em qualquer situação. Se tivesse que fazê-lo hoje, novamente, tomaria a mesma posição. Tanto é que meu convívio com Neymar, hoje, é muito bom. Mas a diretoria não entendeu o problema, não entendendo assim, achei melhor sair e eles também abriram mão do meu trabalho porque viram que era uma situação que estava desencontrando demais, em razão do meu posicionamento e do posicionamento deles.

Você falou em outro dia em planejamento para o ano que vem. Seu contrato vai até o fim de 2014. Hoje o Vasco tem três ou quatro titulares que não são do Vasco. André, Fagner, Pedro Ken e, eventualmente, o Fillipe Soutto. Como planejar quando se bate de frente com essa situação?

Isso não pode acontecer. Um clube deve ter três ou quatro jogadores da casa, da base, no time titular, não ao contrário (emprestados). Isso tem que ser corrigido. E o Vasco vai corrigir muita coisa, pode ter certeza.

Vasco vai investir em um deles, pelo menos?

Isso ainda não sei, vai depender muito de rendimento deles.

Vai pedir, por exemplo, que o André seja comprado?

Olha, a partir do momento que esse grupo responda, é natural que eu queira ficar com o maior número de jogadores possíveis, desde que o Vasco queira ficar com o treinador (risos).

Como tem sido esse convívio com o Ricardo Gomes? Estão planejando juntos esse 2014?

Ricardo é uma pessoa que vim conhecer melhor aqui dentro. Aliás, quero até abrir um parênteses para dizer o que representa o Ricardo aqui dentro. É um profissional que me surpreendeu em todos os sentidos. Como ser humano eu já o conhecia, agora profissionalmente, é muito capacitado, um profissional preparado, que faz de tudo para que o trabalho do treinador possa ser simplificado. Estou muito satisfeito com retaguarda que o Ricardo, o Bruno Coev (supervisor) e o Fabio Fernandes (coordenador) me dão aqui para que realizemos o trabalho dentro das quatro linhas.

Você sempre observou muito jogadores da base, está fazendo isso agora novamente. Mas há um obstáculo de certa maneira por isso no Vasco que é a distância do clube para o CT de Itaguaí. Já foi lá alguma vez?

Não, nenhuma vez. Mas estamos trazendo os juniores para cá (São Januário), para que possamos observá-los ali dentro de São Januário, como já acontece com Henrique, com Fabio Lima, com alguns garotos.

Uma questão de time. O Alisson voltou para o Cruzeiro. Ele não poderia ser útil para o time, mesmo não sendo do Vasco? Ele tem o estilo de correr com a bola, de dar velocidade de meio para frente, que o time pouco tem hoje.

É mais um jogador que não seria do Vasco, se ficasse conosco. Então conversei inclusive com o Alisson, que acho que vai ser um grande jogador, acredito muito no potencial dele. Mas eu conversei com a diretoria: “o que vai adiantar preparar o Alisson para que no final do ano ele volte para o Cruzeiro?” Então não tinha porque isso. Se fosse um jogador mais tarimbado e a gente já soubesse de antemão que o Cruzeiro não se interessaria pelo jogador e houvesse a possibilidade de negociação, aí, talvez sim, não teria esse problema. Mas do contrário eu prefiro preparar um garoto da base, que aí sim, com certeza vai ficar no Vasco, do que um menino, que ainda que seja promissor e venha a se tornar um grande jogador, mas que não vai ficar. Não tinha porque (impedir o retorno do Alisson). Erraríamos duas vezes. Erraríamos em montar um time com a presença dele e depois tendo que tirá-lo do time e remontá-lo com a presença de outro atleta que não teve oportunidade profissional aqui dentro.

Eder cresceu muito desde sua chegada. Houve uma conversa a mais com ele?

Não. Eu só tento passar confiança ao jogador, só isso. Eu tento deixá-los bem à vontade. Ele sentiu o crescimento dele, ele está acreditando no trabalho, está acreditando nele novamente, se sentindo bem dentro do grupo. Aliás, o Vasco tem um grupo que precisa-se tirar o chapéu nesse sentido. Poucas vezes vi um grupo tão responsável para trabalhar, tão entusiasmado, tão aberto para o trabalho. Pessoas que querem o bem do clube. E isso às vezes é muito difícil de se montar. Fiquei muito satisfeito com o que encontrei aqui dentro.

Como explicar a importância de jogadores como Nei, Michel Alves, Renato Silva, que perderam suas condições de titular, mas que parecem contribuir bastante para o time, mesmo de fora?

Tem uma importância extrema. Acho que chega um momento da carreira que o profissional não é útil só jogando. Ele é útil também orientando, também se preparando para um futuro. Não quer dizer que estejam em fim de carreira, nada disso, mas é uma preparação intima para um futuro próximo. Esses profissionais são exemplos do que me surpreendeu, como disse antes, de um grupo muito unido, que está trabalhando pelo bem do grupo e isso é difícil de se encontrar, de se atingir. Por isso fico contente. O Nei foi titular, Michel também, mas estão respeitando o momento do Fagner, do Diogo. O Renato foi titular comigo, pode voltar daqui a pouco. E existe essa harmonia dentro do trabalho. E isso é um ponto muito positivo, que tenho que respeitar e só tentar fortalecer ainda mais.



Fonte: GloboEsporte.com