Remo: Kissya Cataldo fala sobre a preparação para Londres-2012

Sábado, 07/04/2012 - 09:59

Kissya é um nome raro. Tanto que jamais conheceu uma xará, tampouco descobriu o significado da denominação de origem africana. Mas o talento, a garra e a alegria de Kissya Cataldo parecem compartilhar dessa raridade. Tudo isso impulsionou a remadora do Vasco para conseguir a recente classificação, no Pré-Olímpico de Tigres, na Argentina, para representar o Brasil no single-skiff em Londres-2012, em julho.

Embora a vaga só tenha sido assegurada no Pré-Olímpico, a 25 de março, Kissya diz ter aberto caminho rumo a Londres, quando, a 18 de dezembro, superou a campeã mundial Fabiana Beltrame na seletiva olímpica. Com isso, garantiu a ida ao Pré-Olímpico no single-skiff — Fabiana e Luana Bartholo, do Flamengo, conquistaram a vaga no double peso-leve — e sem aquela vitória, nada teria dado certo.

— A primeira vez em que tinha vencido a Fabiana foi no Estadual-2011. Na seletiva olímpica, disse para mim mesma que tinha de ganhar. Era a única chance de ir aos Jogos, e me dediquei totalmente — conta Kissya. — Mudei a dieta, fiquei mais disciplinada, malhei e subi correndo até a Mesa do Imperador. Foram 45 dias de treino. Quando venci, foi o dia mais feliz da minha vida!

Duelo com a campeã

Ainda não era a vaga nas Olimpíadas, mas Kyssia havia superado o trauma de derrotas anteriores para Fabiana.

— O mais difícil era ganhar da campeã mundial. Ela era a favorita, e ninguém esperava, mas, graças a Deus, venci. Meu técnico Marcelo Neves, me deu muita força — relata.

No primeiro dia do Pré-Olímpico, Kissya ficou em segundo e teve de ir à repescagem (segundo dia). Venceu e foi à final com seis participantes no terceiro dia.

— Na final, senti muito cansaço. Ainda não tenho o ritmo de competir em três dias seguidos. Estava nervosa, e até os primeiros mil metros (de dois mil), eu era a terceira. Caí para quinto, e como eram cinco vagas, me classifiquei. Fiquei muito feliz, mas demorou a cair a ficha de que estava nas Olimpíadas pela primeira vez. O esforço valeu! — festeja.

Alertada por Anderson Nocetti, do Botafogo, que vai aos Jogos Olímpicos pela quarta vez, a remadora não quer se deslumbrar em Londres.

— Você se sente entre os melhores do mundo, mas tem de manter-se concentrada. O objetivo é ao menos a Final B (sétimo a 12), e na Rio- 2016, medalha — enfatiza ela, que foi aos Pans 2007 e 2011, sem pódios. — As favoritas são a bielorrussa Ekaterina Karsten (bi olímpica em 1996 e 2000), a sueca Frida Svensson (campeã mundial de 2010) e a tcheca Mirka Knapkova (campeã mundial de 2011).

Falta de apoio ao remo

Para brilhar, porém, segundo o técnico José Oyarzabal, francês que dirige a equipe brasileira há três anos, Kissya precisa mesmo querer.

— Ela tem muito talento, mas tem de usá-lo ao máximo. E sabe disso. É claro que pode ir muito melhor. O que não pode faltar é motivação interna — adverte ele, que levará três ou quatro barcos à Copa do Mundo, em maio, em Lucerne (Suíça).

Kissya vem se consultando com uma terapeuta, porque seu sucesso depende da cabeça e de uma melhor estrutura. Atleta vascaína, está preocupada com o remo do clube, com ajuda de custo atrasada há três meses. Já teve propostas de Flamengo, onde começou, Botafogo e Pinheiros.

— Tranquei a faculdade de nutrição e, no momento, vivo do remo. Consegui um patrocínio e não quero sair do Vasco. Mas, se o clube não melhorar a estrutura... Sou a única atleta de esportes olímpicos do Vasco em Londres, sem contar o futebol — observa. — Faltam no país valorização e apoio ao remo. Mesmo assim, a Fabiana é campeã do mundo. Quando chego aos lugares, pessoas me perguntam se faço vôlei ou basquete. Poucos conhecem o remo. Mas ele deixa a mulher sarada sem perder a feminilidade.

Kissya é tão rara quanto múltipla. Do alto de seu 1,80m, pelos quais estão distribuídos os 68 quilos, a remadora de 29 anos, nascida em Uberlândia e que está no Rio há 16 anos, é também modelo.

— Comecei como modelo em 2000, quando já remava. Fiz comerciais para TV, fotos para uma grife do Chile, em 2009, e participei de festa no Big Brother Brasil, em 2009, dançando. Depois que me concentrei nas Olimpíadas, parei como modelo — explica. — Após Londres, gostaria muito de posar para revistas de moda.

Enquanto conversa e um helicóptero sobrevoa o Estádio de Remo, ela fala do amor pelo namorado André Benvenuti, piloto desse tipo de aeronave e seu grande incentivador. Musa do remo para os atletas e mulher de fé, tem na nuca a tatuagem de um peixe, com a frase "Livrai-me de todo mal".

— Frequento a Igreja Bola de Neve, na Barra. A fé me ajuda muito. É muito importante uma crença. Se você fizer a sua parte, Deus vai abençoar você. Mas se esperar cair do céu, nada acontece — ensina a remadora.



Fonte: Globo Online