Koehler se encontra com Paulo Pelaipe e Rodrigo Caetano, também gaúchos e dirigentes profissionais de clubes do Rio

Domingo, 16/06/2013 - 09:06

Paulo Pelaipe bota o pé direito no primeiro andar do elegante Shopping Rio Design, na Barra, e um torcedor, acomodado numa das mesas do Café Rubro, fala.

— Você precisa contratar. O diretor executivo de futebol do Flamengo sorri. No outro lado, vê Reinaldo Pita, ex-empresário de Ronaldo Fenômeno.

Conversam uns minutos. Seu celular, vermelho e preto, toca sem parar, chamaria mais nove vezes em pouco mais de uma hora. Ele espera um ligação do filho Rodrigo, 21 anos, que estuda em Boston, nos EUA. Eu brinco com a cor do celular.

— Vermelho, Pelaipe?

Ele se faz muito sério e diz.

— Meu tempo de torcedor está no passado. Sou um executivo de futebol. Trabalho para o Flamengo, assim como poderia atuar por outro clube. Hoje não tenho bandeira, tenho o Flamengo. Pelaipe, 61 anos, procura uma mesa mais discreta, pede um café com leite e comenta:

— Toda a manhã me conecto à zh.com. Tomo banho ouvido a Rádio Gaúcha às 6h da manhã. Porém, logo depois, já entro na minha rotina local, pego o carro e rodo 40 minutos rumo ao Flamengo.

— Saudade de Porto Alegre? — pergunto.

— Sabe do que eu tenho saudade? De jogar dominó com meus velhos amigos. Vê se pode...

Ele vê Cristiano Koehler, 36 anos, CEO do Vasco, se aproximando. Os dois trocam um forte e longo abraço. Depois de quase seis meses de Rio de Janeiro, ainda não haviam se encontrado. Falam qualquer coisa, bem baixinho.

— Olha só quem chegou — anuncia Koehler mais alto.

Rodrigo Caetano, 43 anos, executivo do futebol do Fluminense, encosta na mesa. Abraça os amigos, ex-colegas de Grêmio, clube que os projetou. O papo inicial gira em torno das famílias, dos filhos, da saúde de todos. Ninguém toca em futebol. Eles trabalham em três equipes rivais, respondem por cargos de confiança e são responsáveis de alguma forma pelo bem-estar, leia-se vitórias, de quase 24% (um em cada quatro) de todos os torcedores brasileiros.

Caetano chegou em 2009, os outros no final de 2012. Koehler passou por São Januário em 2011. Um headhunter de executivos de futebol o trouxe de volta. Rodrigo olha para os dois, estende o braço esquerdo para o ambiente lotado e fala direto comigo.

— Você não tem ideia da força do futebol no Rio de Janeiro. É bola o dia inteiro e em qualquer lugar. Você pode notar aqui. Todos querem falar sobre os times. O que eles mais querem é contratações. Né, Pelaipe?

— No Nordeste é impressionante. Os torcedores nos esperam na porta do hotel quando chegamos de madrugada — espanta-se Pelaipe.

Pelaipe assou um churrasco para os 12 funcionários mais carentes do CT Ninho do Urubu recentemente. Comprou só picanha e sal grosso. Fez no espeto, brasa ao fundo. Foi um sucesso. Só rolou refrigerante, o chope é vetado no centro de treinamento.

Caetano viajou muito nos últimos meses, nem viu o Verão carioca passar. Culpa da Libertadores. Koehler vive entre Rio e Brasília nas últimas semanas tentando reabilitar economicamente o Vasco. Marcou um golaço ao ajudar na conquista de um milionário patrocínio da Caixa, o que ajudará os jogadores a receber os salários com mais regularidade.

Eles não frequentam bares, estão muito distantes da feérica noite local, da Hollywood global, muito menos os quiosques das praias. A cor da pele de todos mostra que o Sol só é visível da janela para fora. Só Pelaipe está sem a família, que chegará em agosto. Todos conhecem um a um os melhores restaurantes da Barra. Sabem onde saborear o melhor bacalhau, o risoto com ossobuco, a pizza estilo paulista, o sushi do chefe japonês. Perto das 22h, duas vezes por semana, o sacrifício de uma longa jornada é compensado com um bom jantar.

— Eu conseguir ver duas vezes a Unidos de Vila Isabel e a Mangueira no começo do verão, depois não deu mais. A exigência do Flamengo é tremenda — diz Pelaipe.

— Tenho trabalhado mais de 13 horas por dia. Nem ao cinema vou mais. Quando posso, caminho na beira da praia bem cedinho — revela Koehler.

— Hoje vou jantar com a minha mulher depois da nossa conversa. O ritmo está pesado. Vejo pouco a família — queixa-se Caetano.

Foi difícil reunir o trio gaúcho, só disponível depois das 19h de um quinta-feira, no meio da rodada da quarta-feira e antes do domingo sagrado do futebol. Em dia de chuva, um elegante shopping center com a cara do Rio é um bom lugar para as fotos. Na caminhada, eles encontram outros conhecidos. Param, trocam abraços e seguem o papo, três gaúchos dispostos a conquistar ao povo carioca ao seu modo, embora Rodrigo já tenha a faixa de campeão brasileiro de 2012 grudada no currículo.

— A cobrança é muito forte, mas creio que o Fluminense fará um grande Brasileirão. Temos um grande técnico e uma equipe competitiva — explica Caetano.

— Não temos dinheiro para grandes contratações, mas o Flamengo é um time de camisa. Não fará feio. Vamos reagir — promete Pelaipe.

— O Vasco está se reanimando os poucos, recuperando as finanças, o trabalho é de médio a longo prazo. Minha missão é reorganizar financeiramente o clube — garante Koehler, um dos executivos que ajudaram a reconstruir o Grêmio em 2005.

Pelaipe exibe a larga experiência que os dois, com MBA. Mas eles, por sua vez, têm a teoria que o conterrâneo aprova.

— O Paulo e o Rodrigo, como tratam com o futebol, estão mais na mídia. Minha ação é mais interna. Não apareço tanto nos jornais e na tevê. Como diretor-geral minha preocupação é com toda a estrutura financeira do Vasco.

Entre tapas nas costas e abraços, Rodrigo Caetano se despede. Não pode jantar no restaurante italiano, a mulher o espera para um compromisso familiar pré-agendado. Pelaipe e Koehler seguem na outra direção.

— Vamos tomar um vinho? Nada de Flamengo contra Vasco.

São dois porto-alegrenses que se reencontram numa noite nublada do inverno carioca. O papo sério de executivo fica para depois.

Caetano (E), Koehler (C) e Pelaipe: amigos, amigos, futebol à parte


Fonte: Zero Hora - Clicrbs