Remo: Ariel Suárez fala sobre sua recuperação após grave problema de saúde

Quarta-feira, 29/01/2014 - 10:02
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Osvaldo Suarez Juan Ariel (foto à esquerda), remador do Vasco desde 2010, possui uma história bem peculiar no remo. Conhecido no meio do esporte como Ariel Suarez, o argentino seguiu uma trajetória bem diferente do comum e do recomendado para se chegar ao posto de remador de ponta. Ao contrário de um bom número de modalidades esportivas, notadamente o futebol, no remo é difícil um atleta não seguir etapas pré-determinadas de desenvolvimento e mostrar um alto rendimento na categoria adulta ainda bem jovem, alguns ainda adolescentes. No esporte fundador do Vasco, geralmente o atleta começa a praticar o esporte bem jovem - o que é comum a quase todos os esportes -, mas para "estourar" precisa passar por várias etapas, só vindo a ser um remador de ponta com uma idade mais avançada do que em outros desportos, geralmente após os 23 anos. Isto fica ilustrado na distribuição das categorias do remo, quando o sub-23 (também chamado de sênior B) ainda é uma categoria de base.

Qual o motivo de apresentarmos Ariel Suarez (na Argentina, ele compete pelo Clube Teutonia, da cidade de Tigre, onde ele treina) e desandarmos a falar dessa característica do remo? Porque ele representa uma exceção clara a esta tendência. Ariel começou a remar já com 20 anos, idade com a qual a maioria dos remadores de alto nível já praticam o esporte há muito tempo. Para intensificar esta situação, ele sequer praticava esportes e, o que é favor impeditivo para o remo, não sabia nadar. Em declaração concedida ao Blog CRVG - Em Todos os Esportes em março de 2013, ele explica qual foi seu trunfo para superar essa clara dificuldade:

- Não conhecia esporte, não sabia nadar. Está tudo na cabeça e no coração. Se um não quer, o desempenho não chega.

Calma, leitor, o tanto de "pontos fora da curva" que perpassa a carreira de Ariel Suarez ainda vai muito além, e terá um ponto culminante bem traumático e, posteriormente, heróico. Mas isto fica para mais adiante. Continuemos a descrever a carreira do remador argentino.

Ariel tornou-se mais do que um remador de ponta. Ele chegou ao topo em termos de resultado, conquistando diversos feitos em uma laureada carreira, que ainda a pleno vapor e a qual pode ser inserida ainda mais feitos ao currículo. Com Cristian Rosso, também argentino (de Mar del Plata, compete no Atlantis) e que também é remador do Vasco, este desde 2011, se tornaram "fiéis escudeiros". E com excelentes resultados. No double skiff, foram campeões pan-americanos em 2011, em Guadalajara (México), e chegaram ao quarto lugar nas Olimpíadas de 2012, em Londres. Nos Jogos Olímpicos, se classificaram à final com o melhor tempo das semifinais. Mas não fica por aí: também nesta prova, têm ótimos resultados em etapas da Copa do Mundo, como a medalha de prata na etapa de Hamburgo (Alemanha) em 2011. Pelo Vasco da Gama, dominam completamente as provas de single skiff (ora com um vencendo, ora com outro) e de double skiff, quando sempre vencem com extrema vantagem sobre os oponentes. Além de sempre marcarem presença nas principais competições do calendário do remo - Olimpíada, Campeonato Mundial e etapas da Copa do Mundo - , muitas vezes chegando à final A (seis barcos), ou, na pior das hipóteses, disputando a final B.

E os dois remam juntos apenas desde 2010. Ainda assim, esta dupla já obteve diversos ótimos resultados. A dupla estreou na etapa da Copa do Mundo de Lucerna (Suíça), em 2010, quando já tiveram bom resultado, vencendo a final C. Como primeira medalha internacional da dupla, a prata na etapa da Copa do Mundo de Hamburgo, em 2011. Não obstante os ótimos resultados de Cristian, alguns de maneira solo, voltemos a tratar de Ariel, o foco desta matéria - mais à frente vocês entenderão o porquê.

Fora da parceria com Cristian no double skiff, Ariel ainda possui outros bons resultados. Pelo Vasco, foi campeão brasileiro do single skiff (Troféu Brasil) em 2011 e campeão estadual desta mesma prova em 2012 (quando, às vésperas das Olimpíadas, fez questão de competir mesmo com uma pequena fratura no braço). Ao lado do compatriota Rodrigo Murillo, levou a prata no double skiff no Pan-Americano de 2007, no Rio de Janeiro. No Pan de 2011, em Guadalaraja, Ariel, além do ouro no double com Cristian, também foi ouro no four skiff e bronze no oito com timoneiro. Com tantos bons resultados da dupla, podemos dizer que competem pelo Vasco dois dos principais, senão os dois principais, remadores em ação em clubes do Brasil. Eles também fazem questão de orientar e compartilhar suas experiências com os atletas das categorias de base do remo vascaíno, como fizeram no período de um mês em que permaneceram na Sede Náutica vascaína em 2013, do final de setembro ao final de outubro (leia os detalhes desta estadia clicando aqui), quando competiram no Brasileiro e no Estadual, com seus costumeiros bons resultados.

De quase parar de remar à (nova) consagração

Em 2013, porém, Ariel teve um enorme baque em sua carreira. E daqueles que para a maioria dos atletas é intransponível. Em março, ele foi assolado por uma gravíssima infecção bacteriana. A bactéria ficou alojada na região torácica do remador, próxima ao osso esterno, que se localiza na região dos pulmões, o que trouxe muitas dores e graves problemas respiratórios. Mais do que isso, essa infecção quase fê-lo parar de remar. Os médicos informavam que, caso a cirurgia fosse feita, uma raspagem no osso, muito provavelmente ele não poderia mais praticar o remo de competição. Logo para um atleta no auge de sua carreira e pouco depois de ter sido quase medalhista olímpico...

A cirurgia era dada como certa por muitos, mas, junto aos médicos da Secretaria de Esportes da Argentina, foi buscada intensamente uma saída que não o alijasse da prática do remo de corrida. Felizmente, com medicação (antibióticos), essa saída foi encontrada. Mas não era uma opção segura, mas a única cogitada diante de que a cirurgia provavelmente significaria o encerramento da carreira. Melhor do que ninguém, quem pode explicar é o próprio Ariel Suarez, que, numa entrevista exclusiva ao blog CRVG - Em Todos os Esportes, contou todos os detalhes de sua heróica recuperação:

- Tive uma infecção muito grande que me deixou fora do remo, fora dos treinamentos. Por dois meses fiquei prostrado numa cama, não tinha a possibilidade de me mover pela dor que sofria. Tive um mês de internação numa clínica e um mês de internação domiciliar. Só podia caminhar muito pouco, não mais. Uma bactéria afetou o meu peito, foi uma infecção muito grande. E esse tipo de infecção não é normal, não há muitos casos no mundo que tenham passado isso. E os poucos casos que houve foram para operação. Os médicos queriam me operar, e isso me alijaria do remo de corrida, porque teria que limpar, raspar os ossos. Houve muita pressão dos médicos da Secretaria de Esportes da Argentina, do secretário de Esportes, que proibiu a minha cirurgia, teria que ser por outro método. Teriam que provar e inovar outro método, porque a operação me tiraria do remo. Os médiscos buscaram colegas de outros países, buscaram a melhor opção, que era por medicamentos. Não era segura, mas era uma opção. Então começaram por isso. Tive três meses de medicação, e por sorte surtiu efeito. Toda a infecção e a bactéria foram eliminadas por meio de medicamentos, e isso evitou minha operação.

É isto mesmo. Como ele mesmo disse, dois meses prostrado numa cama. E cerca de três meses e meio sem competir. A última competição de Ariel antes do diagnóstico da infecção havia sido justamente pelo Vasco: a 1ª regata do Campeonato Estadual, quando ficou em terceiro lugar na prova do four skiff. Tanto nos treinamentos antes da prova quanto durante a prova, Ariel sentiu muitas dores e problemas para respirar. Diante disso, profissionais do remo do Vasco, capitaneados pelo treinador Marcelo Neves (foto abaixo à esquerda), amigo de Ariel e responsável por trazê-lo ao Vasco, levaram-no para a Casa de Saúde São José, na Lagoa. De domingo para segunda, ele dormiu na Sede Náutica do Vasco, viajando logo na manhã para Buenos Aires, quando o diagnóstico foi realizado. Marcelo Neves explicou o problema de Ariel ano passado ao blog, e recapitulamos esta entrevista aqui:

- Ele teve uma infecção causada por uma bactéria que se alojou na região do esterno. Essa infecção foi anterior à primeira regata do Estadual, que ele disputou pelo Vasco, mas já chegou aqui com alguma sequela, algum problema causado por essa situação. Tanto é que logo após a regata eu fui com ele para a clínica São José, e fiquei até o final do domingo com ele lá. Até aquele momento nós estávamos desconfiando de algum problema no músculo esquelético, na região da coluna cervical torácica. A dor dele era muito grande, não conseguia respirar direito. Anterior a essa regata, na semana em que ele teve alguns treinamentos, ele já estava com algumas dificuldades em relação a essas dores. Mas competiu mesmo com dor. No próprio domingo da regata, depois que a gente saiu da clínica, ele ainda dormiu aqui no clube. Na segunda de manhã foi para a Argentina. Quando chegou a Buenos Aires, foi internado direto. Ele ficou quase um mês internado, e teve até o risco de fazer uma cirurgia para abrir a região torácica para fazer a raspagem do esterno. Felizmente não foi necessário, o trabalho com os antibióticos surtiu efeito.

Após dois meses internado e pouco mais de um mês de treinamentos, Ariel voltou a competir. Se ficou impossibilitado de disputar a segunda regata do Campeonato Estadual (logo a prova do double skiff, na qual a vitória era dada como certa pelo Vasco), o Campeonato Sul-Americano (no final de abril, também no Rio de Janeiro) e a 2ª etapa da Copa do Mundo (em junho, na mesma raia dos Jogos Olímpicos do ano anterior, em Eton Dorney), ele disputou o double skiff, com Cristian, na 3ª etapa da Copa do Mundo, quando, no dia 14 de julho, ficaram em sétimo lugar na etapa da Copa do Mundo de Lucerna (SUI), vencendo a final B, justamente na mesma cidade em que inauguraram a parceria em grandes competições internacionais. Um resultado bom para um retorno de gravíssima lesão.

O heroísmo de Ariel não para por aí. Ele quase teve que parar de remar, ficou dois meses internado, prostrado numa cama... E não é que poucos meses depois ele conquista um ótimo resultado no Campeonato Mundial (competição bienal, que em 2013 foi disputada na Coréia do Sul, na cidade de Chungju, entre os dias 25 de agosto e 01 de setembro)? Na competição, que em grau de importância fica atrás apenas dos Jogos Olímpicos, eles mantiveram o padrão de resultados de Londres-2012. Se no ano anterior foram finalistas olímpicos e terminaram em quarto lugar em Chungju novamente ficaram entre os seis melhores, terminando em quinto lugar. Impensável para a dupla, que poucos meses antes ainda não tinha certeza se a parceria poderia ser reeditada. Na Coréia, eles tiveram o quarto melhor tempo marcado no apanhado de toda a competição e foram melhores do que os atuais campeões olímpicos (dupla neozelandesa). Ao blog, Ariel fala sobre esse estupendo retorno após a lesão que quase o tirou do remo de competição:

- Depois de dois meses prostrado, só com dois meses de treinamento, pude competir no Mundial. Creio que foi uma atuação muito boa, chegar entre os seis melhores do mundo, chegar ao quinto posto, ganhar do campeão olímpico e estar muito perto da medalha, tendo o quarto melhor tempo de todo o mundo.

Entretanto, Ariel ainda não está em sua melhor forma, e ela virá de forma gradual, o que também é característico do remo após um grande tempo afastado das águas. Embora ainda tenha que ganhar ritmo de treinos e competições para voltar a sua melhor forma física e técnica, ele já obteve grandes resultados após seu retorno, como estar na final do Campeonato Mundial.

Em declaração que deixou o vascaíno que está redigindo esta matéria emocionado, Ariel deixa claro qual o diferencial para que pudesse retornar em ótima forma: sua força mental, dedicação e determinação. Ele tem clara noção do que ele passou a representar para esportistas de todo o mundo:

- Isto demonstra que, se quer, realmente se pode. Na verdade eu sou totalmente igual a qualquer outra pessoa, não sou de outro mundo mundo, de outro planeta. Só sei realmente o que quero e aonde quero chegar. Creio que isso é um exemplo para todos os esportistas, tanto da Argentina quanto do Brasil, de que realmente se pode chegar ao lugar que se quer se realmente está decidido e quer. Tem que sentir no coração e tem que estar seguro na cabeça.

A importância do parceiro Cristian Rosso

Conforme dito, Ariel e Cristian remam juntos apenas desde 2010. Entretanto, já foi tempo suficiente para eles construírem mais do que uma parceria durante as provas: foi construída uma grande amizade. Cristian possui grandes resultados no single skiff: enquanto Ariel esteve lesionado, foi campeão sul-americano desta prova e ficou em sexto lugar, chegando à final, na segunda etapa da Copa do Mundo, em Eton Dorney (Grã-Bretanha). Esta força de Cristian no single também ficou nítida quando ele esteve no Rio de Janeiro para disputar a prova no Brasileiro e no Estadual: venceu ambas com extrema tranquilidade.

Desta maneira, não seria nada fora do normal Cristian, diante da grave enfermidade de seu parceiro no double skiff, focar nas provas individuais, ou até procurar outro argentino para a prova do double skiff. Mas ele não fê-lo, e Ariel, com exclusividade ao blog, explica a importância que seu "fiel escudeiro" teve em sua recuperação:

- Para a minha recuperação foi muito importante o apoio que tive do meu parceiro, Cristian. Em todo o tempo em que remo, nunca tive um parceiro como este, que pensa primeiro no barco, no conjunto. Ele poderia focar em si, mas sempre me incentivou, dizia "vamos chegar ao Mundial". E, após ficar dois meses prostrado numa cama e com apenas três meses de treinamento, cheguei novamente a uma final de Mundial.

Diante disto, o blog não poderia deixar de ouvir Cristian Rosso sobre a recuperação do parceiro. Também com exclusividade, o argentino também ressalta a força mental de Ariel Suarez:

- Foi um momento difícil, porque ele não sabe se iria poder voltar, se poderia competir na Copa do Mundo. Os médicos falaram que ele poderia treinar e já estava recuperado, ele é muito forte de cabeça, deixou de lado a enfermidade, a contusão, se esqueceu disso, e voltou muito mais forte mentalmente. Isso fez com que conquistemos o quinto posto.

Ariel Suarez, diante de todas as superações ao longo de sua carreira como remador, que procuramos mostrar ao longo desta matéria, mostra o quão inspirador para outros segmentos da vida o esporte pode ser. Mais do que isso, também mostra a importância que a força mental tem para que um atleta obtenha ótimos resultados. Em relação especificamente ao Vasco, ainda mais diante da grave crise que assola o esporte fundador nos últimos anos, é fundamental que uma dupla com resultados e belas histórias como a formada por Ariel Suarez e Cristian Rosso permaneça no clube. Além dos ótimos resultados em suas provas (em princípio no single e no double skiff, mas também pode ser nas provas de quatro e oito remadores se novos remadores de ponta chegarem), eles também são uma ótima influência para os jogens remadores do clube. E não hesitam em passar essa experiência obtida ao longo de suas carreiras internacionais. Isto ficou claro na estadia da dupla de setembro a outubro no Vasco, com vitórias no Campeonato Brasileiro e no Estadual e com os jovens aproveitando ao extremo a possibilidade de conviver e remar com remadores finalistas olímpicos, o custo-benefício é muito positivo. A eles, e especificamente a Ariel diante de tudo o exposto nesta matéria, não podemos deixar de dizer que honram ao extremo o grito de guerra do clube, oriundo do próprio remo: essa turma é mesmo da fuzarca! Casaca!



Fonte: Blog CRVG Em Todos os Esportes - Supervasco