Selevascão, campeã do Brasil

Vasco 1x0 São Paulo (Campeonato Brasileiro 1989)

Compilado de O Globo  de 17/12/1989 e da edição extra de Placar  de 18/12/1989 (JPEG, 44k).

Uma festa inesquecível. Quinze anos depois de conquistar pela primeira vez o título de campeão brasileiro, o Vasco repetiu a façanha de forma dramática no Morumbi, na tarde do dia 16 de dezembro de 1989, um sábado. Só que desta vez, ao contrário da decisão de 1974, o Vasco era apontado como favorito.

A vitória por 1 a 0 sobre o São Paulo, confirmando o seu favoritismo na decisão do Campeonato Brasileiro de 1989, foi bem ao estilo do time: com ténica, garra e uma incrível aplicação tática que superou todos os obstáculos durante a competição e fez a alegria da sua torcida. Sempre confiante, invadiu o Morumbi e comemorou o título cantando o hino do clube (Ingresso: JPEG, 24k).

Não ficou dúvida. Era mesmo uma seleção. Que outro clube teve a ousadia de contratar tantos craques? Gente como o espetacular Bebeto, autor de gols memoráveis; o classico zagueiro equatoriano Quiñonez; o incansável lateral Luiz Carlos; e o experimentado Tita, que deu a consistência necessária ao meio-campo - essa gente se juntou a nomes respeitáveis. Como ao frio goleiro Acácio, ao cada vez mais brilhante Mazinho, ao talentoso Bismarck e ao oportunista Sorato. O técnico Nelsinho foi entrosando as novas contratações aos demais durante a competição, para surgir o que a torcida pedia: um time cheio de soluções para qualquer problema e, por vezes, brilhante. Ao longo da competição, o Vasco usou várias escalações, com os reservas sempre a altura dos titulares. E o resultado do investimento só podia ser este mesmo: Sele-Vasco com mais um trofeu no armário.

Verdade que perdeu para Palmeiras e Flamengo e empatou alguns jogos em casa - foram oito vitórias, oito empates e duas derrotas antes da final. Mas o importante foi ir acumulando pontos. Time de melhor campanha de todo o campeonato, o Vasco, vencedor do Grupo B, foi para a decisão com o São Paulo, vencedor do grupo A, com um ponto de vantagem. O São Paulo precisava não perder a primeira partida para forçar um segundo jogo na quarta-feira seguinte. O regulamento dava ao Vasco, ainda, o direito de indicar o local da primeira partida, e os dirigentes se decidiram pelo Morumbi, deixando a segunda partida, se necessária, para o Maracanã.

Diante de um publico de 71.552 pagantes, o Vasco (JPEG, 48k) entrou em campo de camisa preta, calções pretos e meias brancas, formando com Acácio; Luiz Carlos Winck, Marco Aurélio, Quiñonez e Mazinho; Zé do Carmo, Marco Antônio Boiadeiro, Bismarck e William; Sorato e Bebeto. O São Paulo, do técnico Carlos Alberto Silva, jogou de branco, com Gilmar; Neto, Adílson, Ricardo Rocha e Nelsinho; Flávio, Raí e Bobô; Mário Tilico, Nei e Edivaldo. O árbitro foi Wilson Carlos dos Santos, auxiliado por João Batista Byron e Daniel Fernandes.

Para ganhar a partida do Morumbi e o título, o Vasco explorou a vantagem proporcionada pelo regulamento. O goleiro Acácio, com três defesas importantes em momentos decisivos da partida, foi o principal destaque. Mas o oportunismo de Sorato, autor do gol de cabeça aos 5 minutos do segundo tempo; o talento de Mazinho, que além de não deixar jogar a Mário Tilico, o mais perigoso atacante do São Paulo, ainda conseguiu espaços para ajudar seus companheiros no ataque; a velocidade de raciocínio e o toque de bola de Bebeto, cuja simples presença manteve os zagueiros adversários atrás após o gol do Vasco; a garra de Marco Aurélio, que mesmo cometendo algumas falhas foi mais um a colocar o coração na ponta das chuteiras; e a aplicação de todo o time, foram fundamentais para a conquista.

O nervosismo dos jogadores do São Paulo foi um adversário a mais para o time. Flávio, Raí e Bobô, jogadores habilidosos, erraram muitos passes e cometeram faltas que, normalmente, só são feitas por quem não tem ténica. O individualismo de Edivaldo, que correu por todo o campo, mas tentando sempre resolver o jogo sozinho, foi outro ponto negativo. Com Mário Tilico muito bem marcado por Mazinho, restou ao time contar com as jogadas de Nei, mas este esbarrou sempre no goleiro Acácio, em grande dia. Na defesa, com exceção de Ricardo Rocha, que ficou cansado de tanto reclamar dos companheiros, ninguém esteve bem. Os laterais Neto e Nelsinho, além de abusarem da violência, não foram eficientes no apoio. E o zagueiro Adílson falhou no gol de Sorato, ao deixar o atacante do Vasco livre para cabecear.

O Vasco iniciou a partida empregando uma estratégia inteligente armada pelo técnico Nelsinho, que se despedia da direção do time para trabalhar na Comissão Ténica da Seleção Brasileira. Seu time tratou de sair para o ataque e bloquear as jogadas no meio de campo com a utilização de quatro jogadores - Zé do Carmo, Boiadeiro, Bismarck e William -, mantendo Bebeto aberto pela ponta direita e Sorato caindo pelo setor esquerdo. Com isso passou a ter o domínio do jogo, enquanto os jogadores do São Paulo apelavam para as faltas.

Aos 7 minutos, Mazinho lancou livre William, que deixou Bismarck livre dentro da área. Ele se atrapalhou na hora de chutar e perdeu a oportunidade. O domínio do Vasco durou até os 20 minutos, quando o time inexplicavelmente recuou. Foi a vez de o meio de campo do time paulista, com Raí e Bobô, começar a criar jogadas explorando os lançamentos para Mário Tilico, pelo lado direito, e Edivaldo, pelo esquerdo. Mas o time falhava nas conclusões.

A melhor chance do São Paulo neste período foi aos 29 minutos, quando Nei, em jogada individual, driblou três jogadores, entrou na área e chutou rasteiro para Acácio defender. Aos 34 foi Bobô, que driblou Marco Aurélio, chutou, Acácio defendeu e soltou e o mesmo Bobô completou de bicicleta para fora. O primeiro tempo acabou com o São Paulo pressionando e o Vasco fechado em sua defesa, resistindo com bravura.

O jogo ficou dramático no segundo tempo. Logo aos cinco minutos, em jogada de raro talento, Zé do Carmo tocou para Boiadeiro, que viu Luiz Carlos Winck solto na ponta direita. O passe saiu preciso, o lateral avançou e cruzou com perfeição. A bola passou por Bebeto e foi parar na cabeça de Sorato, que completou no canto direito de Gilmar (JPEG, 21k e RA, 80k).

Após o gol, o Vasco recuou para explorar os contra-ataques e o São Paulo partiu com disposição para o ataque. Mas seu time não contava com "São Acácio". Aos 26 minutos, Neto cobrou falta pela direita e Nei cabeceou dentro da área com força. Acácio espalmou, a bola bateu na trave esquerda e saiu. Aos 35, foi a vez de Mário Tilico chutar e o goleiro defender bem. Aos 39, nova defesa a corner em cabecada de Nei.

A tarde era mesmo do Vasco, que desperdiçou um contra-ataque precioso com Bismarck solto dentro da área. O final foi emocionante. O árbitro Wilson Carlos dos Santos deu três minutos e meio de desconto até segurar a bola.

Com o troféu de campeão brasileiro passando pelas mãos de todos os jogadores, a começar pelas do capitão Zé do Carmo, o time do Vasco deu a volta olímpica no gramado do Morumbi em meio a uma grande festa. Por diversas vezes o grupo teve que parar para posar para fotografias e para agradecer os aplausos dos torcedores, inclusive os do São Paulo, que reconheceram o mérito da conquista pelo time carioca.

A emoção tomou conta dos milhares de torcedores que viajaram até São Paulo para incentivar o time e também dos jogadores. Um dos mais festejados era Sorato, que entrou para a história do clube por marcar o gol do título. Por coincidência, vestindo a camisa 7, mesmo número da utilizada pelo falecido Jorginho Carvoeiro quando marcou o tento da vitória por 2 a 1 na final de 1974 contra o Cruzeiro. Somente o palco da festa era diferente: Em 1974, o Vasco foi campeão no Maracanã; em 1989, no Morumbi. Em vibração, nada mudou. E os gritos de "casaca" ecoaram no estádio do adversário. Vasco campeão, com a torcida saindo em festa pelas ruas de São Paulo.