Patrocinadora do Vasco, JJ Invest é alvo de investigação da Polícia Federal e da CVM
Domingo, 06/01/2019 - 01:27
Mecenas improvável do futebol carioca, a empresa de investimentos JJ Invest foi alvo nesta sexta-feira de novo alerta do xerife do mercado financeiro. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que abrira processo contra ela em 2017, quer que a nova patrocinadora do Vasco pare de oferecer serviços de administração de investimentos, por não estar autorizada. A advertência é apenas um dos problemas da JJ Invest. Entregando rentabilidade de mais de 5% ao mês a centenas de investidores, a companhia é suspeita de arquitetar esquema de pirâmide financeira e é investigada em inquérito da Polícia Federal.

Fundada em 2016, a JJ Invest vem chamando atenção pela agressividade do seu marketing e pelo retorno das aplicações que oferece. Sediada em Copacabana - escolha inusual para uma gestora, cujo setor se concentra no Leblon -, a firma tem proporcionado ganhos entre 5% e 10% ao mês a seus investidores, disseram diversas pessoas a par dos negócios da empresa e como admitiu seu próprio fundador. As taxas são superiores às de qualquer concorrente, sobretudo em momento de juros de 6,5% ao ano.

Paralelamente, a JJ Invest vem multiplicando patrocínios esportivos: já seriam 25 os clubes apoiados, segundo sua assessoria de imprensa, além de espaços como o Centro de Futebol do Zico. E a investida publicitária extrapola o setor: a empresa apoiou até o réveillon da praia do Flamengo, como informou a colunista Marina Caruso, do GLOBO.

Em 26 de dezembro, a JJ Invest apareceu em um dos espaços publicitários mais disputados do mercado esportivo no planeta: o peito de Neymar. Foi no jogo beneficente Futebol contra a Fome, que ocorreu no Parque do Sabiá, em Uberlândia (MG), e teve patrocínio da empresa. De quebra, a companhia também estampou as camisas de outros atletas presentes, como Vinicius Júnior e Kaká.

No mesmo dia, a firma celebrou a façanha publicitária distribuindo, em e-mail a clientes, o que chamou de "excelente novidade".

"Em primeira mão, queremos informar que a JJ Invest agora tem um gestor credenciado da CVM e da Anbima! Agradecemos muito a sua confiança e desejamos que, em 2019, possamos realizar muitos sonhos! Estamos sempre à disposição!", disse a mensagem, enviada no fim da noite, e assinada por Jonas Jaimovick, único sócio da JJ Invest.

Depoimento na Polícia Federal

Mensagens como essa chamaram a atenção da CVM, que decidiu renovar seu alerta ao mercado. Ele veio 500 dias depois de uma primeira advertência, que estabeleceu multa diária de R$ 5 mil caso a irregularidade continuasse. Segundo fontes de mercado, a tendência agora é que tanto Jaimovick como a empresa sejam multados.

"A área (técnica) verificou indícios de que Jonas Spritzer Amar Jaimovick e Spritzer Consultoria Empresarial Eireli (razão social da JJ Invest) ofereciam publicamente serviços de administração e de consultoria de carteiras de valores mobiliários sem autorização prévia da autarquia", disse a CVM em comunicado.

No âmbito do processo iniciado em 2017, Jaimovick propôs pagamento de R$ 200 mil em termo de compromisso para encerrar a investigação, admitiu o empresário ao GLOBO. Até agora, porém, a proposta não foi aceita pela autarquia.

- A JJ Invest é uma incógnita. Ninguém sabe de onde eles surgiram, e o Jonas não era conhecido no mercado. Essa ascensão meio Cometa Halley causa estranheza - disse profissional de marketing esportivo que comandou o marketing de grande clube do Rio.

Procurado pelo GLOBO, Jaimovick admitiu que foi chamado a depor na Polícia Federal, mas negou que pratique esquema de pirâmide financeira ou qualquer tipo de fraude.

- Eu fui (à PF), mas isso tem uns dois meses. Eles só queriam ter certeza o que era, o que estava sendo oferecido - informou, acrescentando: - Não tem nada a ver com pirâmide. Para ser isso, teria que um estar entrando para o outro ganhar. Não tem nada disso - rebateu.

Restaurantes, start-ups e futebol

Segundo apurou o GLOBO, não está claro para as autoridades até agora onde a JJ Invest aplica o dinheiro. O empresário admitiu que não tem autorização para operar. Por causa disso, porém, a empresa teria trocado a área de atuação:

- A gente, na verdade, está sem operar Bolsa. Isso a gente não faz. Fazemos oportunidades de mercado mesmo. A gente tem restaurantes, algumas start-ups, investimos em "equity" (participação direta), time de futebol, jogador. É basicamente isso - disse Jaimovick , que ao ser perguntado sobre como funciona seu investimentos em start-ups, respondeu: - Tipo incubadora. Pegamos e vendemos depois. Hoje temos quatro start-ups, não tem muitas não. A ideia é captar mais.

E acrescentou:

- Com aquele problema todo da CVM (de 2017) eu praticamente parei... Praticamente, não, eu basicamente parei, e só fiz essa parte de patrocínio e outros investimentos fora de Bolsa. A burocracia é muito grande. Para start-up, indiretamente, é tranquilo.

Perguntado sobre quais start-ups fariam parte da carteira, disse que "não sei se poderia falar porque teria que ver com eles se poderiam falar, mas são do Rio."

A despeito de sua publicidade ter se fortalecido nos últimos meses, Jaimovick sustenta que a JJ Invest não está captando mais novos clientes. Seu site está fora do ar. Mas ele afirmou que o patrimônio administrado pela companhia está "chegando a R$ 40 milhões", aplicado por cerca de 600 investidores. Ele confirmou que a rentabilidade tem sido entre "5% e 10%" ao mês, que classificou de "razoável", mas garantiu que não promete nenhum retorno específico.

- Chegou a 1.500 (o número de investidores), mas, se eu não me engano, agora, ativos, devem ter uns 600. E alguns estão encerrando - completou o empresário, que preferiu não dizer quem são seus advogados alegando "sigilo da pessoa".

Após a reportagem ter entrevistado Jaimovick por telefone, a assessoria de imprensa da JJ Invest enviou nota dizendo que a JJ Invest "atua como holding e não faz gestão de carteiras."

"É que o gestor Ewerton Zacharias, credenciado pela CVM, mantém contrato de gestão com o empresário Jonas Jaimovick, para cuidar de seus investimentos pessoais somente", informou.

Perguntada sobre quem estaria gerindo os investimentos dos supostos 600 investidores, a assessoria disse que "esses investidores aplicam para a holding onde o Jonas aplica em restaurantes, esportes, eventos e não em valores mobiliários."

Um desconhecido do mercado

Aos 37 anos, Jaimovick é um desconhecido no mercado financeiro carioca.Formado em engenharia de computação na PUC-Rio, seu primeiro contato com o mercado foi quando estagiou na área de tecnologia de uma corretora, no início dos anos 2000.

Depois que a JJ Invest foi criada, seu nome começou a ser relacionado na lista de principais acionistas de certas empresas da Bolsa. Jaimovick tem hoje 15% das ações da Ideiasnet, participação que equivale hoje a R$ 13,6 milhões. Ele é o segundo maior acionista da empresa e entrou no capital da empresa no terceiro trimestre deste ano, segundo dados compilados pelo terminal financeiro Bloomberg. A aplicação vai mal: desde dezembro, as ações da companhia de investimento em tecnologia já despencou 43% na Bolsa . Antes, quem aparecia na relação de principais acionistas da Ideiasnet era a Spritzer Consultoria, da qual Jaimovick é sócio, com 10,03% do capital. Hoje, só ele é acionista.

O investidor também já deteve participação relevante na empresa de call centers Contax. Em julho de 2017, Jaimovick enviou carta à empresa comunicando que ele e a Spritzer haviam elevado sua participação na empresa de 4,5% para 6,91%, totalizando cerca de R$ 1,45 milhão. Três meses depois, porém, Jonas comunicou que haviam se desfeito de todos os papéis. As ações valiam praticamente a mesma coisa na ocasião.

Sem prejuízos até agora

Com a ascensão da empresa, Jaimovick também se tornou próximo de atletas e artistas. Em suas redes sociais, Jaimovick compartilha com frequência fotos ao lado de personalidades como Petkovic, Viviane Araújo, Roberto Dinamite, Zico e Sérgio Mallandro.

O empresário é atuante na comunidade judaica carioca e é nela que captou grande parte dos clientes da JJ Invest, disseram quatro fontes da comunidade. Apesar de indícios de pirâmide financeira, até agora a companhia estaria honrando os pagamentos aos aplicadores, disseram diversas fontes ao GLOBO, e não houve queixa de prejuízos à CVM.

- Quem está ganhando dinheiro gosta dele, mas é unanimidade que, em algum momento, isso representará um problema - disse um integrante da comunidade judaica que atua no setor esportivo.

O Vasco não quis se manifestar sobre a notícia. Mas fontes que acompanham de perto o clube dizem que o contrato celebrado com a JJ Invest prevê indenização caso algum evento relacionado à patrocinadora gere danos à imagem do Vasco. A JJ Invest é uma das principais patrocinadoras hoje do clube, estampando seu logo na parte central superior da camisa. O Vasco não divulga valores, mas Jaimovick afirmou que o contrato de patrocínio por um ano é de R$ 1 milhão.

Procurado, Zico disse que seu relacionamento com a JJ Invest é restrito a realizações de eventos esportivos.

- Não tenho nada a ver com a empresa. Realizo eventos no meu centro de futebol, e eles são nossos parceiros no Jogo das Estrelas, Copa da Amizade Brasil Japão e na Copa Zico - afirmou o ídolo do Flamengo.

Fonte: O Globo Online