Laíla, vitorioso diretor de carnaval da Beija-Flor, fala da paixão pelo Vasco: 'Torço mesmo, vou aos jogos'

Domingo, 22/09/2013 - 11:56
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O sambista responsável pelo maior espetáculo da terra de Nilópolis coleciona muitos títulos na estante da sala de casa, na Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio. E não apenas os de carnaval, mas, sobretudo, os de vinil. Com o copo de cerveja na mão e o queijo cortado no prato, Luiz Fernando do Carmo, o Laíla, está pronto para mais uma noite de desfile pelos 1.200 discos, a maioria de música clássica, sua preferida depois do samba.

É assim, de bermudão e chinelos, que ele senta ou deita no sofá para aproveitar o grande espetáculo das orquestras e ouvir as tão desejadas boas notas. No caso, as musicais.

- Além de samba, gosto é de música clássica. E ouço a qualquer hora. Se eu chegar em casa e quiser relaxar, pego qualquer disco e boto na vitrolinha - conta o diretor de carnaval da Beija-Flor, que ainda guarda parte da coleção na casa de praia de Araruama.

O programa, às vezes feito na companhia de um ou dois amigos - e só -, é um dos poucos capaz de aliviar o estresse adquirido nas muitas horas de trabalho no barracão da Azul e Branco. Mas nem isso tira o jeito sério de viver. E de olhar para os outros.

- Minha maneira é essa: não sou de fácil sorriso. Mas brinco com todo mundo. Não tem esse negócio de ditador. Só não gosto que mexam com meus funcionários, com a comunidade. É uma questão de respeito a eles - diz.

E é com esse estado de espírito que ele acorda, toma os seis remédios para diabetes e hipertensão e o cafezinho na padaria. Depois, lê jornal, toma outro café em casa e parte para o barracão sem pão nem manteiga. Com mais de 100kg, Laíla está de dieta por recomendação médica. E não pelo carnaval.

Tanto que o almoço, ao meio-dia em ponto, agora é só “salada, grelhado e mais nada”. Mesmo. Nem o “mocotózinho” ou o pato ensopado com batatas, o carneiro na brasa ou na panela, a rabada, a feijoada.

- Gosto de uma cervejinha, de leve. No fim de semana é que vou mais além. Mas bebo em casa, à tardinha, quando recebo amigos, parentes, o pessoal do samba. Ou num barzinho aqui perto - conta.

Cochilos até sentado dentro do carro

O diretor de carnaval da Beija-Flor só não consegue evitar um antigo hábito sedentário, o de dormir após o almoço. Onde quer que esteja, tira o cochilo de meia hora, 40 minutos, até sentado no banco do carro.

- Já deixo o carro na porta da casa dos amigos que é para dormir sem incomodar ninguém - diz.

O problema é quando as reuniões com patrocinadores viram pesadelo.

- Às vezes, tem reunião que começa às 10h e termina à noite. Até passar a hora do sono, demora. E o desespero que é? - admite.

Mas a sombra e a água fresca ele só encontra na casa de Araruama, o seu refúgio na Região dos Lagos. Lá vai à piscina, faz churrasquinho. E só.

- Nada de medo, não gosto de sair mesmo. Nem de viajar. Viajo e sinto saudade do Rio. E aí? Quando vou a outros lugares, só fico no hotel, descansando.

Craque no samba e também no futebol de campo

Laíla só não dorme em frente à TV porque ela está sempre desligada. Fã de rádio, ele prefere ouvir do que ver o noticiário, sobretudo, o esportivo. Mais um motivo para perder o sono em prol do carnaval de 2014 da Beija-Flor, que apresentará o enredo “O astro iluminado da comunicação brasileira”, em homenagem a ninguém menos do que Boni.

- Tenho uma boa equipe de pesquisadores montada aqui. Eles me trazem (a pesquisa) e eu coordeno. Não assisto a TV, não gosto - justifica ele.

Mas ele acompanha a concorrência:

- Nós é que botamos medo nelas (as outras escolas). Fazem carnaval para ganhar da gente. Rapaz, qualquer escola é concorrente a partir do momento em que faz um bom trabalho. Eu boto na cabeça de todos aqui: precisamos ganhar de onze.

O sangue azul e branco do sambista também traz as cores do time do coração, o Vasco da Gama.

- Torço mesmo, vou aos jogos. Sou da época da geral do Maracanã. De Vavá, Bellini, Orlando, Coronel, Sabará - lista Laíla, saudoso.

O ex-ponta direita do juvenil do São Cristóvão, que também foi meio-armador, quase foi craque também nos gramados.

- Tive de optar entre o futebol e o samba, porque o horário dos dois não dava certo. Pesou a consciência. Quis fazer o que mais gostava - conta Laíla.

Proteção por todos os lados

A disputa pelo título do carnaval carioca não envolve só samba. Mas também o poder. E o espiritual, é claro. Umbandista há cerca de 50 anos, Laíla sabe muito bem disso.

- Tem muita gente aí fazendo os maiores ebós do mundo para ganhar carnaval. Até boi trazem para cá. E depois tomam um monte de porrada. O nome da gente está constantemente em lugares indevidos. Por isso, é que eu ando sempre com o meu anjo da guarda aceso - conta Laíla.

O anjo da guarda e uma infinidade de entidades, santos católicos e da umbanda, cultuados na sua sala do carnaval e também no altar particular, montado em casa. As guias, penduradas em seu pescoço há mais de 25 anos, também ajudam na proteção. E enchem uma gaveta.

- As entidades sempre nos avisam. A gente sabe de onde veio o trabalho e, às vezes, até quem fez. Não mando nada de volta para ninguém. Mas não sou merecedor de sacanagem, pois respeito todo mundo - avisa o sambista.

Nascido e criado no Morro do Salgueiro, onde fundou a primeira escola mirim no Rio, o filho de Xangô, Ogum, Iansã e Iemanjá conheceu a umbanda do Seu Flávio, no Morro São João, em épocas difíceis, de desemprego. E a partir daí, não parou mais.

- Não sou vidente. Mas pressinto quando vamos ganhar o carnaval. Às vezes, todos gritam o já ganhou. Mas, no fundo, já sei que não vai ser a nossa vez - revela Laíla.



Fonte: Extra Online