Tenorio quer pagar 'dívida' com o Vasco marcando gols

Sexta-feira, 20/04/2012 - 11:18

A bola balançou a rede na estreia do Equador contra a Polônia na Copa do Mundo de 2006, e um famoso narrador do país sul-americano improvisou: "Nada pode parar o Demolidor". A origem do apelido de Carlos Tenorio nunca teve tanto sentido. Todos os dias, ele vai a São Januário para as sessões de fisioterapia. A muleta para amparar a perna direita, cujo tendão de Aquiles foi operado há pouco mais de um mês, quase desaparece com a força que o atacante passa a quem estiver ao lado e o sorriso de confiança de quem em breve estará de volta aos gramados. Bom humor é a marca registrada desse equatoriano, que não se intimida com o que a vida lhe apresenta. Lesão no terceiro jogo pelo Vasco e afastamento dos gramados por cerca de seis meses. Seria a "Maldição da camisa 11", que não deu sorte para nenhum jogador desde que voltou após ser aposentada por Romário? Apenas vírgulas na história que Tenorio quer contar na Colina.

- Quero fazer meu próprio nome. Não sou supersticioso. Na vida, acontece o que tem que acontecer. Essa coisa de maldição é inventada, depende da personalidade de cada um. Não vai me fazer mudar nada. A camisa 11 vai voltar. Não sei se vou ser artilheiro, mas vou trabalhar para ganhar títulos com a equipe. Estou em dívida com o Vasco hoje em dia, sem ter jogado, por uma coisa que nunca passei, e senti aqui. O apoio e carinho que recebi foram impressionantes. A única forma que posso pagar é com gols - garantiu o atacante.

Com origem em uma família de 23 irmãos, Tenorio lembra que nada foi fácil em sua carreira. O futebol começou em sua vida tarde, só aos 21 anos, quando, depois de se destacar nas peladas da cidade, resolveu bater na porta da LDU para fazer um teste. Pouco tempo depois, eram representantes da equipe equatoriana que chegavam a Esmeraldas, a cerca de 125km de Quito, para procurar aquele "menino forte". Os trabalhos de bico como mecânico industrial e ajudante no mercado de mariscos ficaram de lado, e a bola preencheu o espaço que faltava.

- Não passei pela base, tive que jogar direto na equipe profissional, mas fui muito bem. Os dois primeiros anos foram complicados porque tinha muitas coisas a favor, mas outras tantas em desvantagem. Era muito veloz, forte, mas não tinha o que se aprende nas categorias de base, como os fundamentos. Eles me apresentaram uma oportunidade, e eu sabia que era ela que poderia mudar a minha vida. Não podia deixar passar - lembrou o atacante, hoje com 32 anos, acrescentando que ficava horas depois dos treinos no gramado para compensar o tempo perdido na adolescência.

O esforço valeu a pena. Depois de dois anos na segunda divisão equatoriana com a LDU e a convocação para a Copa do Mundo de 2002, Tenorio deixou o país em direção ao mundo árabe. Jogou no Al-Nasr, onde conheceu Felipe, hoje novamente companheiro de equipe. O meia falava sobre as lembranças do Vasco e a vontade de voltar à Colina, o que despertou a curiosidade do Demolidor.

- Felipe me mostrava jogos contra o Flamengo. Dizia que o Vasco era o time do coração dele, onde começou. Falou coisas maravilhosas. O Vasco é uma equipe de muita trajetória, onde jogaram muitos jogadores que estão na história mundial, como Romário, Edmundo, o presidente do clube, senhor Roberto Dinamite. Hoje em dia, fazer parte do Vasco é satisfatório para qualquer jogador.

Tenorio, o Demolidor, quer ser gigante como o Vasco


Demolidor pensou em aposentadoria

A trajetória pelo Cruz-Maltino, porém, teve um percalço logo no início. Em seu terceiro jogo, contra o Olaria, pelo Carioca, Tenorio subiu para cabecear uma bola na área, e ao cair, rompeu por completo o tendão de Aquiles do pé direito. No dia seguinte, houve a necessidade de uma cirurgia, e a previsão de seis meses longe dos gramados foi comunicada pelo médico do Vasco, Dr. Alexandre Campello.

- No momento em que acontece, a primeira coisa que se pensa é que o médico vai dizer que é uma lesão de uma semana, ou coisa assim. Nunca se imagina que vá ser uma lesão que pode te deixar muito tempo fora. Quando ele (Campello) chegou e se deu conta que era algo no tendão de Aquiles, foi um momento em que pensei: 'Não pode ser'. Foi complicado - lembrou.

A frustração de deixar o campo logo após ter marcado o primeiro gol com a camisa do Vasco foi tão grande que Tenorio chegou a pensar em aposentadoria.

- No momento, deu a sensação de querer parar de jogar. Justo quando eu volto (do mundo árabe), que quero mudar de ares, chego em um futebol no qual sempre quis estar, acontece isso? Aí, você pensa: 'Será que chegou a minha hora de parar de jogar futebol?' Mas, à medida que vai passando o tempo, vai vendo que não é assim. Os companheiros daqui me apoiaram, a família também. Os problemas precisam ser vencidos. Sempre fui muito otimista. Sei que podem passar seis, sete meses, mas vou retornar, voltarei à forma e ficarei bem. A vida me ensinou muito. Se essa fosse a primeira vez, era mais complicado, mas já tive uma lesão de ligamento cruzado. Então, eu sei que posso me recuperar - garantiu.

Tenorio foi operado no início de março. A recuperação ainda está na fase da fisioterapia. Em cerca de três meses, o atacante já deve pode voltar aos treinos. Por enquanto, anda de muletas e usa um calçado especial, desenvolvido a pedido do Dr. Campello, para não forçar o tendão de Aquiles. A ajuda do médico foi essencial para a mudança de postura do jogador.

- Tenho muita confiança nele, foi uma pessoa que me motivou muito, para eu realizar a operação e continuar. No momento em que me tiraram o gesso, que vi os meus pés, sabia que poderia voltar a jogar. Entrei na fisioterapia e ouvi que podia ficar tranquilo, que ia ficar bem. Esse foi o momento que a confiança voltou - disse.

A personalidade positiva também ajudou. Tenorio lembra que não precisou da ajuda da psicóloga do clube e que buscou apoio apenas na família.

- Ao passar do tempo, um profissional de futebol precisa se preparar para isso. A realidade da vida. Não é toda lesão que vai estragar o seu momento. Os psicólogos passam a ser seus filhos. A confiança e o apoio que eles dão já são suficientes para relaxar e pensar em outra coisa.

A família Tenorio já está adaptada ao Rio de Janeiro. Os filhos Dianne e Justin, de 7 e 2 anos, estão na escola para aprender a falar e escrever em português. O mais velho já fala inglês, pois aprendeu nos Emirados Árabes, e espanhol. Casado há oito anos, o atacante começou a namorar a atual esposa quando tinha 17 anos.

Ronaldo como exemplo e alerta a Adriano

Para Tenorio, se não fosse a presença da família ao seu lado, a recuperação teria sido mais difícil. Mas ele acredita que a força principal vem de dentro. Por isso, usa exemplos da superação de Ronaldo, que também passou por graves lesões na carreira, e até mesmo de Adriano, atualmente com o mesmo problema no tendão de Aquiles.

- Ronaldo pode ser referência para mim ou para qualquer jogador de como saber vencer. Parar de jogar futebol não é uma questão econômica, é deixar o que gosta. Ronaldo é um exemplo. Quanto ao Adriano, depende só dele. Já voltou a jogar, sabe que pode. Eu venho todos os dias à fisioterapia, mas, se não mostro essa vontade, não vai solucionar nada. Os médicos estão aí para ajudar um pouco, mas 80% dependem da pessoa. Para voltar a jogar ou ter uma vida normal. Não quero estar com muletas toda a vida, para meus filhos me verem assim. Há muitas coisas para se motivar na vida - garantiu.

Fora da seleção equatoriana por vontade própria, Tenorio diz que ficará apenas assistindo à Copa de 2014. O motivo da saída da equipe nacional não teve a ver com discussões, mas sim com a vontade de ajudar a evolução do futebol no país.

- Eu renunciei à seleção há mais de um ano, por vontade própria. Muitas viagens. Sempre me disseram que eu estava louco, mas a vida não é o que as pessoas pensam. Tem muitos jovens que merecem oportunidades. Se eu continuasse, não viriam outros. Queria que o Equador evoluísse.

Apesar de não pensar mais em vestir o uniforme da seleção, Tenorio ainda tem sonhos, e todos estão na Colina.

- Quero recuperar-me e ser campeão. Hoje estou muito agradecido. E, se amanhã tiver que deixar a equipe, o Vasco vai ser um time que vou ter uma lembrança muito especial, que vai permanecer por toda a minha vida.

Fonte: GloboEsporte.com