Rubens Lopes diz que grandes depreciam Estadual, mas admite mudanças

Terça-feira, 27/03/2012 - 12:27

No gabinete da suntuosa sede da Federação de Futebol do Rio, o presidente tem, sobre a mesa, o DVD "Faltas contra o Botafogo", para rebater reclamação alvinegra. O Fluminense reclamou do campo do Bangu? Rubinho mandou editar o DVD "Gols perdidos pelo Fluminense", segundo ele, "para ver se é culpa do buraco". O Flamengo reclamou de faltas violentas? Ele saca o "Lances violentos do Flamengo". Admitindo que o Estadual deve mudar, acusa os grandes de depreciar o torneio.

O presidente da Federação do Rio diz que os clubes grandes depreciam o Estadual


Não lhe parece claro que o Campeonato Carioca precisa mudar?

Não tenho dúvida que algo precisa ser revisto. E este é o motivo do Conselho Arbitral de amanhã (hoje). Mas as mudanças precisam ser feitas após um estudo, um diagnóstico preciso. Contratamos um instituto de pesquisa para ter o tratamento adequado.

Mas qual o sintoma da doença?

A falta de público nos estádios. Precisamos entender o fenômeno. Um fator a gente exclui: o desinteresse pelo futebol. Na hora dos jogos, bares estão cheios e o pay-per-view cresce. Algo acontece para as pessoas não irem ao estádio.

Como será a pesquisa e quando estará pronta?

Será uma pesquisa de opinião, respondida pelo torcedor. Por exemplo: falam que jogar às 22h é ruim. Vamos saber o quanto isto impacta. Não dá para tratar as coisas pelo "eu acho". Queremos dados concretos e em 10 dias teremos o resultado.

Então será feito um Arbitral sem diagnóstico?

Sim, mas será importante se aceitar a necessidade de rever o processo. Nem que seja para concluir que não precisa mudar nada. Mas ninguém pode ignorar que o público não está no estádio, embora não seja fenômeno só do Estadual. Em 2011, o Fluminense, que é quem mais reclama, jogou mais de 70% dos jogos do primeiro turno do Brasileiro com menos de 7 mil pagantes. Em 2009, quase 30% dos jogos do Brasileiro tiveram menos de 10 mil pessoas. Em 2010 e 2011, mais de 30%. É o preço do ingresso? Também precisa ser revisto. Com jogos toda quarta e domingo, é difícil. E tem clube que deprecia o campeonato. Olha, tem estádios de difícil acesso, o horário não favorece, a TV passa ao vivo e o clube ainda diz que vai usar reservas. É como avisar ao torcedor: "Não vai que eu não vou".

É bom para o Rio ter clubes na Libertadores. Não dá para encontrar uma fórmula que evite que, pelo desgaste, eles usem reservas no Estadual?

Usam times alternativos porque querem. As datas não são coincidentes. Daqui a Buenos Aires é mais perto do que daqui a Belém. O clube deveria ter a consciência de avisar: "Neste campeonato não vou pôr titulares e não vou reclamar, porque estou recebendo para jogar, mas o campo é ruim, a despesa do Engenhão é alta, o jogo é às 22h e meus artistas não vão". E depois não reclama que o público não vai. Não é justo depreciar o campeonato e depois reclamar do público. E mais: por causa das cotas de TV, no Estadual eles ganham mais do que na Libertadores que, financeiramente, só é boa para quem vai às finais.

Os clubes pedem a redução do número de clubes e de jogos...

Primeiro, precisamos ter certeza de que é isso que influencia na presença de público. Não sei. O Brasileiro de 44 clubes teve média de público maior do que com 20. E os clubes esquecem que eles receberam uma importância da TV para aumentar o número de clubes. O aumento foi em função dos grandes porque no modelo de 12 clubes, frequentemente um pequeno ia à semifinal. Eles concordaram com o aumento e fizeram um contrato oferecendo 23 datas à TV. Se reduzir, vão ganhar menos? Vão querer? A TV vai concordar em pagar por 23 e receber menos? Não sei.

Dizem que o senhor é contra por questões políticas...

Uma coisa é certa: em 2013 não acontece nada, o regulamento diz que sobem dois e descem dois. Se as pesquisas provarem que este é o problema, eu defendo. O colégio eleitoral da Federação inclui todos os clubes, de todas as divisões, as ligas. Ter três ou quatro clubes a menos na Série A não vai influenciar eleição. É delírio.

Mas com menos clubes e jogos, talvez os clubes usem titulares...

Não sei. Por que não defendem a redução de outros campeonatos? Por que não pedem à CBF um Brasileiro de outro modelo?

Então o senhor acha que os clubes grandes são os culpados?

Não colocaria toda culpa neles, seria injusto. O problema é depreciar o produto. Neste Estadual, o Fluminense foi mestre em fazer isso.

No mundo globalizado, o público quer grandes duelos. Isto não esvazia os Estaduais?

Mas a nossa fórmula é a melhor do país. O Rio tem o melhor Estadual do Brasil, com seis a oito jogos decisivos. A média de público dos clássicos regionais é maior do que a média dos clássicos nacionais do Brasileiro. Porque os clássicos decidem no Estadual. Agora, o fechamento do Maracanã provocou queda de público. Tem a questão do transporte, não tem lugar para estacionar, em alguns estádios custa R$ 25 para estacionar. O torcedor vai ver um espetáculo em que o artista não é atraente, vai passar na TV, e o preço pesa. Ele vai escolher. Olha quantos fatores podem ter influência. Cada um com seu percentual.

O cuidado com os estádios não deve ser maior? Abel reclamou do estádio do Americano...

Claro, mas o Fluminense tem mania de reclamar de tudo. E tudo que ele reclama nunca vai acontecer no campo do Fluminense. Por quê? Não tem campo. Não tiro a razão do Abel. Estranho que tenha reclamado de forma inadequada. Na hora que detectou, deveria ter chamado um representante da Federação. Em relação ao campo do Bangu não procede reclamação.

O campo do Bangu não é ruim?

Visualmente, porque tem tipos diferentes de grama. Mas precisa pisar lá...

Mas os jogadores reclamam...

Alguns. O Vasco não reclamou. Só Loco Abreu reclamou. É preciso achar muleta para insucesso.

Mas um jovem vê diariamente jogos da Europa. De repente vê o campo do Bangu. Ele vai se desinteressar pelo Estadual?

Só se ele for Bangu. Na TV passam também jogos em São Januário, Macaé, Engenhão. Muito mais jogos em campos melhores.

Mas modernamente a exigência não é maior? Não há mais espaço para folclore, alçapão...

Claro que sim. Os clubes grandes devem ter este entendimento. A conta não fecha. O Fluminense ganha R$ 500 mil por jogo (da TV), dez vezes mais do que os pequenos. Para que a qualidade dos atores seja melhor, é preciso melhor distribuição de recursos. E o campeonato deveria ser mais bem remunerado pela TV, já que passa no maior número de estados.

Que nota dá para o Estadual?

Nota 7, para passar de ano. O campeonato não é ruim, há coisas que influenciam nele. Por mim, ninguém jogaria 22h. Dizem que o Engenhão já encheu às 22h. Sim, com o Flamengo na Libertadores. O torcedor sai do trabalho e tem que ficar zanzando na rua até o estádio abrir, sai meia-noite com medo de pegar trem, o estacionamento custa R$ 25. Ele diz: "Não vou". O ingresso podia ter preço revisto, com setores populares e áreas vips.

Como avalia o encontro com o novo presidente da CBF?

Foi um encontro social. Acho que a convocação dos clubes do Rio só se deu pela vinda dos clubes do São Paulo. Até porque já temos muito paulista... Ele falou que vai estar aberto a todos. Um discurso político.

O senhor teme um domínio político de São Paulo?

O país todo deve se preocupar. A CBF não pode privilegiar este ou aquele estado. Temos que dizer isso ao presidente e nos insurgir contra o que não for nesta diretriz.

Defende novas eleições?

É preciso ser legalista. O estatuto da CBF diz que na ausência do presidente, "A" deve assumir. Ponto. Marin é o legítimo presidente. Conceitual e filosoficamente, deveria haver eleição. A prorrogação do mandato foi específica ao Ricardo Teixeira para não haver descontinuidade em função da Copa de 2014. Se ele saiu, o motivo acabou. Mas Marin está lá legalmente. Se agir com neutralidade, terá apoio. Se não, terá resistência. Não podemos admitir interferência de pessoas alheias à CBF.

O senhor fala do presidente da Federação Paulista...

Não quero falar de ninguém. Qualquer presidente da CBF tem que assumir a presidência. Se quiser, pode ter um conselheiro. Mas o conselheiro não pode ter superioridade hierárquica. E a CBF não pode ter subordinação a alguém que não tem cargo. Se não, vamos nos insurgir.

Esta sede é suntuosa. A Ferj, assim como a CBF, está rica?

É questão de gestão. Se administra bem, não gasta mais do que a receita...

Quais são as receitas?

Percentual nas rendas e contratos, inclusive TV (a Ferj recebe 10% do contrato de TV, 10% das rendas do Estadual e Libertadores e 5% da renda do Brasileiro).

Quais são as despesas?

Uma delas é esta sede. Não é suntuosa, é adequada à importância do Rio. Os clubes têm que ter orgulho da sede. A Fifa e a Conmebol são assim. Temos custo de pessoal e até auxílio aos clubes. Aos menores e maiores. Há clubes maiores que se socorrem da federação. A Federação é credora de clube grande, não digo qual nem quanto. E todos cumprem seus compromissos.

Fonte: O Globo online