Psicóloga fala sobre trabalho feito na base do Vasco

Terça-feira, 24/01/2012 - 04:29

O futebol nos últimos tempos tem sido marcado pelos altos investimentos, onde jogadores que ainda não completaram a maioridade recebem salários astronômicos e passam a se achar os melhores do mundo mesmo sem terem alcançado ainda a equipe profissional. Nesse cenário a presença de uma pessoa que converse e aconselhe esses jovens é fundamental para que ele não seja uma eterna promessa até o final da carreira.

No Vasco, assim como na maioria dos clubes brasileiros, essa função cabe ao Departamento de Psicologia, que tem como objetivo fazer com que o atleta não perca o foco e saiba lidar com as frustrações que são normais no início de trajetória no esporte. Para saber como é o trabalho realizado com as promessas vascaínas, o SuperVasco.com conversou com a psicológa Amanda Cristina, que atualmente trabalha com a equipe juvenil do cruzmaltino.

Na entrevista, que você poderá conferir abaixo, Cristina explica como lidar com o garoto que não foi relacionado para determinada partida e frisa a importância do Departamento de Psicologia, hoje comandando por Maria Helena Rodriguez, para a manutenção do bom ambiente dentro de um clube de futebol.

Confira a entrevista exclusiva com a psicóloga:

Apresente-se para a torcida vascaína. Quem é a Amanda Cristina? Fale um pouco sobre sua carreira e de sua trajetória no Vasco até então e dos seus projetos para o futuro.

"Então, meu nome é Amanda Cristina, sou psicóloga formada a pouco mais de um ano, faço pós graduação em Psicologia do Esporte e Neurociências. Estou no Vasco desde Março de 2008. Em 2008 e 2009 fui estagiaria na categoria Mirim. Em 2010 Maria Helena (coordenadora de Psicologia do clube) me deu a oportunidade de subir de categoria e pular uma, indo para o Juvenil. Hoje continuo com a categoria Juvenil e faço atendimentos aos atletas menores de idade alojados no clube. Assim como todo atleta deseja chegar a Seleção Brasileira, eu também desejo. Se for no futebol então será um sonho do qual nunca vou querer acordar. Também tenho vontade de trabalhar com portadores de necessidades especiais".

Por qual motivo você escolheu trabalhar com psicologia do esporte?

"Na realidade nunca cogitei em trabalhar no esporte. Entrei na faculdade pensando em trabalhar com Psicologia Juridica. Foi muito por acaso minha entrada no Vasco. Eis que um dia acessei um site de noticias onde tinha um link que dizia que estava aberta seleção para estagiários de Educação Física. Eu sabia que no Vasco tinha uma psicóloga mas nunca passou na minha cabeça pedir uma entrevista ou conhecer o trabalho. Liguei para o clube e perguntei se tinha estagio em Psicologia. Combinei uma entrevista com Maria Helena algumas semanas depois e aqui estou eu. Porém a cada dia eu amo mais minha rotina, meu trabalho. Não me vejo fazendo outra coisa. Tanto que faço a pós, frequento mesas redondas, fóruns, encontros e congressos sobre a área. E quero continuar estudando, pois a demanda dos atletas de alto rendimento é muito grande. Amo imensamente minha profissão".

Você trabalhou em diferentes categorias da base vascaína. Existem diferenças nas estratégias de trabalho para cada uma delas?

"Existe sim. Cada categoria tem suas peculiaridades. Mas a base do trabalho é sempre a mesma. Acompanhamento semanal nos treinos, assistir aos jogos, preparar material para viagens, aplicação de testes, dinâmicas de grupo, psicodrama, treinamento de habilidades psicológicas entre outras coisas. Fazemos tudo isso ao longo do ano (pré-temporada, temporada e pós-temporada). As demandas vão variando conforme idade. Nas categorias Pré- Mirim e Mirim o trabalho tem que ser muito lúdico. No infantil a demanda gira em torno do nível de agressividade e a pressão familiar em ser a solução financeira.No Juvenil a demanda é em relação aos conflitos internos e pressão familiar. Já no Juniores trabalha-se o nível elevado de ansiedade, em chegar a equipe profissional ou não".

Como fazer para um jovem não sentir tanto ao subir de categoria e encontrar não mais a psicóloga anterior? Existe uma troca de informações entre vocês que trabalham no Vasco?

"Em relação a subir de categoria, é o objetivo deles. No começo existe o período de adaptação, normal. Nas ultimas semanas o treinador da categoria já vai comentando como que é a categoria de cima. Eu mesmo procuro trabalhar isso, sobre o “apego” com o grupo ou comissão. Falo que nem sempre eles jogarão com o atleta A ou B, que serão treinados pelo treinador X ou estarão com o coordenador Y. Em relação à troca de informações entre nós do Serviço de Psicologia isso acontece o tempo todo. Trabalhamos na mesma sala e sempre comentamos como esta sendo o dia com o grupo. Existe também as supervisões, onde todos expõe o trabalho, os resultados, os pontos positivos, os pontos negativos.... Não tem como não ter essa troca de informações".

Como vocês fazem para lidar com aquele garoto, aquele atleta, que por algum motivo não foi relacionado para uma partida?

"A frustração. O ideal não é nem passar a mão na cabeça e nem puxar a orelha por não ter sido escalado mas sim orientar para que o atleta leve mais a sério as atividades, as orientações... pedir para que se espelhe no titular da vaga e perguntar 'o que ele esta fazendo diferente de você pra ele ser titular e você não?'."

A psicóloga de uma determinada categoria, no seu caso a juvenil, também trabalha com a comissão técnica?

"Nosso trabalho é interdisciplinar. Trabalhamos com o preparador físico, com o preparador de goleiros, com o fisioterapeuta, com o serviço social, com a nutricionista e com outros profissionais. Estamos sempre trocando informações. Contudo, tendo cuidado com a ética, de não contar o que o atleta nos conta. Como os outros membros da comissão passam mais tempo com os atletas, e até mesmo pelo fato deles poderem estar em todos os lugares (como vestiário e concentração) e eu não, procuro sempre conversar com minha comissão técnica".

A Maria Helena vem realizando um belíssimo trabalho na equipe profissional do Vasco. O que você poderia falar sobre a sua relação e das outras psicólogas do clube com ela?

"Ela é sensacional, sabe muito. Apesar de estar o tempo todo com o profissional, ela não deixa de se preocupar com a base. Continua supervisionando nosso trabalho, orientando sobre o que devemos fazer. Sempre liga perguntando dos resultados e cobrando o melhor de nós. Além de estar sempre em contato conosco também esta sempre conversando com os coordenadores de todas as categorias".

Quais são as principais dificuldades que vocês que trabalham na psicologia das categorias de base do Vasco sentem?

"No Vasco hoje não existe mais dificuldade em exercer o papel de psicólogo do esporte não. O trabalho já é realizado a pouco mais de 25 anos de forma direta e em todas as categorias do futebol tem ou psicólogo ou estagiário. Pedimos para marcar nosso trabalho ao treinador ou ao coordenador e eles prontamente nos atendem. O trabalho é respeitado e valorizado. Tem treinador que fala que não fica sem mesmo. Os atletas também gostam. Uns mais outros menos mas ao longo do ano vamos mostrando a importância do nosso trabalho e quebrando as resistências. Talvez a maior dificuldade seja não ter um espaço apropriado para realizar todas as nossas atividades (que incluem palestras, dinâmicas, testes, vídeos, entrevistas, reuniões, etc)".

Na sua visão, qual é a importância da psicologia para os garotos da base, para os jogadores de futebol de um modo geral?

"Assim como a preparação física e a parte nutricional, o trabalho psicológico é muito importante. Saber administrar as emoções, sensações e sentimentos não é fácil. É um trabalho em conjunto, demorado mas muito produtivo. Os atletas de alto rendimento, como é o caso do Vasco, sofrem pressão de vários lados como família, comissão técnica, direção, empresários, torcida, jogadores de outros times, imprensa... Saber a forma como conversar com o árbitro num jogo quente, ter o controle de não se emocionar ao perder um pênalti ou nas provocações faz com que esse atleta seja referencia positiva ao grupo e a sociedade. Nossos atletas aprendem a ter controle emocional, aprendem a fazer visualização, relaxamento, aprendem a respeitar o próximo. Ninguém esta livre de estresse, aflição, ansiedade, nervosismo, sudorese e insônia. Atletas muito menos. Épocas decisivas são as mais criticas, onde o atleta tem que demonstrar muito equilíbrio emocional para não somatizar nada. O treinamento psicológico assegura um desempenho físico elevado, disciplina, perseverança, força de vontade, confiança e coragem. Além desse trabalho psicológico, enfatizamos a necessidade do estudo. No Vasco da Gama todo jogador menor de idade é obrigado a estudar e dentro do clube existe um colégio que atende a vida de atleta. O calendário é voltado para a vida do esportista e o mesmo não se prejudica na escola. Praticamente todos os dias tocamos nesse assunto".

Deixe uma mensagem final para o leitor do SuperVasco.

"Quero pedir para os leitores do SuperVasco que acompanhem e vibrem com a nossa base, que é muito preciosa. Não podemos esquecer que são seres humanos em formação tanto no caráter quanto no futebol. E o que frisamos a todos: NÃO EXISTE LIMITES PARA OS NOSSOS SONHOS, BASTA ACREDITAR".

Maria Helena e Amanda Cristina


Fonte: Supervasco