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Coordenador Humberto Rocha fala dos questionamentos sobre a base


Quarta-feira, 21/12/2011 - 14:17

Quando Rodrigo Caetano chegou ao Vasco, em 2009, o clube estava com a auto-estima devastada. Rebaixado para a segunda divisão, atolado em dívidas, com diversas dificuldades para contratar reforços e atrair nomes de qualidade para o elenco. A base do clube apresentou ao país nomes como Alex Teixeira, Philippe Coutinho, Souza e Alan Kardec, todos vendidos por um preço razoável para o exterior. Dois anos depois, com o time classificado para a Copa Libertadores e tendo vivido sua melhor temporada desde 2000, Caetano sai do clube alegando desgaste. Nos bastidores, porém, conta-se que o dirigente estaria insatisfeito com o trabalho realizado nas divisões de base do clube, que se reestruturou nos profissionais e cumpriu objetivos, mas não vê a presença maciça da base no próprio elenco.

Os números são bem fáceis de ser entendidos. No Campeonato Brasileiro, apenas Allan e Rômulo foram utilizados com mais frequência no elenco, que ainda contou com as presenças tímidas de Max, Jomar e Jonathan. Soma muito menor do que os 40% pretendidos por Caetano, que se mostrava insatisfeito com o trabalho realizado e teria entrado em conflito com o coordenador das categorias de base Humberto Rocha, amigo pessoal de Roberto Dinamite, assim como a maioria dos profissionais que foram contratados para comandar as categorias inferiores do clube.

A situação da base, nos dois primeiros anos, foi calamitosa. Faltavam coisas básicas para os jogadores, como comida, bolas para treinar e até campos de treinamento, deficiências que algumas vezes foram sanadas por alguns sócios do clube. Sempre que se pedia dinheiro, a resposta era a mesma: “Todos os esforços são feitos para que o Vasco volte á Série A. Não há dinheiro”. Além disso, foi priorizada a contratação de vários jogadores jovens e baratos de diversos lugares do país, entre eles Rômulo e Dedé, que deram certo, e uma maioria que ainda não vingou, formada por nomes como Diego Rosa, Lipe, Patrick, Douglas, etc. O Vasco, nesses três anosde ser um clube formador para ser um clube comprador de jogadores jovens e baratos.

O quadro só começou a melhorar quando o time fez um acordo com o empresário Pedrinho Vicençote, que também pertence ao quadro de associados, para treinar no CT dele em Itaguaí, a 70km de distância do Rio de Janeiro. O CT do clube, em Maricá, também já está sendo construído, fato que é citado por Humberto Rocha como algo que deixará um grande legado para as gerações futuras. “Trabalhamos em silêncio, sem aparecer para a imprensa, mas para deixar um legado para o Vasco. Tudo o que é feito aqui é falado para o presidente Roberto Dinamite. Não existem coisas às escondidas na base do Vasco, ao contrário do que foi insinuado”, afirmou o coordenador, sem citar nomes. Rocha afirmou também que avalia o ano de 2011 como positivo. “Estamos numa crescente e temos cinco jogadores nos profissionais, que é um número razoável”, finaliza.

Problemas a olhos vistos

O principal problema da base vascaína, ao contrário do que é alardeado por aí, não é a “farra de empresários”. Isso existe em todos os clubes, 99% dos atletas possuem um representante, e isso é até natural, pois numa negociação entre um clube e um menor de idade a presença de um representante pode ser útil para que haja um equilíbrio de forças. A falta de recursos, porém, ainda é um fator complicador, mesmo com a melhoria de 2011, e faz com que os profissionais que trabalham com os garotos precisem de outras fontes de renda. Um exemplo dessa situação é Tornado, técnico do sub-17 do clube, que acumula também a função de subsecretário de esportes da cidade de Duque de Caxias.

O orçamento também foi inflado pela já citada chegada dos jogadores trazidos por Rodrigo Caetano, que, aliada à não dispensa de outros, provocou um inchaço no elenco sub-20, que chegou a ter mais de 50 jogadores, o que gerou uma situação constrangedora. Como só há 45 lugares no ônibus, alguns deles não iam nem treinar, pois não havia transporte disponível para todos. O excesso de atletas também prejudicou a formação de muitos deles que passaram a atuar cada vez menos.

Um exemplo bem ilustrativo desse contexto é Willen, atacante com passagem pela seleção sub-17 e campeão da Copa Brasil da categoria em 2008 em cima do Santos de Neymar, que hoje é a terceira – talvez a quarta - opção para a posição nos juniores. Daquele time, aliás, apenas Allan, hoje nos profissionais, teve chances no clube. Washinton, meia habilidoso, acabou virando lateral direito e Belchior, capitão daquele time, machucou o joelho a serviço do Vasco, demorou seis meses para ser operado e mais seis na recuperação. O problema certamente respinga em outros jogadores que, ao verem o tratamento dado a quem se machucou a serviço do clube, certamente ficam inseguros.

O caso Muralha, outras saídas e a proposta de sindicância

Entre 2009 e 2011, a principal perda do clube foi o meio-campista Muralha. Comparado a Juninho Pernambucano e com um currículo de dez anos na base vascaína, ele deixou o clube em 2009 . Quando completou 16 anos, Muralha ganhava R$ 1 mil como amador, e o clube teria proposto cerca de R$ 1200 mensais no contrato profissional. Muralha não aceitou, teria feito uma contraproposta de cerca de R$ 2 mil e mais uma porcentagem do passe, valor ínfimo se comparado ao que outros jogadores recebem em clubes de outros estados. O Vasco não concordou em pagar e ele assinou com o Flamengo, rival pelo qual estreou nos profissionais em 2011.

Para Leonardo Gonçalves, líder do movimento de oposição “Cruzada Vascaína” e membro do conselho deliberativo do clube, não há mistério sobre a saída do volante. “O Humberto não acreditava no Muralha como jogador, achava que era gordo e não ia evoluir. Não concordo, mas é um direito dele pensar assim”, afirma Leonardo, que foi diretor da base vascaína entre 2004 e 2008, período em que o clube trabalhou na formação de nomes como Alex Teixeira, Souza, Alan Kardec e Philippe Coutinho.

Se a saída de Muralha pode ser tida como algo normal dentro do clube, o mesmo talvez não se possa dizer de outros jogadores que saíram recentemente dando indiretas. O caso mais conhecido é o do lateral direito Yago, que foi para o Flamengo firmando que há muitas coisas erradas na base do clube. O lateral, porém, não citou nomes e não disse o que houve de concreto. Outros jogadores também saíram chateados, como o meia Leandro Motta. A repetição dessas queixas levou a oposição do clube – não vinculada ao ex-presidente Eurico Miranda – a pedir uma sindicância na base em reunião do conselho deliberativo.

“Não há como afirmar que há gente mal intencionada nas divisões de base do Vasco, porque nada foi apurado. Por isso propusemos a sindicância no conselho deliberativo, que é o espaço certo para que esse assunto seja discutido. Mas o Roberto tem medo de fazer, porque há muitos cabos eleitorais dele por ali”, finaliza Leonardo Gonçalves.

Humberto Rocha, por sua vez, nega os rumores e contra-ataca. “Acho engraçado isso. Agora que estamos fazendo sucesso, chegam essas acusações. Temos mais recursos e mais forças, e onde rola dinheiro todo mundo quer se meter. Meu objetivo é trabalhar exclusivamente pelo Vasco”.

Sucesso no sub-15: Talento ou maturação precoce?

Um dos pontos positivos da base do Vasco no ano foi a categoria sub-15, que conquistou o título estadual numa final dramática em cima do Fluminense e, mais do que isso, cedeu cinco jogadores para a seleção brasileira, todos titulares. Outros clubes, porém, afirmam que, mais do que a diferença técnica, a parte física foi determinante para esse sucesso. Nomes como Baiano, Foguete, Danilo, e, principalmente, Matheus Índio e Mosquito, já chamam a atenção de clubes e empresários do Brasil e da Europa, mas alguns deles mostram uma maturação física bastante precoce, e isso faz a diferença contra garotos que ainda não se desenvolveram completamente. Apenas o tempo, porém, poderá responder essa questão apontando para o sucesso ou fracasso desses garotos nos profissionais e dizer quem está com a razão.

Alguns deles, no entanto, podem nem chegar aos profissionais do Vasco, pois não possuem contrato com o clube e podem sair antes dos 16 anos, de acordo com a legislação atual. É o caso, por exemplo, de Matheus Índio, que pertence ao Grupo Sonda, afirma já ter recebido proposta da Internazionale e joga a responsabilidade por sua permanência ou não no clube. “Quero ficar, mas o Vasco precisa fazer por onde”. O caso também teria irritado Rodrigo Caetano, que chegou a declarar. “Aqui no Vasco, não se fala do Matheus Índio”.

Outro que pode sair é Mosquito, artilheiro do Sul-Americano Sub-15 com 12 gols, que pertence à Traffic. O clube paga o preço de não ter preservado alguns de seus principais jogadores, como fizeram São Paulo, Cruzeiro e Atlético Paranaense, temendo a exposição de seus garotos, e faz uma aposta na amizade, em pessoas dentro do clube. A frase de Roberto Dinamite após a saída de Rodrigo Caetano é bastante emblemática nesse sentido. “O Vasco é maior que o Rodrigo, do que o Dinamite, do que todos nós”. Resta saber se esse lema será suficiente para fazer com que o Vasco continue como protagonista no futebol brasileiro sem o seu principal comandante fora das quatro linhas, as mesmas linhas nas quais será conhecida a resposta para essa pergunta em 2012.

Fonte: Olheiros.net