Roberto Dinamite relembra final do Brasileiro de 1974 contra o Cruzeiro
Quinta-feira, 24/06/2021 - 10:03
Cruzeiro e Vasco se encaram hoje (23), no Mineirão, pela Série B do Campeonato Brasileiro. Um dos grandes clássicos do nosso futebol, o confronto atual escancara uma realidade bastante distinta à de outrora, quando, por exemplo, estavam entre os melhores times do país e foram protagonistas da final de 1974. O jogo, válido pela sexta rodada, será às 21h30.

O melancólico tom que o duelo ganhou em 2021, inclusive, deixa em segundo plano uma marca histórica. A bola vai rolar logo mais para o 100º confronto entre as equipes. Na extensa lista de encontros, jogos que foram decisivos em competições nacionais e internacionais — lembre alguns abaixo.

Em uma profunda crise financeira e com extracampo bastante agitado nos últimos anos — por diferentes motivos —, as atuais diretorias buscam soluções para que os clubes possam, novamente, viver dias de glória.

Mandante no jogo de logo mais, o Cruzeiro está pelo segundo ano consecutivo na Segunda Divisão do Brasileiro. Com quatro pontos, o time celeste está na zona de rebaixamento. O Vasco, por sua vez, amargou, em 2020, o quarto rebaixamento em 12 anos. O triunfo sobre o CRB, no último sábado foi apenas o segundo na competição e aliviou um pouco a crise que já se avizinhava à Colina.

Em 1974, porém, o cenário era bem diferente e muito menos sorumbático. O Cruz-Maltino e a Raposa estiveram em lados opostos para definir quem seria o melhor time do Brasil naquele momento. Em um campeonato repleto de grandes times e jogadores que marcaram época, fizeram a final e o Vasco sagrou-se o primeiro time do Rio de Janeiro a levantar o Brasileiro, que teve a primeira edição em 1971. Posteriormente, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) reconheceria outros torneios como integrantes da mesma prateleira. A base daquela equipe do Cruzeiro, por sua vez, conquistaria, dois anos depois, a Libertadores.

Do lado mineiro, a equipe tinha nomes como Nelinho, Piazza, Dirceu Lopes e Palhinha. No lado carioca, Roberto Dinamite, Andrada, Alcir e Zanata.

"Essa final de 1974 foi uma das maiores tristezas da minha carreira. Foi um jogo que o Armando Marques [árbitro da final naquela ocasião] ganhou, e não o Vasco. Mas, Cruzeiro e Vasco sempre foi um dos grandes clássicos do futebol brasileiro, e é com tristeza que vejo, depois de tanto tempo, os dois clubes que são grandes demais nessa situação, na Segunda Divisão. É muito triste isso pela grandeza dos dois, principalmente a do Cruzeiro", lamentou, em entrevista ao UOL Esporte, Dirceu Lopes, um dos expoentes da história cruzeirense.

Artilheiro daquela edição do Brasileiro, com 16 gols, o jovem Roberto Dinamite começava a despontar e dar passos ainda mais importantes para se tornar o maior ídolo da história do Vasco. Ele lembra que o time de São Januário era experiente e evoluiu ao longo do torneio.

"Este time do Vasco era um time de muita pegada, experiência. Sabia o que poderia fazer e onde poderia chegar. E, quando tivemos a oportunidade, fomos crescendo dentro da competição. Eu era o mais novo naquela época, [o time] tinha jogadores mais experientes. Para mim, [o título] foi muito importante. O Vasco me deu uma força muito grande durante todo o campeonato", disse o ex-atacante, ao UOL Esporte.

"O Cruzeiro, teoricamente, era o favorito, tinha grandes jogadores, mas o Vasco mostrou que isso não bastava para ser campeão. O foco e a determinação foram muito grandes para conseguir aquela vitória. Foi uma conquista da superação", completou.

Polêmica na final

O Brasileiro de 74 foi dividido em três fases. A primeira, duas chaves com vinte clubes em cada, em turno único. Na próxima, quatro grupos com seis clubes, em turno único. Na fase final, um quadrangular que foi disputado entre Cruzeiro, Vasco, Santos e Internacional.

Após todos os duelos, o time mineiro e o carioca ficaram empatados na primeira colocação, com quatro pontos, enquanto Santos e Internacional ficaram com dois. O regulamento, então, previa um jogo extra entre Cruzeiro e Vasco a ser realizado no Mineirão pelo fato de o clube de Belo Horizonte ter tido melhor campanha ao longo do torneio. Mas o artigo 59 dizia que caso houvesse "tentativa de agressão ou agressão por parte do público ou de dirigente, associado ou empregado do clube local a árbitro, seus auxiliares, dirigentes, empregados ou jogadores do clube visitante, o Departamento de Futebol da CBD reestruturará a tabela do Campeonato, invertendo o mando de campo de três jogos subsequentes do clube local".

Com base neste artigo, a diretoria cruz-maltina pediu a mudança da partida para o Maracanã, lembrando o caso que ocorreu em 24 de julho de 74, já pela última etapa da competição, quando as equipes se enfrentaram no Mineirão e o duelo terminou empatado em 1 a 1. Na ocasião, Carmine Furletti, vice-presidente da Raposa, e o técnico Hilton Chaves, nos minutos finais, invadiram o gramado e foram para cima do árbitro Sebastião Rufino e dos auxiliares, sob a alegação de que não teriam marcado um pênalti.

A CBD, entidade que comandava o futebol brasileiro, decidiu esperar pelo julgamento de Carmine Furletti e Hilton Chaves, mas os dirigentes do clube mineiro aceitaram a alteração antes mesmo do julgamento.

Com a bola rolando, mais polêmica. Armando Marques anulou um gol de Jorginho Carvoeiro quando o Vasco vencia por 1 a 0. Depois, já com o duelo em 2 a 1 a favor dos cruz-maltinos, anulou um tento de Zé Carlos, do Cruzeiro, em lance que tem ecos até os dias de hoje.

Outros encontros decisivos

Cruzeiro e Vasco também fizeram outros confrontos importantes. No ano seguinte à referida final, se encontraram na fase de grupos da Libertadores — o clube mineiro avançou e o cruz-maltino foi eliminado. Em 1993, fizeram uma das semifinais da Copa do Brasil, com a Raposa levando a melhor. Após três anos, de novo na Copa do Brasil, se enfrentaram nas oitavas e, novamente, o Cruzeiro saiu classificado.

Os times estiveram em lados opostos nas oitavas de final da Libertadores de 98, e o Vasco se classificou. Na semifinal do Brasileiro de 2000, a equipe de São Januário celebrou novamente. Já nas quartas de final da Copa do Brasil de 2003, o Cruzeiro avançou.

Realidade atual

O Cruzeiro vive a pior crise de sua história. Sem dinheiro e com uma dívida global que se aproxima dos R$ 900 milhões, a Raposa não conseguiu o acesso à Série A neste ano, o que piorou ainda mais o cenário, já muito ruim pelos efeitos da pandemia. Em sua segunda temporada na Segunda Divisão, tenta voltar o quanto antes à elite nacional por um respiro financeiro melhor.

O clube tem dificuldades de pagar despesas básicas, como salários, que estão atrasados há meses com os jogadores — há pendências ainda de 2020 — e também funcionários do administrativo, inclusive os que recebem salários mais baixos.

"Espero que os dois se reergam, principalmente o Cruzeiro. Estamos na torcida, pedindo para que a diretoria do Cruzeiro se una, pois é muito triste para os torcedores, principalmente par mim que vivi a transformação positiva do clube no passado, ver essa situação. A Segunda Divisão não é lugar do Cruzeiro, tampouco do Vasco. Vou acompanhar esse jogo e torcer para termos um grande jogo, dois clubes de nome", disse Dirceu

A atual diretoria do Vasco assumiu o clube no início do ano, após eleição que chegou a parar no Supremo Tribunal Federal (STF). Depois do rebaixamento, o departamento de futebol passou por uma reformulação nos bastidores e no elenco. Em abril, o clube divulgou o balanço financeiro de 2020 — referente ao último ano de gestão de Alexandre Campello — e revelou uma assustadora dívida líquida de R$ 832,2 milhões, sendo que deste montante, R$ 314 milhões são consideradas a curto prazo.

Em campo, uma equipe que ainda tenta engrenar. Após um início de trabalho do técnico Marcelo Cabo com resultados até positivos, o time atravessou uma crise e, até aqui, soma sete pontos, ocupando apenas a nona colocação. Na última rodada, o triunfo sobre o CRB foi o primeiro em São Januário, após três partidas.

"Vasco e Cruzeiro já foram campeões, sempre foram time de ponta. Acredito no trabalho, na vontade, na determinação das pessoas. Claro que a situação não é só dentro do campo, mas acho que os dois clubes têm condições de sair desse cenário", apontou Dinamite.



Fonte: UOL