Isaque Souza e família recusaram amputação da perna, recomendada por médicos
Sábado, 15/09/2018 - 10:37
Isaque Souza, de 14 anos, não tinha limites para seus sonhos. Torcedor fanático do Flamengo, clube por onde passou de 2016 a 2017, não viu problemas em retomar sua carreira de jogador no Vasco, onde começou no futsal e conquistou títulos. O futuro parecia bastante promissor para o menino, morador do Jacarezinho, que já tinha até contrato com agentes. Na última quinta, tudo foi interrompido.

A carreira, por uma doença cruel, um câncer ósseo que começou no joelho e se espalhou pela perna. Sua vida, porém, talvez fosse salva por uma cirurgia que ele, com os pais, decidiu recusar.

Recomendada em março por médicos que o tratavam no Instituto Nacional do Câncer, a amputação da perna foi cancelada pela família na data marcada para a cirurgia. Segundo nota do Ministério Público do Rio, sua família, que é evangélica, revogou o consentimento que já havia sido assinado para a cirurgia.

Isaque deu entrada no Inca da Cruz Vermelha na quinta com dores para receber os medicamentos pela última vez. Não resistiu. Ontem, o corpo do atleta do Vasco foi sepultado no cemitério de Inhaúma, com presença de parentes e amigos.

O pai de Isaque, o gari José Claudio Souza, confirma que a família tinha fé na recuperação do menino. O futebol também norteava a esperança.

— A gente acreditava sempre, ele também. Falava que ia voltar. Essa força que ele tinha e sempre teve que fazia a gente perguntar: Filho, o que acha? Ele pediu pra não amputar a perna — conta o pai ao O GLOBO. – É Deus quem tá me segurando.

José Cláudio, também rubro-negro, diz que teve todo o apoio do Vasco, com assistência social e mobilização da categoria sub-14, com incentivo ao filho.

Em vão, órgãos tentaram convencer os pais

Segundo informações do Ministério Público do RJ, até dia 2 de agosto houve reiteradas tentativas de convencer a família a operar o menino. Em nota, o MP afirma que a promotora de Justiça informa que assim que foi informada do caso pelo serviço social do Inca, entrou em contato com a 1ª Vara da Infância e da Juventude da Capital.

Foi feita uma inspeção judicial, e o caso foi discutido com a equipe médica, com a assistente social e a psicóloga da pediatria do INCA. Em seguida, houve uma longa conversa com a família e com o adolescente, na tentativa de conscientizar a família quanto à importância do procedimento de amputação.

A promotora Agnes Mussliner entrou com uma representação por infração administrativa contra os pais do adolescente, denunciando o descumprimento das orientações médicas e o risco para a vida do adolescente. Houve tentativas de conscientizar a família, mas não houve acordo. A família se manteve irredutível, alegando crer na cura de Isaque sem qualquer cirurgia.

A promotora diz que ouviu o adolescente, mas Isaque confirmou que não desejava mesmo a amputação.

Vasco detectou tumor e ofereceu ajuda

Foi na base do Vasco que o problema ósseo de Isaque, atleta do clube há pouco tempo, foi descoberto. Como o menino sentia dores incessantes na perna direita, foi feito um pedido de biópsia apontou o problema. A evolução rápida do tumor no joelho direito fez Isaque abandonar o futebol.

Contactada pelo O GLOBO, a vice-presidente geral do Vasco, Sônia Andrade, afirma que conversou pessoalmente com os pais de Isaque na tentativa de convencê-los a aceitar a cirurgia e o tratamento quimioterápico, indicados pelos médicos como o adequado para ele. Ofereceu um ano de ajuda de custo e a possibilidade de ele fazer parte do time de futebol paralímpico do clube.

Segundo ela, o pai do jovem agradeceu o apoio, mas se mostrou irredutível em relação à amputação.

— O sonho era ele estar aqui, independente de qualquer coisa. Era ele estar com a gente. Independente do futebol e da carreira. A gente nunca almejou dinheiro e status. Sempre o esporte. O que daria para ele de inteligência e condição física — declarou o pai do jovem.

Pai diz que Inca optou por não operar Isaque

O pai de Isaque, José Cláudio, disse que o INCA no fim das contas também se deu conta de que a cirurgia não seria necessária.

— Decidiram não fazer. Quando deu tudo certo que ia fazer, a equipe médica entendeu que não havia necessidade também — afirma.

Procurado, o INCA informou em nota que não poderia passar informações clínicas sobre o paciente, devido ao Estatuto da Criança e do Adolescente.

"O sigilo médico, direito garantido pelo Código de Ética Médica, assegura que informações sobre o caso clínico não sejam repassadas".

Como a promotora Agnes Mussliner já entrou com representação, pode haver denúncia, caso se entenda que a morte poderia ser evitada pela cirurgia negada pelos pais.

— Quem escreve nossa história é Deus. Às vezes você quer alguma coisa e é pra ser de outro jeito. Creio que a essa hora ele já está no céu, feliz, sem dor — emociona-se José Cláudio.



Fonte: O Globo Online