Em entrevista coletiva, ex-vice-presidentes do Vasco criticam gestão de Campello
Segunda-feira, 07/05/2018 - 14:40
Os 13 vice-presidentes que deixaram o cargo desde a última sexta-feira conversaram com a imprensa na tarde desta segunda-feira. Ligados ao grupo Identidade Vasco, que tem como líder o presidente do Conselho Deliberativo, Roberto Monteiro, os dirigentes se queixaram de Alexandre Campello. Agora ex-aliados, a ruptura causou mais uma crise política no Cruz-Maltino.

Falta de transparência, problemas no balanço financeiro e a transferência de Paulinho foram alguns dos destaques. A ida do garoto ao Bayer Leverkusen gerou algumas controvérsias dentro do clube, principalmente para Fred Lopes, ex-vice de futebol. Segundo ele, a pasta com arquivos sobre o atacante desapareceu do clube e houve uma mudança repentina na porcentagem dos direitos do Vasco em cima do jogador.

- Na coletiva (de anúncio da venda), fiquei sabendo que seria 18 milhões de euros, e que o Vasco tinha 90% do Paulinho. Estranhamente, a pasta sobre o Paulinho sumiu dos arquivos do Vasco (...). Por que a venda do Paulinho foi uma caixa-preta? Não se trata uma venda dessa em duas ligações. Na primeira, disse que seria 20 milhões de euros e 15% para o Vasco. Depois, 20 milhões e 10%. Fui surpreendido pela coletiva, e foi exposto um número diferente. O que era 70% virou 90%.

Ainda sobre a negociação do atacante, Fred Lopes também contou que a própria coletiva sobre a negociação foi uma surpresa para os membros do departamento de futebol. Além disso, há também o problema de que o vice-presidente de finanças não ficava sabendo das operações.

- O vice de finanças, Orlando Marques, não sabia de nada. No dia da reunião da Lagoa, entraram R$ 6, 7 milhões nos cofres do Vasco, e a gente nem sabia a origem do dinheiro. Não está atendendo atletas, empresários cobrando atrasados. Demos a cara à tapa. Ninguém sabe a forma de pagamento da venda do Paulinho. Onde está o dinheiro? Por que não foi pago dezembro, 13º, férias, as imagens de alguns atletas?

- (...) O Vasco deve R$ 7 milhões de salários. Não foi utilizado para pagar isso, nem comissionamento, nem imagem. As pessoas sabem da venda do Paulinho e perguntam do pagamento. E eu não tenho resposta para dar.

Segundo Lopes, a negociação de Paulinho foi tratada totalmente pelo presidente, Bayer e o empresário, sem passar pelo departamento de futebol. O que chamou a atenção do então vice da pasta foi que em momento algum Campello disse qual era o clube e variou o percentual dos direitos que ficariam com o Vasco e o valor da transação.

- Todas as negociações foram feitas com o conhecimento do presidente. (...) Venda do Paulinho: não tratei vez alguma com o presidente. Ele me ligou e disse que tinha proposta, mas não quis dizer o clube. Ele disse: Temos uma proposta e estou pensando em vender por 20 milhões de euros e (ficar com) 15% dos direitos. O tempo passou, nenhuma reunião nem com o empresário. Depois, ele me ligou e avisou que ia vender. Perguntei a condição, e ele disse que seria 20 milhões de euros e participação de 10% dos direitos.

Quem também falou sobre a negociação envolvendo o atacante foi Orlando Marques, ex-vice de finanças. Segundo a tomar a palavra no pronunciamento feito, o dirigente contou que não tinha sido comunicado sobre os valores e somente ficou sabendo que "entraria um dinheiro".

- Até hoje não recebi o contrato do Paulinho. Não sei por quanto foi vendido, a forma de transação. Não sei se entrou dinheiro ou não. Não sei nada. Sobre o Douglas (volante) também não se sabe nada. Ele falava: "Não se preocupe, vai entrar um dinheiro bom aí". E aparecia: R$ 6 milhões, R$ 9 milhões.

Outras declarações de Fred Lopes (ex-vice de futebol)

Transparência

Não há dúvida (vão investigar o que estão questionando). Todos os casos levantados tem que ser apurados. Como conselheiros, precisamos acompanhar e cobrar que essa transparência apareça. É uma irresponsabilidade tratar de impeachment. Só se trata disso quando se prova irregularidade. O Vasco contratou quatro empresas renomadas para a auditoria. Zero problema com isso. O problema está na condução, em contratar quatro empresas e não ter informação.

Por que esses contratos (com as empresas de auditoria) não estão no financeiro? Até sexta-feira não estavam. Nós vamos atrás da transparência até o final. Se é pregado o discurso de transparência, ele tem que ir até o fim. Tem que ir para a prática. O departamento de finanças não saber o dinheiro do clube não é transparente.

É muto ruim esse discurso de transparência e colocar para a gente questão de balanço, de KPMG. Se o dinheiro entrou no clube, por que não ligou e avisou? Isso é transparência. Ninguém mais quer peça publicitária.

(...) Esse discurso de transparência tem que sair do campo da mídia e ir para a prática.

Ingerência de Campello

Viemos aqui prestar esclarecimentos que motivaram nossa saída da gestão administrativa. Quero agradecer à comissão técnica, ao Zé Ricardo, a todos os jogadores. Fui um dos que convenceram o Campello a aceitar a candidatura dele à presidência. Não esperava essa mudança de conduta entre o tempo de campanha e o da gestão. Os motivos são claros: a ingerência na construção dos profissionais que trabalhavam no departamento de futebol. Eu só contratei o Carlos Brazil para a base e trouxe o Bruno Carvalho, que não é remunerado.

Pelaipe foi indicado pelo Carlos Leite. Newton Drummond indicado pelo Rodrigo Caetano. Os supervisores foram indicados pelo Campello. Nada contra os profissionais, mas foi o momento que vi que o discurso era um, a prática era outra. Com a saída do Rodrigo Caetano do Flamengo, começou a pressão para que houvesse a mudança na parada para a Copa do Mundo.

Questões financeiras

Eu não entrei para isso. Entrei para fazer o trabalho sério, como deve ser feito. Não havia reunião de diretoria. Em 100 dias, fizemos quatro reuniões. Nos últimos 30 dias, não teve nenhuma. Fui falar com o Campello diversas vezes. Sabia que o clima estava ruim. Ele, sob alegação de balanço... Eu disse: 'Campello, não é isso'. Tivemos reunião há 45 dias cobrando. Foi um movimento coletivo (a saída). Não dá para continuar. Houve quebra de confiança. Não confio nas informações. Existe um financeiro paralelo dentro do Vasco. Que conversa é essa? Que brincadeira é essa?

Mensagem a Campello

Presidente Campello, saio por quebra de confiança. Eu acreditei no senhor, mas neste momento você não representa mais nem as minhas opiniões nem do grupo que está aqui hoje. Só lamento o tempo que demorei para tomar essa decisão. Não tenho mais interesse. Quero, sim, preservar a instituição. Precisa passar por um período de paz. Mas não é dessa forma, falando de uma forma e tratando de outra.

Saída da diretoria, mas permanência no clube

Todos nós aqui somos conselheiros do Vasco, continuamos na vida política do clube. Nós não pensamos em retornar. Procurei várias vezes tentar reverter esse quadro de crise. Pensamos em continuar no Conselho Deliberativo. Não há interesse em retaliação. Queremos que a gestão seja transparente e profissional. Isso que vamos exigir.

Impeachment de Campello

Talvez oposição (esteja falando sobre). Ninguém está falando em impeachment. Estamos falando da saída da gestão por não concordar. Ninguém falou. Não li nenhuma frase dos membros do grupo. Isso não está nos planos, não foi discutido.

Empréstimos de Campello

Sobre esse assunto (empréstimo de R$ 160 mil), seria melhor o Luiz falar. Soube disso no sábado. Parece que houve três empréstimos. Segundo informação, esse dinheiro foi devolvido ao clube, mas não sabemos a origem.

Razões para a saída

A insatisfação começou desde o momento em que foram feitas as composições de pasta (das vice-presidências). Depois, voltou à tona a pressão para trazer o Rodrigo Caetano para o Vasco. Depois, a venda do Paulinho. O clima já era muito ruim. O que nos mantinha? A tentativa de diálogo. Eu tentava reunir para que fizéssemos uma correção de rumo, para que se chegasse a um denominador comum. Na última reunião comigo, ele deixou bem claro que não haveria possibilidade de diálogo.

Ele está com a caneta na mão, mas tem que sentar com o grupo que o elegeu. Ele não pode tomar as decisões sozinho. Que conversa é essa de tomar posição no financeiro e ninguém sabe a origem do dinheiro? Nada tem a ver com o resultado de campo nem com a questão da invasão. Até porque o time está bem, ganhou de 4 a 1, está no G-4.

Interesses do clube

Carlos Leite é empresário, está no papel dele. Nós é que temos que fazer essa defesa, blindar os interesses do clube. Se eu fosse o presidente, eu ia sentar com meu vice-presidente, não ia para uma reunião dessa sozinho.

Balanço financeiro

Nós seguimos a questão do estatuto, que é soberano. Nenhum de nós teve acesso ao balanço, mas ajudamos com informações.

Dívidas

Não sei o caminho que o presidente vai tomar. Mas uma coisa é certa: quando existe entrada de uma magnitude dessa, da venda do Paulinho, a necessidade de fazer política de pagamento com os credores é fundamental. Não é só Martín. É Wagner, Rios, Desábato... Todos que têm imagem, débito. Quem deve tem que dar satisfação. Esse é um dos motivos que estou indignado

Outras declarações de Orlando Marques (ex-vice de finanças)

Rotina no clube

O dia a dia nós chamamos de contas não pagas. Eu me dediquei nestas contas não pagas. O meu dia a dia era conversar com fornecedores, negociar dívidas, dividir os problemas, convencer os empresários e servidores não colocarem mais uma ação para o Vasco. Eu conseguia que, no mínimo, me dessem dois, três dias. Negociei todas as dívidas de contas não pagas que o Vasco tinha. Conservação do campo, do placar, pintura, material administrativo.

Se eu ficasse 4 horas no clube, 3h50 eu atendia as pessoas e negociava a melhor forma de pagarmos a eles. Quando a situação entrou em rotina, que era mais fácil de administrar, começamos a cobrar: 'Cadê a auditoria? Vamos fazer uma reunião? Até hoje não apareceu.

Balanço financeiro

O marco de água que entornou o copo: ele me chamou na quinta para se explicar, que estava sendo perseguido, era uma questão política, disse: "Você sabe muito bem que estamos fazendo o balanço". Eu disse: "Não recebi balanço nenhum. Não recebi um documento". Quando falei que não havia recebido o documento nem o balanço, Campello respondeu: "Você procura na Internet". (...) Até hoje o balanço não está auditado.

Quando assumi a pasta, recebi a informação do atual presidente que algumas empresas estariam sendo contratadas para fazer o balanço. No dia seguinte tinha pessoas dentro da minha área tendo toda a autonomia possível e com toda a ajuda que pude dar. O Vasco foi encontrado numa situação bem distinta. As dívidas trabalhistas, fiscais, as certidões...

Transparência

Não havia transparência, e tínhamos que engolir tudo que fazia. O processo não era dos melhores. A forma de nos tratar era da pior maneira possível. Eu engolia sapo porque o Vasco estava andando. Não tínhamos informação de nada.

Declarações de Paulo César Rezende Moreira (ex-vice de relações públicas)

Falta de comunicação

Tivemos uma reunião e foi colocado isso: temos problema de impostos, apropriação indébita é crime. Em nenhum momento tivemos esse respaldo. Sabíamos através da imprensa que pagavam o salário dos jogadores. Não havia comunicação alguma. Essa transparência muito pregada, no meu caso, foi completamente ausente.

Problemas internos

No início do nosso trabalho, falando em transparência, fui convidado a auxiliar o RH porque a pasta do Patrimônio estava muito pesada e havia demanda de muitos empregados. De pronto levantei o quadro dos pagamentos. Se tem uma coisa que funciona no Vasco, é o RH. Peguei toda a demanda das obrigações a cumprir. Eu vinha falando com o Orlando sobre rescisões, pagamentos. E ele respondia: "Não temos dinheiro".

Entenda a crise vascaína

Os problemas internos já vinham se desenrolando há algum tempo no Vasco. O estopim foi o balanço do Vasco divulgado na semana passada. A auditoria externa feita pela empresa KPMG incomodou alguns membros da diretoria, principalmente os envolvidos com a Identidade Vasco, grupo liderado por Roberto Monteiro. A partir daí, problemas internos começaram a ficar mais afloradas entre membros do grupo e Alexandre Campello, que é criticado por centralizar algumas decisões.

Na sexta-feira, um grupo de vândalos invadiu São Januário e as pessoas que estavam no local relatam que ouviram tiros. Campello foi à 17ª DP, de São Cristóvão para prestar queixa. Enquanto estava no local, a imprensa começou a divulgar a saída de Fred Lopes do cargo de Vice-Presidente de Futebol. Ele foi o primeiro do grupo a deixar o cargo.

Também na sexta-feira, o vice de patrimônio foi afastado da operação dos jogos que, segundo Campello, sabia da possibilidade de invasão de São Januário e não tomou as devidas providências. O presidente classificou todo o episódio daquela manhã como "minimamente estranho".

A tarde de sábado chegou com uma nota publicada pelo Identidade Vasco em sua página no Facebook. Nela, anunciava que todos os 13 vice-presidentes da gestão de Campello estavam deixando seus cargos de maneira irrevogável. Dessa forma, o Cruz-Maltino conta agora apenas com três VPs nos cargos.



Fonte: GloboEsporte.com