Ministério Público quer rever distribuição da cota de TV aos clubes

Domingo, 30/08/2015 - 17:28
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O dinheiro distribuído a clubes de futebol pelos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro virou alvo do Ministério Público Federal.

O MPF acredita que a atual forma de partilha das cotas de TV, negociadas individualmente pelos clubes, não é justa com os times menores.

Procurado por clubes insatisfeitos, o subprocurador-geral da República, Sady d'Assumpção Torres Filho, entrou com pedido de investigação no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sugerindo que exista abuso, além de prática de conduta contra concorrência.

Em sua representação, o subprocurador argumenta que, apesar de o Clube dos 13 ter acabado em 2011, os times que eram filiados à entidade continuam se beneficiando de melhores contratos de TV.

Até 2011, a negociação era feita pelo Clube dos 13. A partir daquele ano, clubes como Corinthians e Flamengo, que dão mais audiência na TV, passaram a negociar diretamente com a Globo - a iniciativa implodiu o Clube dos 13.

Para Torres, a movimentação dos grandes times impõe "dificuldades de negociação aos demais concorrentes que, apesar de disputarem as mesmas competições, não têm, individualmente, o mesmo poder de barganha".

Em 2011, a TV Globo pagava R$ 343 milhões pelo campeonato, sendo que Flamengo e Corinthians, com R$ 25 milhões cada, abocanhavam 14,6% do total. Neste ano, o valor chegou a R$ 986 milhões, mas a participação dos dois clubes chegou a 22,3% (R$ 170 milhões) cada um.

A partir do ano que vem, a diferença será ainda maior. Enquanto Corinthians e Flamengo passarão a receber R$ 170 milhões ao ano (e juntos terão 24,8% do total), times como Bahia, Coritiba, Goiás, Atlético-PR, Sport e Vitória terão R$ 35 milhões cada um.

'ESPANHOLIZAÇÃO'

Para Torres, é preciso mudar essa realidade para evitar a "espanholização". No país, os clubes também negociam de forma individualizada, uma das razões, segundo ele, para o abismo de Real Madrid e Barcelona em relação aos demais.

Já na Inglaterra, a Premier League é quem faz o repasse do dinheiro da TV, seguindo alguns critérios: 50% divididos igualmente entre todas as equipes, 25% de acordo com o mérito esportivo e 25% dependendo do número de partidas transmitidas.

Para Torres, o atual formato brasileiro resulta em "prejuízo para a coletividade". "A qualidade dos campeonatos cai muito por causa dessa diferença no que é pago."

De início, o Cade disse não ver infração à ordem econômica, mas o MPF recorreu. Caso não tenha sucesso, o órgão pode ir à Justiça.

CBF afirma que formato não afeta competitividade

A CBF respondeu ao Cade em fevereiro de 2015, quando José Maria Marin, atualmente preso na Suíça, ainda era o presidente.

Àquela altura, a entidade disse que "o modelo de comercialização individualizada [dos direitos] não mostrou causar impacto na competitividade do campeonato".

Procurada pela reportagem, a atual gestão da CBF, com Marco Polo Del Nero na presidência, informou que enxerga na "relação de quatro décadas do futebol brasileiro com a TV Globo, que envolve não apenas a seleção brasileira, mas também os grandes clubes do país, como um dos maiores cases de sucesso de parceria da história do futebol mundial".

De acordo com a entidade, "hoje, a emissora injeta mais de R$ 1 bilhão por ano na modalidade, sendo o maior patrocinador do esporte".

Segundo a CBF, como a negociação é direta com os clubes, a entidade atua apenas como "interveniente e garantidora da realização do campeonato".

Para as Séries C e D do Campeonato Brasileiro de 2015, que envolvem 60 clubes de todas as regiões do país, a CBF firmou contrato com o canal Esporte Interativo - assim, pela primeira vez, as quatro divisões do futebol nacional têm transmissão ao vivo.

A entidade disse ainda ao Cade que, "no caso específico dos amistosos da seleção brasileira, a CBF tem também uma relação de décadas com a TV Globo, que sempre ofereceu valores superiores aos das concorrentes e pagou pela exibição dos jogos valores compatíveis com a grandeza da equipe pentacampeã mundial".

Para TV Globo, modelo é positivo para o futebol

A reportagem procurou a Rede Globo, principal compradora dos direitos de TV do futebol brasileiro, para que a emissora comentasse a investigação pedida pelo Ministério Público Federal ao Cade sobre a partilha das cotas de televisão.

A assessoria da Globo informou que não se manifesta sobre processos em andamento.

Anteriormente, contudo, em resposta ao Cade, a emissora disse que as negociações com os clubes não comprometem a qualidade do torneio.

"As principais negociações realizadas entre o Grupo Globo e os clubes de futebol têm impactado positivamente a qualidade das competições (ou, em alguns casos, evitado a queda de qualidade das mesmas), em razão dos altos valores pagos pelos direitos e pela alavancagem das demais receitas dos clubes, em razão da maximização das audiências dos jogos", escreveu.

Disse ainda que "a qualquer comprador de direitos de eventos de futebol interessa que seja o mais competitivo possível".

A Globo afirmou também que a mudança no formato da negociação trouxe "melhora significativa nas condições econômicas e qualitativas para os clubes, jogadores e torcedores, permitindo ao futebol brasileiro galgar um novo patamar, aumento de visibilidade dos clubes, audiências, maiores receitas publicitárias, maiores vendas de assinaturas e de produtos relacionados ao Campeonato Brasileiro".

A Globo cita ainda que, desde que as negociações passaram a ser individuais, o valor investido por ano mais que dobrou.

Fonte: Folha de São Paulo