Diretor do Consórcio Maracanã diz que só quer grandes jogos no estádio e comenta polêmica entre Vasco e Fluminense

Sábado, 14/03/2015 - 19:35
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No futebol do Rio de Janeiro, não são apenas os clubes que têm motivo para reclamar dos jogos deficitários no Campeonato Carioca. Pouco menos de dois anos após a reinauguração do Maracanã, a concessionária que administra o estádio ainda luta para fechar no azul. Ao menos, é o que assegura o diretor de marketing da companhia, Marcelo Frazão. Em uma longa entrevista para o GloboEsporte.com, entre os mais diferentes assuntos, ele disse que o Maracanã, com sua capacidade completa, precisa receber partidas com pelo menos 30 mil pagantes para manter sua saúde financeira em dia e defendeu que o estádio não receba mais jogos de pouco apelo.

- O Maracanã tem dado prejuízo. O futebol como atração é extremamente deficitário. O Maracanã precisa de um público de 25 a 30 mil. Depende do ingresso médio, mas a conta é essa de 30 mil, algo em torno disso. Para um estádio de 78 mil lugares, é inviável abrir para um jogo como Flamengo x Volta Redonda. É certeza absoluta de prejuízo. O estádio não foi feito para isso - disse, sentado em um dos camarotes do estádio.

Hoje com 41 anos, esse engenheiro de formação foi chamado para trabalhar no estádio quando a Maracanã S/A, controlada pela Odebrecht, assumiu a concessão do local por 35 anos. Ele cuida da relação com imprensa e clubes e, além da parte de eventos, shows e tours, é o responsável pela venda de patrocínios e camarotes. Frazão sabe que tem a missão de dar viabilidade financeira ao gigante que recebeu a final da última Copa do Mundo e, por isso, quer cruzar as fronteiras do futebol, transformando o Maracanã em uma espécie de Camp Nou brasileiro.

- Temos hoje quatro unidades de negócios no estádio: o futebol, o tour pelo estádio, o Maracanãzinho, e os eventos e shows, que vão desde festas infantis até lançamentos de carros. São atividades que independem do futebol. Tivemos o show do Foo Fighters em janeiro, e quase dobramos o número de visitantes no tour no primeiro bimestre. Temos o potencial de ser o Camp Nou brasileiro, um ponto de turista obrigatório. Mas é óbvio que o peso do futebol é o maior - explicou.

Durante a entrevista, Frazão disse que tem buscado cortar gastos para "evitar uma sangria maior". Por exemplo, diminuindo a capacidade do estádio em jogos de pouco apelo. O trabalho de levar o torcedor ao estádio também está sendo feito, garante, e ele usa os Rolling Stones como exemplo.

- Neste ano, deverá ter Rolling Stones no Rio de Janeiro. Todo mundo já conhece a banda. Se o produtor deles tivesse a mesma cabeça de quem produz o futebol atualmente, o que faria? Deixaria só a mídia publicar e não faria publicidade. Mas não é isso o que acontece. Ele vai te massacrar com publicidade para ir ao show.

Para o diretor, a grande oferta de jogos atualmente atrapalha consideravelmente, o que causaria uma overdose de futebol. Além disso, abordou temas espinhosos como filas para a compra de ingressos - revelou que o Procon os autorizou a cobrar preços promocionais dias antes do jogo, para estimular o público a não deixar para adquirir bilhetes de última hora - e sobre a polêmica entre Vasco e Fluminense pelo Setor Sul do Maraca.

Confira a entrevista completa:

Qual é o público mínimo para que um jogo de futebol no Maracanã, hoje, seja rentável?

O Maracanã precisa de um público de 25 a 30 mil. Depende do ingresso médio, mas a conta é essa de 30 mil, algo em torno disso. Para um estádio de 78 mil lugares, é inviável abrir para um jogo como Flamengo x Volta Redonda. É certeza absoluta de prejuízo. O estádio não foi feito para isso. Nunca foi, ainda mais agora com a mudança do modelo de gestão. Não há lugar no mundo em que isso aconteça. Temos o tamanho do Old Trafford, do Olímpico de Roma, e não existe jogo com menos de 30 mil pessoas nesses estádios. Não há viabilidade e nem lógica abrir o Maracanã para um jogo com menos de 20 mil pessoas. A estrutura do estádio não é feita para esses jogos.

Mas há quem diga que o Maracanã sempre recebeu esses jogos?

O que acontecia era um estádio subsidiado pelo governo. Ou seja, pelo contribuinte, tanto aquele que gosta de futebol ou não. Alguém pagava essa conta. No modelo antigo, além de pagar a conta, o cidadão tinha um serviço discutível, desde a limpeza de banheiro até outros detalhes. A manutenção era praticamente nula, o estádio vivia em reformas. E chegamos ao novo modelo. Agora há um direito de exploração do Maracanã sem qualquer subsídio do governo. Pelo contrário, temos nossos compromissos pelo direito de explorar o estádio. Temos manutenções enormes, bem diferente do Maracanã antigo: iluminação, ar condicionado, elevador, escadas rolantes, enfim, produtos de limpeza... É óbvio que a entidade vai buscar uma viabilidade financeira. Alguém está pagando a conta. Ou o contribuinte volta a pagar a conta para um serviço pior, sem manutenção, ou teremos um estádio com suas responsabilidades financeiras.

Se os custos de manutenção são tão altos, o que tem sido feito para diminuir as despesas?

Não tem sentido abrir um estádio inteiro para um jogo que não vai ter 30 mil. Então, o que fizemos? Criamos um estádio de 30 mil dentro do Maracanã, fechando determinados setores para que esses jogos sejam menos deficitários. Fechamos outro prédio, no Setor Leste. Temos que abrir de qualquer forma o Oeste, porque tem a imprensa, as cadeiras cativas... Abrimos Norte ou Sul, dependendo do time que está mandando. Criamos uma maneira de chegar perto de ficar perto de operar os jogos. Com a capacidade para 30 mil, precisamos receber 20 mil, 21 mil pagantes para ficar no azul. Em um jogo com 7 mil pagantes temos um prejuízo enorme, mesmo fazendo todas essas reduções.

E como estão elevando as receitas?

Temos hoje quatro unidades de negócios no estádio: o futebol, o tour pelo estádio, o Maracanãzinho, e os eventos e shows, que vão desde festas infantis até lançamentos de carros. São atividades que independem do futebol. Tivemos o show do Foo Fighters em janeiro, e quase dobramos o número de visitantes no tour no primeiro bimestre. Temos o potencial de ser o Camp Nou brasileiro, um ponto de turista obrigatório. Mas é óbvio que o peso do futebol é o maior.

No clássico de aniversário da cidade, Fla e Bota lucraram só 23,7% da bilheteria, e o Maracanã levou 46,7% da renda, entre aluguel e custos operacional. Por que essa diferença?

A relação do Maracanã com o público é proporcional. Por isso nosso grito. Estamos preocupados. Não cobramos valor fixo para receber os jogos e queremos vender ingresso. Precisamos de público, nossa remuneração está diretamente ligada à presença dos torcedores. Não vejo aluguel baixo ser publicado. Quando aparece um valor nominal alto na nossa conta, é manchete. O aluguel é proporcional ao público. Tem jogo que recebemos 13 mil de aluguel. Não cobramos isso para eventos na tribuna. E há um contrassenso absoluto. Há uma desconexão na análise ruim dos números, que acho ruim para o futebol carioca. Enquanto Palmeiras e Corinthians faturam com a venda de ingressos, aqui há um grito como se o preço do carioca fosse o maior do Brasil.

A federação diz que preços mais baixos elevam o público. Os preços praticados hoje não afastam os torcedores?

O preço do ingresso é regulamentado pelo mercado. E é ótimo pode falar sobre isso. Ao contrário do que é colocado pela imprensa, o preço do Rio de Janeiro está abaixo do mercado nacional. A diferença... Tenho dados: teve nesta semana Corinthians x São Bernardo, quarta-feira à noite, no Itaquerão, 22h, com transmissão ao vivo. O preço médio, e não estou comparando público, da renda dividida pelo público deu quase R$ 40 no Itaquerão. No Maracanã, no mesmo horário de quarta-feira, deu R$ 27. Então, nós estamos falando de um mercado que está operando 44% mais baixo. O Rio de Janeiro está muito abaixo de São Paulo, abaixo de Minas Gerais, balizando Porto Alegre. Se pegar qualquer índice econômico do Rio, isso não faz sentido. Cinemas e restaurantes têm os mesmos preços de São Paulo. Imóveis no Rio são mais caros. Os preços estão abaixo do mercado.

Por que estádios tão vazios?

Há uma overdose de opções de futebol. Se pegarmos o Flamengo... perdi a conta, mas acho que jogou seis ou sete vezes em um mês no Maracanã, sendo 80% desses jogos com televisão aberta. Não há bolso e interesse que resista. É fácil colocar o canhão no Campeonato Carioca. Tem que colocar escassez, um desejo. Fora do Brasil não é assim. É óbvio que onde há um racionamento, onde o clube joga duas ou três vezes por mês, o interesse vai aumentar. São tantos jogos em um mês... Há uma banalização do espetáculo futebol, muita exposição na televisão.

O que pode ser feito para levantar a média de público?

Se me perguntar o que falta, é valorizar o espetáculo, valorizar os jogos. Fazer uma campanha para que outros públicos venham aos jogos. O público que vem ao estádio é o que se interessa pelo futebol. O que a gente precisa em um estádio de 78 mil pessoas é atrair outros públicos com promoções. Vou dar um exemplo. Neste ano, deverá ter Rolling Stones no Rio de Janeiro. Todo mundo já conhece a banda. Se o produtor deles tivesse a mesma cabeça de quem produz o futebol atualmente, o que faria? Deixaria só a mídia publicar e não faria publicidade. Mas não é isso o que acontece. Ele vai te massacrar com publicidade para ir ao show. Estará no ônibus que você vai pegar, no jornal que lê, na televisão que assistir... Terá aquela matéria entrevistando o Mick Jagger pela décima vez. Esse dinheiro não é disputado pelo futebol. Fica aquele pensamento: "Vá e apareça". Alguém tem que fazer esse papel de promoção, e nós temos feito bem.

Como é a divisão de lucros e despesas no contrato com o Fluminense?

Tem alguns termos de confiabilidade, mas posso dizer algo. No caso do Fluminense, tradicionalmente você tem o modelo de estádio em que divide setores. Alguns setores são do Fluminense, e outros são do Maracanã. Então, o Fluminense administra sua receita direta. E nós temos outros setores que buscamos receitas. É o modelo do Cruzeiro com a Minas Arenas, eu acho. Há uma certa competição, e no Carioca, por haver uma renda divida, estamos revendo isso. Mas essa é a lógica do contrato.

E no caso do Flamengo?

Com o Flamengo, você tem uma participação societária direta em todas as partes do estádio. Então, ganhamos juntos e perdemos juntos. O Flamengo em especial tem uma remuneração em casos de públicos acima de 30 mil, de 35 mil, na qual eles têm uma proporcionalidade e ganham muito acima. São contratos diferentes. Do Vasco e Botafogo são pontuais e não vale a pena comentar. Em ambos os casos, é importante dizer que não há valor fixo. É interesse nosso, do Flamengo e do Fluminense que os estádios estejam cheios.

Qual é a posição do Maracanã na polêmica entre Fluminense e Vasco pelo lado da arquibancada?

Não somos árbitros. Temos contrato com o Fluminense e respeitamos isso. Se o Fluminense entrar em um acordo com o Vasco, ótimo. A nossa posição é de respeitar o contrato, eles que têm que se entender. O que causa estranhamento é aparecer um factoide que domina todas as questões. Já tivemos três Fluminense x Vasco aqui dentro e agora começa isso. Ao invés de fazer uma festa bonita para 40 mil pessoas, tivemos 8 mil no Engenhão, com prejuízo, e recorde de pessoas presas antes do jogo. Será que esses caras estariam longe das famílias se não houvesse essa polêmica? Não são santos, mas eles foram mobilizados por uma energia... O futebol é uma energia muito forte. Uma semana depois tivemos um Botafogo x Flamengo maravilhoso aqui dentro. Acaba levando para um lado horroroso. É um desperdício.

Muitos torcedores reclamaram de enfrentarem longas filas para comprar ingresso e entrar no Maracanã em jogos de grande público. O que aconteceu?

O Maracanã mudou e temos muitos setores diferentes. É Norte Sul, Norte Superior, Leste, Maracanã Mais... Antigamente você só tinha geral, arquibancada cadeira azul ou especial e, se quisesse, poderia andar de um lado a outro do estádio para ver o jogo perto de cada gol. Então, a venda hoje é mais complexa e demorada. Temos lugares marcados em metade do estádio, é uma demora maior. O torcedor paga com cartão de débito e crédito, apresenta carteira de estudante... O processo é mais demorado. Isso não veio acompanhado do planejamento do torcedor. Não há estádio do mundo em que você consiga vender 20 mil ingressos em uma hora como nós temos feito aqui. Dá confusão mesmo, demora. Não tem condição física. No Flamengo e Botafogo foi assim. Foram 20 mil ingressos vendidos depois da abertura dos portões. Esse número deve significar o terceiro maior público do Campeonato Carioca que começou a comprar ingresso depois dos portões abertos.

Há medidas para alterar esse quadro?

A cobrança do público até certo ponto é correta. Para o Fluminense x Botafogo, já tentamos algumas melhorias que deram bons resultados. Do outro lado, há uma comunicação para o torcedor chegar mais cedo, mas que nem sempre há um bom resultado. Não tem cerveja no estádio. Então, os torcedores ficam bebendo até cinco minutos antes de o jogo começar e entram todos animados ao mesmo tempo com o jogo começando. Não falo de violência, se vai ter ou não, falo do operacional. Isso faz uma diferença enorme em relação ao passado. Há uma série de questões, mas tem um limite, como no caso do Flamengo x Botafogo, que a gente não consegue. Não tem como. O Procon nos autorizou recentemente a fazer com que o ingresso antecipado seja promocional. Vamos conversar com os clubes para ver isso ainda. É uma bela saída. Você vai comprar um ingresso antecipado e paga menos que o valor no dia do jogo, para estimular o cara a comprar antecipado.

Fonte: GloboEsporte.com