Para Juninho, jogadores mais jovens já não respeitam os ídolos

Sábado, 16/06/2012 - 11:07

Juninho Pernambucano teve o privilégio de fazer parte de uma geração que venceu dois Campeonatos Brasileiros no Vasco : 1997 e 2000. Ali, ganhava o apelido de Reizinho, mas assim mesmo era um coadjuvante. Vez por outra, mais reserva do que titular. De volta ao clube dez anos depois, vive na pele o que Edmundo, Romário, Luizão e Donizete viveram na conquista de títulos importantes. Em entrevista ao iG, o meia avalia o elenco atual, lamenta a saída de Allan, a falta de reposição no ataque e analisa a transição de Cristóvão Borges de auxiliar técnico para treinador. Aos 37 anos, campeão por onde passou, lamenta que os contratos dos juniores ganhando como profissional têm acabado com a hierarquia no futebol brasileiro. Segundo Juninho, os mais jovens já não respeitam tanto os mais velhos.

Entender que derrotas virão, mas não fazer delas crise no Brasileiro

O Vasco não tem um time brilhante como aquele, mas tem um bom time, um time competitivo. Penso assim: se a gente quiser, se dedicar, a comissão técnica ir até o fim apostando, se planejando e o clube não sofrer quando as derrotas vierem, acho que temos condições, sim, de chegar no título. Para ser campeão tem que fazer tudo certinho, e é muito importante o time se preparar para os momentos ruins. Às vezes, você perde um, dois jogos e vem uma pressão forte de fora, a equipe sente, sofre, se abate e às vezes se entrega. A gente precisa estar pronto para saber que isso vai acontecer, derrotas são inevitáveis. Só que o grupo precisa estar pronto para não deixar elas estragarem tudo. Fizemos dois jogos bons contra o Corinthians. Nos apresentamos melhor do que o Santos agora contra eles na Libertadores. E eu nem acho o Corinthians brilhante. Eles têm cinco, seis substituições importantes que funcionam ali. Então, volto a bater nesta tecla: se a gente se conscientizar que é preciso esforço, é preciso fazer um rodízio, que precisa se preparar para o momento difícil, não pode aceitar a crise, temos chance, sim. Não participar da Sul-Americana é algo também positivo, porque no fim do ano você acaba jogando quarta e domingo com viagem internacional. Isso desgasta.

Qualidade do elenco

A gente hoje tem uma defesa boa, um bom meio-campo. Na frente, nos falta peça de reposição. O Eder Luis é importantíssimo, mas ninguém ali faz aquela função dele. Outra coisa: não temos peça de reposição para o Alecsandro . O Vasco hoje tem apenas um atacante. Acho que quando o Tenório voltar da contusão, ele vai nos ajudar. Eu confio muito nele. O cara me chama a atenção. Ele rompeu o ligamento, mas está todo o dia aí, sempre sorrindo, nunca faltou a um treino. O cara não perdeu nada de massa muscular, continua forte, é um tanque. Vai ser uma solução quando estiver recuperado.

Saída do meia Allan

Posso falar uma coisa? O Allan joga muito. O Vasco está perdendo um grande jogador. Parece que não, mas ele ia ser muito útil ao grupo. Jogador inteligente, versátil. Fará muita falta ao Vasco.

Cristóvão ainda precisa ser um pouco mais disciplinador

Eu acompanhei a transição dele. O Cristóvão hoje é um treinador. Cristóvão já é técnico. No começo foi difícil. Por quê? Como ele era o auxiliar, era ele quem ficava mais próximo dos jogadores. O Ricardo (Gomes) era amigo, conversava, mas mantinha certa distância, porque era o técnico, não podia ficar ali muito íntimo. Então o Cristóvão assumiu. O auxiliar sempre brinca, o técnico não brinca. Ele brinca mais, senta numa mesa com os jogadores. O treinador nunca vai fazer isso. É natural, porque no fundo quem vai decidir é o treinador. E chegou um momento que ele se viu treinador. O assistente técnico nem sempre fala aquilo que ele pensa, quem fala é o treinador. Então no início foi difícil, mas hoje, é uma opinião minha, ele entende a distância que tem de existir. A conversa aberta é a grande característica dele. Mas a disciplina é fundamental. Você colocar uma disciplina como assistente técnico e colocar como treinador, isso é uma diferente muito grande. Mas que hoje, um ano depois, ele consegue colocar isso na hora. Mas, pela minha experiência, quanto mais disciplina ele puder botar, melhor. Jogador de futebol é igual criança. Ele tem que saber que só pode chegar até esta linha, se passar desta linha ele vai perder. É assim que funciona. Cristóvão está conseguindo, mas acho que ele deve colocar um pouquinho mais (de disciplina), acho que ele precisa.

Os mais jovens já não respeitam tanto os ídolos

A geração de hoje não entende que precisa esperar o seu tempo. Existe, existe...Não um ciúme porque ciúme é uma palavra muito forte, mas existe tudo isso. Alguns entendem, os mais jovens não entendem. Eu já passei por isso. Eu sempre entendi que a minha hora ia chegar, mas talvez a geração de hoje não entenda isso, porque o jogador de hoje já é muito valorizado ainda jovem. Na minha época, a gente não fazia contrato longo, não tinha liberdade quando acabava um contrato. Então, existia uma hierarquia, e a hierarquia está sendo quebrada, que eu acho que é uma coisa que não deveria ser. Não que dentro de campo eu não me sentisse com liberdade para fazer o que eu queria fazer, mas a hierarquia hoje é muito menor. Eu sempre respeitei muito, mas o jovem hoje se impõe muito mais, porque já fez contrato longo, porque tem metade do passe pertencendo a uma empresa. Então, na minha chegada, eu senti isso. Mas eu cheguei para tentar ser campeão com eles, era meu objetivo. E nem ia querer me impor na marra porque não é a minha personalidade.

Dinheiro mexe com a cabeça dos mais jovens

Naquela época, eu ajudava um time a funcionar. Hoje, eu me comporto como mais um, mas é lógico que existem coisas naturais, a torcida tem uma identificação comigo. Eles sabem disso estçao vendo. Mas não que isso me faça deixar de correr, deixar de marcar, deixar de fazer coberturas dos mais jovens, ou deixar de discutir com eles no jogo. Isso sem problema nenhum. Quando falo que a hierarquia é diferente hoje é que para alguns, eles sentem a necessidade também de se impor neste sentido, eles não entendem que existe uma cobrança maior a eles e menor aos mais velhos. Não que seja uma coisa polêmica, e que atrapalha. Mas tem garoto dos juniores que têm contrato profissional, que ganham como profissional. Foi a mudança do futebol. Talvez o Brasil ainda esteja buscando este equilíbrio. Com a dificuldade financeira dos clubes, o que acontece? O clube pega um cara que é promissor aos 16 anos, o cara assina por quatro, cinco anos. Tem cara ganhando R$ 10 mil. Meu primeiro contrato, eu ganhava R$ 700 como profissional no Sport Recife. Então, esta diferença...Queira ou não queira, o dinheiro mexe com as pessoas, entendeu? Eu sinto isso. O cara quer falar, quer contestar.

Fonte: IG