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NETVASCO - 25/11/2007 - 03:00 - Torcidas organizadas dividem o Rio em áreas de guerra

A rivalidade entre as torcidas organizadas do Rio está transformando a cidade num campo minado. Obcecados por futebol, torcedores fanáticos dos quatro grandes clubes cariocas — Flamengo, Vasco, Botafogo e Fluminense — estão demarcando seu território, proibindo a presença de rivais e espalhando medo por toda a cidade.

Uniformizados ou não, aqueles que são identificados numa área dominada por ‘inimigos’ são perseguidos, agredidos e expulsos do local. Para se tornar uma vítima, nem é preciso ser integrante de alguma organizada, basta que sejam torcedores de um time adversário para serem hostilizados.

Levantamento de O DIA com informações de componentes das torcidas Jovem do Flamengo, Força Jovem do Vasco, Fúria Jovem do Botafogo e Young Flu mostra os 15 principais pontos de combate dos membros destas quatro facções, as mais violentas do Rio. O mapeamento também aponta por quem eles são controlados, como é o caso das ruas Santa Clara e Rodolfo Dantas, em Copacabana, redutos da Jovem Fla, e da Rua dos Artistas, na Tijuca, dominada pela galera da Fúria Jovem.

“Invadir território inimigo hoje é o mesmo que tentar atravessar a Faixa de Gaza segurando uma bandeira de Israel. É pedir para morrer”, compara um integrante da Força Jovem do Vasco que, por questões de segurança, preferiu não se identificar, referindo-se ao território palestino.

A mais recente vítima desta guerra entre torcedores rivais foi o rubro-negro Germano Soares da Silva, 44, que morreu quinta-feira. Líder da torcida Jovem Fla, ele foi espancado durante briga com integrantes da Força Jovem, dia 16. O confronto aconteceu na Praça 15, no Centro, e envolveu mais de 100 pessoas. Cinqüenta e cinco foram detidas e levadas para a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).

Membro da Young Flu há 10 anos, o tricolor X. tem uma explicação para tanta intolerância: “A rivalidade é muito grande, e todos querem ser soberanos. Quanto mais violenta, mais respeitada ela é. Por isso quem ‘planta a cara’ em território dominado por ‘alemães’ tem que ter disposição, porque será caçado”.

‘GUERREIROS’ TÊM TRATAMENTO VIP NAS FACÇÕES

Justamente por seu comportamento violento, os brigões das organizadas são respeitados dentro das facções. Os mais cruéis são chamados de ‘guerreiros’ e recebem tratamento VIP. Sempre prontos para agredir rivais, têm uma série de benefícios.

“Os homens de frente são sempre os primeiros em tudo: a ganhar ingressos para os jogos, a ser chamados para as viagens quando as partidas são disputadas fora do Rio e, às vezes, até recebem ajuda de custo para firmar na torcida e dar apoio nas batalhas”, revela um integrante da ‘tropa de elite’ da Fúria Jovem, do Botafogo.

Mas, segundo este mesmo torcedor alvinegro, que já perdeu a conta de quantas batalhas participou, nem tudo são flores para os ‘guerreiros’.

“A cobrança em cima da gente é muito grande. Na hora dos confrontos, por exemplo, não podemos nem pensar em recuar, temos que ‘sustentar’, senão ficamos desmoralizados e somos cobrados”, frisou outro guerreiro, integrante da Jovem Fla.

Inconformado com a morte de Germano, ele anuncia mudanças na torcida. “Já estamos nos movimentando para dar o troco neles (torcedores da Força Jovem do Vasco). Isso não vai ficar assim. A galera da pesada mesmo, que tinha se aposentado, já está se articulando para voltar. Vamos sacudir a casa deles”, ameaça o torcedor, acrescentando que haverá punição para os integrantes da Jovem Fla que participaram da briga entre as duas organizadas.

“Ninguém é obrigado a brigar. Mas o que não pode é abandonar o barco e deixar um parceiro sozinho como fizeram com o Germano. Eles foram covardes, por isso serão cobrados. Ser integrante de torcida organizada não é brincadeira, é preciso ter peito, ter coragem, e isso aquela molecada não teve”, critica o rubro-negro.

O respeito aos ‘guerreiros’ conquistado ao longo dos anos entre os rivais tem um preço. “Depois que entramos, não temos mais como sair. Por mais que a gente tente, ficamos marcados para sempre. Eu mesmo já abandonei essa vida há dois anos, mas até hoje sei que tem ‘alemão’ me caçando”, desabafa um tricolor que, desde que abandonou a Young Flu, nunca mais voltou a um estádio de futebol.

COMANDANTE É CONTRA O FIM DAS TORCIDAS

Comandante do Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (Gepe) há oito anos, o major Marcelo Vianna Pessoa conhece como poucos a estrutura das torcidas organizadas do Rio. Ameaçado de morte por grupos de torcedores incomodados com o trabalho de prevenção e repressão aos confrontos, geralmente programados via Internet, ele acredita que a rivalidade e a intolerância entre esses grupos sempre vão existir.

“Não há como mudar isso. O que não podemos admitir é que prevaleça a falta de respeito entre esses torcedores, que são capazes de qualquer sacrifício por seus clubes. Tampouco podemos permitir que eles coloquem em risco a segurança de outros cidadãos que não têm nada a ver com essa guerra”, afirma o policial, que se diz contra a extinção das torcidas organizadas.

“Mas desde que sejam realmente organizadas, porque, do jeito que estão funcionando hoje, não têm nada de organizadas”, diz o major. “Mais parecem um monstro criado por interesses pessoais e por amor ao clube, porém que cresceu sem forma nem conteúdo. Agora temos que dar um jeito de domá-lo e de educá-lo. Caso contrário, continuaremos enxugando gelo e nunca acabaremos com essa guerra absurda que assusta e preocupa os torcedores de bem.”

Mesmo entre amigos, rivalidade é maior do qualquer laço

Amigos, amigos, fanatismo à parte. A rivalidade doentia nutrida entre torcedores de times adversários leva a situações extremas, como a de pessoas capazes de se espancar mesmo mantendo laços de amizade. O mais incrível é que, em alguns casos, no dia seguinte aos confrontos os mesmos ‘guerreiros’ conseguem conviver e se relacionar como se nada tivesse acontecido.

“Durante as batalhas deixamos de ser cidadãos comuns e passamos a agir como guerreiros, por isso não reconhecemos ninguém como amigos, a não ser nossos companheiros de torcida”, explica um integrante da Força Jovem do Vasco.

“Nessas horas, qualquer um que não seja da nossa facção é ‘alemão’, e ‘alemão’ tem que morrer”, diz um membro da Young Flu.

Integrante da violenta Fúria Jovem, um alvinegro lembra que, certa vez, reencontrou um amigo de infância que não via há alguns anos durante uma briga entre botafoguenses e tricolores. O confronto aconteceu a poucos metros da sede da Young Flu, no Méier, e cada um estava de um lado.

AMIGOS NO TRABALHO

“Foi incrível, porque não sabia que ele era da Young Flu, e o reconheci durante uma briga, quando já estava prestes a lhe acertar um soco. Quando nos olhamos, a surpresa foi tão grande que acabamos nos empurrando para que cada um fosse para um lado, para não termos que bater um no outro. Mas foi por pouco”, recorda o alvinegro da Fúria.

Coincidência mesmo aconteceu com um integrante da Fúria Jovem e outro da Torcida Jovem do Flamengo. Companheiros de trabalho, os dois se tornaram amigos graças ao amor comum pelo futebol. Poucos meses depois a dupla descobriu que já havia estado frente a frente num duelo entre flamenguistas e botafoguenses.

“Foi uma surpresa imensa para nós dois. Nunca imaginava que ele era integrante de uma torcida organizada, assim como ele também não sabia que eu era. Mas soubemos lidar com a situação e hoje continuamos amigos. Pelo menos enquanto estamos no trabalho”, brinca o rubro-negro.

Fonte: O Dia



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