Netvasco - 11/04 - 06:34 -
Confira entrevista com o quase cinquentão Dinamite
Os primeiros fios de cabelo branco surgiram cedo, aos 19 anos, para se transformar hoje na assumida cabeleira, em uma prova evidente de que o tempo passou. Nos 50 anos que Roberto Dinamite completa na terça-feira está contada parte da história de um dos maiores atacantes do futebol brasileiro, ídolo maior do Vasco, mas com uma biografia que não teve o tamanho do artilheiro que foi, da grandiosidade que sua vitoriosa carreira fez por merecer.
Roberto foi o maior artilheiro de Campeonatos Brasileiros (190 gols); o quarto do mundo em competições nacionais, segundo levantamento da Federação Internacional de História e Estatística do Futebol (470 gols); maior artilheiro da história do Vasco (708 gols) – ainda assim, teve seu talento de fazedor de gols reduzido a um centroavante do tipo trombador.
– Acho que isso aconteceu em parte porque na Seleção Brasileira não consegui o mesmo sucesso do Vasco. Para as duas Copas que fui convocado, nunca fui a primeira opção – conta.
A história repleta de gols de Roberto Dinamite começou a ser escrita em confrontos com o maior rival, o Flamengo – e no duelo pessoal com a geração de Zico –, contra quem o Vasco decide hoje mais um Campeonato Carioca. Roberto chega a abrir o sorriso característico quando diz que o Flamengo é um adversário especial, desde quando o enfrentava em jogos inesquecíveis, e até hoje – vestido com a camisa de torcedor, ele estará mais uma vez no Maracanã.
– Acho que o Vasco está mais determinado para ser campeão. Só não pode deixar o Felipe livre. Tem de marcar ele!
Roberto é assim, vascaíno fanático. Daí o grande desalento de ter sido rejeitado por gente do próprio clube; se ver hostilizado em casa, em São Januário, pelas mesmas pessoas que um dia vibraram com seus gols, choraram com ele, o cobriram de abraços e agradecimento – tudo porque “ousou”, como define com suas próprias palavras, desafiar o poder de Eurico Miranda para se candidatar à presidência do Vasco.
Esse é capítulo menor na vida de Roberto – no Vasco de suas lembranças contam de verdade os momentos felizes que viveu no clube onde jogou durante 20 anos. Roberto abriu o coração na entrevista ao Jornal do Brasil para falar desse tempo, da infância atormentada por doença que quase o impede de jogar futebol, da falecida primeira mulher, Jurema, dos gols, da vida.
Você chega aos 50 anos assumindo os cabelos brancos. Por que os pintava antes?
- Puxei a minha mãe. Com 19 anos os primeiros fios brancos começaram a aparecer. Então, muito novo fiquei com o cabelo todo branco. Depois, minha mulher gostou e eu assumi.
Você teve um problema sério de doença na infância. Chegou a duvidar que seria jogador de futebol?
- Fui uma criança muito magra. Até a adolescência, pesava 50 quilos. Não comia direito, estava sempre com mal-estar. Aos sete anos, tive osteomielite (inflamação no osso) na perna esquerda, fui operado, fiquei três meses imobilizado na cama, as duas pernas engessadas para não me mexer. Aos 11 anos, levei uma bolada do meu irmão, Quinha, que tinha uma pancada forte, aí tive novo problema no osso. Já fazia meus gols pelo São Bento, um time de Duque de Caxias, mas chegaram a dizer que somente um milagre faria com que eu fosse jogador. O gozado é que todos os problemas de contusão que tive na carreira foram na perna esquerda.
Mesmo assim sua mãe, Neuza, o estimulava, deu força para seguir na carreira?
- Minha mãe, que já morreu, era fanática por futebol, torcedora do Vasco. Casou com meu pai, Maia, que era goleiro, porque ficava atrás do gol dele, torcendo contra, já que ele jogava por um time adversário. Ela sempre me deu força, só ficou preocupada depois do segundo problema que tive na perna. Da nossa casa, que ficava na beira do campo do São Bento, dava para ver metade do campo. Eu entrava no segundo tempo, quando meu time atacava para o lado que não dava para ela ver.
Como foi o início da sua carreira?
- Aos 13 anos, um amigo, Gradim, me levou para treinar no Vasco. Fiquei meses pegando duas conduções de Caxias até São Januário, não tinha dinheiro nem para o lanche. Na minha estréia no infantil, marquei quatro gols e fui aprovado. Fui campeão no juvenil e meu primeiro jogo marcante nos profissionais foi contra Internacional, no Maracanã, entrando no segundo tempo. Fiz um gol e ganhei o apelido de Dinamite, dado pelo jornalista Aparício Pires, do Jornal dos Sports.
O Flamengo sempre foi o grande rival, o time responsável pelas maiores alegrias e também pelos momentos tristes na sua carreira. Como começou esse duelo?
- Foi nos juvenis, contra aquele time da geração do Zico, Geraldo, Cantareli. Fui campeão em 71, mas no ano seguinte perdi a primeira decisão para o Flamengo, numa melhor-de-três. O Vasco venceu o primeiro jogo em São Januário, perdemos o segundo, na Gávea, e a negra, no Maracanã.
Quais são as suas melhores lembranças em jogos contra o Flamengo?
- As duas decisões que vencemos nos pênaltis, na Taça Guanabara de 76 e na decisão do Carioca de 77. Outros grandes jogos foram os dois primeiros da decisão de 81: no primeiro, marquei o gol da vitória aos 43 minutos, quando a torcida do Flamengo já comemorava o título; no segundo, marquei os dois da vitória por 2 a 0, mas perdemos o título no terceiro jogo, aquele que o ladrilheiro invadiu o campo, por 2 a 1. (Roberto fez 27 gols pelo Vasco no Flamengo; 43 no Fluminense, 30 no América e 28 no Botafogo).
Você quase vestiu a camisa do Flamengo. Como foram as negociações do Flamengo em 1980, que acabaram trazendo-o de volta ao Vasco?
- O Márcio Braga, que era presidente do Flamengo, me procurou em Barcelona. Cheguei a acertar um pré-contrato. Antes, telefonei para o Vasco, duas vezes, avisando do interesse do Flamengo, responderam que eu não interessava mais. Mas aí começou a pressão da torcida do Vasco e não teve jeito. Também, para o Barcelona, que devia ainda parcelas da compra do meu passe, era mais fácil negociar com o Vasco.
A Rádio Globo chegou a montar a narração de um gol seu pelo Flamengo, na voz do Jorge Cúri. Você se imaginava fazendo gol no Vasco vestindo a camisa do Flamengo?
- Nunca escutei essa gravação. Mas soube que isso fez a torcida do Vasco começar a reagir. Sinceramente, nunca me imaginei sequer vestindo a camisa do Flamengo, quanto mais fazer gol no Vasco. Acho que o único jeito de eu vestir a camisa do Flamengo seria no jogo de despedida do Zico.
Por que você não deu certo no Barcelona?
- Cheguei no meio da temporada, o time não estava bem e o técnico, Helenio Herrera, não gostava de mim. Teve um dia que me tirou do time momentos antes de um jogo.
Você jogou na Portuguesa de Desportos e no Campo Grande. Isso não diminuiu a sua biografia?
- Na Portuguesa, não acho. Fui para lá porque o Zagallo não me quis no Vasco, alegou que precisava de um atacante mais rápido para disputar a Libertadores da América, em 90, preferiu um jogador chamado Anderson. No Campo Grande, sim, acho que não foi uma boa escolha. Mas eu precisava provar para as pessoas que ainda podia jogar futebol.
Por que muitos teimavam em dizer que você era apenas um centroavante do tipo trombador, negando-lhe as virtudes técnicas?
- Tive dois momentos na carreira. No início, como o Vasco jogava sempre com dois pontas abertos, eu ficava mais fixo na área e marcava muitos gols. Depois, no início dos anos 80, o Oto Glória pediu para eu voltar um pouco mais, fugir da área. Descobri então outra característica, tinha técnica também.
Qual a importância da sua primeira mulher, Jurema, na sua carreira? É verdade que ela é quem resolvia tudo na renovação dos contratos?
- Vou aproveitar para esclarecer essa história. Como a Jurema era mais velha do que eu, além de ser viúva, as pessoas tinham preconceito, achavam que ela queria se aproveitar. Por causa disso, ela tinha necessidade de procurar o melhor nas conversas com os diretores do Vasco, lutava até o fim para conseguir um bom contrato. Eu sabia que ela precisava agir daquele jeito, era importante para ela. Mas era tudo resolvido por nós dois. (Roberto foi casado com Jurema durante 11 anos, com quem teve dois filhos, Luciana, 30 anos, e Tatiana, 28. Hoje, é casado com Liliane, que lhe deu também dois filhos, Roberta, 15, e Rodrigo, 11)
Às vésperas dos 50 anos, fazendo um retrospectiva, o que ficou de mais marcante?
- Tive algumas decepções, como o dia em que fui obrigado a me retirar da tribuna de São Januário, e no dia da eleição, quando muitas pessoas que um dia me abraçavam estavam ali me hostilizando. Mas os momentos de alegria foram muito mais marcantes. Posso resumir numa imagem: por tudo que fiz em campo, hoje faço parte da grande história do Vasco.
Fonte: Jornal do Brasil
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