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Ex-karateca do Vasco Fernanda Monturil fala de passagem pelo clube


Sexta-feira, 18/06/2010 - 11:20

Linda, simpática, faixa preta de karatê, consultora de marketing esportivo e vascaína. Seguindo suas próprias palavras, uma mistura de 'A Bela e a Fera'. Em entrevista exclusiva ao SempreVasco.com, Fernanda Monturil, ex-atleta do clube, declara o seu amor pelo Vasco e revela, pela primeira vez, detalhes da conturbada e polêmica saída da equipe de karatê. Clique aqui e confira.

SempreVasco - Como surgiu o convite para você integrar a equipe de karatê do Vasco? Qual foi o período que você competiu como atleta do Vasco?

Fernanda Monturil - Primeiramente no ano de 1998, quando ainda existia o projeto olímpico do Vasco e fui convidada pelo coordenador-técnico Luis Otávio Lacombe. E depois, definitivamente em 2005, convidada pelo técnico da equipe do Vasco e da FKERJ, Manoel Varella. Fiquei fazendo parte da equipe até 2009, quando a mesma foi extinta.

SempreVasco - Como era a estrutura disponibilizada pelo Vasco para receber e acolher seus atletas?

Fernanda Monturil - Na época do projeto olímpico, havia bem mais investimentos tanto no treinamento como em viagens. Quando voltei a integrar a equipe em 2005, tinha o objetivo de fortalecer e divulgar esta equipe campeã. Mesmo sem muito investimento, conseguimos conquistar espaço na mídia e obter excelentes resultados, como no Pan Rio 2007. Em que 03 dos atletas masculinos do Vasco conquistaram medalhas: 01 bronze [Vinícius Souza], 01 prata [Carlos Lourenço] e 01 ouro [Juarez Silva].

SempreVasco - Como era a relação dos karatecas com o Manoel Varella?

Fernanda Monturil - Ele é humano, pai, amigo, irmão, uma verdadeira figura! É conhecido como "O Kara" do karatê. Ele acreditou e treinou o Caio Duprat, Vínicius e Carlos desde a infância. Muitas vezes custeando diretamente as despesas deles. Negociou, arrumou patrocínios e mesmo sem as condições necessárias, elevou e manteve o Vasco da Gama e o karatê do Rio de Janeiro como o melhor do Brasil.

SempreVasco - O Vasco reinava absoluto no karatê no Rio de Janeiro e também a nível nacional até o encerramento da modalidade esse ano pela atual diretoria. Como você viu essa medida do presidente Roberto Dinamite?

Fernanda Monturil - Fiquei chateada, afinal havíamos acertado que eu faria projeto de lutas para o Vasco, por meio da Lei de Incentivo ao Esporte, na qual sou especialista. O presidente Roberto Dinamite alegou que precisava diminuir custos e focar no futebol. Contudo, a situação se complicou e perdeu o rendimento também em outras modalidades campeãs, como no caso, o karatê - modalidade mais vitoriosa do Vasco no Pan Rio 2007. Mantiveram apenas o remo e outras modalidades olímpicas. Não vou julgar nem condenar o nosso presidente, que acatou a decisão do Sr. Monteiro [José Pinto, vice-presidente dos esportes olímpicos e responsabilidade social], em extinguir algumas modalidades esportivas.

SempreVasco - Você mencionou 'cortar custos'. Você tinha noção de quanto custava a modalidade do karatê para o clube?

Fernanda Monturil - Praticamente nada. Na gestão antiga, ainda conseguíamos passagens, hospedagens. Enfim, custear algumas viagens do calendário internacional oficial. Sobretudo, todo o clube, e em especial a presidência, nos davam a devida importância e consideração. Cheguei a negociar minha contratação para efetivar o projeto de lutas pela Lei de Incentivo ao Esporte, diretamente com o presidente e o Monteiro, que é o maior responsável pela saída de algumas modalidades esportivas do clube. O Monteiro, apesar de eu conversar constantemente com ele a respeito dessa contratação, em nenhum momento expôs sua vontade de extinguir a prática do karatê do Vasco. Cheguei a procurar o presidente para falar a respeito, contudo ele não se envolveu muito, preferindo envidar esforços no futebol. Pena, pois eu tinha plenas condições de atuar neste sentido, aprovando inclusive o Projeto de Remo, pela Lei de Incentivo ao Esporte, que o clube vem tentando chancelar sem sucesso. Gostaria muito de poder ajudar, pois o Vasco me conquistou. Antes de ser atleta do Vasco da Gama, não torcia para nenhum time. E de repente, me deparei com um amor genuíno, nascido em pleno São Januário, encantada pelos benefícios oferecidos pelo CRVG às comunidades de baixa renda e em risco social. Fora isto, é uma das histórias mais bonitas dos tradicionais clubes de futebol, como ser o primeiro time a aceitar negros entre seus jogadores.

SempreVasco - Em entrevista ao SEMPREVASCO.COM, em abril deste ano, o vice-presidente José Pinto Monteiro deu a versão do clube sobre o término da modalidade do karatê. O departamento de karatê realmente negligenciou a vice-presidência de esportes olímpicos? As taças conquistadas não foram para a sala de troféus do clube?

Fernanda Monturil - Sim, foram. Todos os troféus da equipe, as medalhas são individuais. A relação com a antiga gestão era realmente menos informal, houve uma drástica mudança de mentalidade. Neste caso, caberia à atual diretoria enviar memorando sobre as novas normas e critérios. Porque ele não pediu para mim este planejamento? Já que eu estava em contato direto com ele, e era diretamente responsável pelo projeto de lutas. Ainda no final de 2008, o Varella me encaminhou uma previsão de custos, bem organizado. Precisaria fazer uma melhorias, mas tenho certeza do que ele apresentou foi melhor e mais profissional do que a maioria das modalidades do clube. Contamos com o apoio de uma agência de comunicação que tem feito bons trabalhos neste sentido, inclusive desenvolvendo mascote do Vasco para a modalidade. Aliás, quanto aos meus serviços, que seriam contratados, ele não foi profissional, dificultou toda a negociação, na qual era responsável, especialmente por possuir uma empresa de projetos, e ter interesse em desenvolver diretamente os mesmos, via Lei de Incentivo ao Esporte. Esta é a verdade nua e crua. Este discurso dele é falso, e visa apenas justificar uma injustiça e decisão equivocada. Como a minha vontade de ajudar o meu clube do coração é maior do que criar dificuldades, não me pronunciei publicamente a respeito até o momento.

SempreVasco - Tradicionalmente os clubes de massa pouco se propuseram a investir no karatê. Você acredita que o apoio desses clubes ao esporte seria benéfico ou poderia prejudicar?

Fernanda Monturil - Enxergo apenas benefícios, pois trata-se de pouco investimento - modalidade relativamente barata - com grande possibilidade de retorno. Especialmente em resultados. Temos vários talentos desperdiçados país afora. O problema é a má gestão dos clubes de futebol no Brasil. Quando deveria haver lucro, simplesmente vivem atolados em dívidas e contentas jurídicas, principalmente os clubes cariocas. Este bom investimento foi comprovado com o apoio do Vasco. A equipe de karatê se desenvolveu bastante, firmando sua superioridade, alcançando assim excelentes resultados e visibilidade positiva ao clube.

SempreVasco - Como você analisa a atuação do governo em relação às modalidades esportivas, principalmente o karatê?

Fernanda Monturil - Gostaria que os dirigentes esportivos e políticos do país trabalhassem no sentido de fazer do esporte uma profissão reconhecida. É triste atestar e vivenciar toda uma carreira dedicada ao treinamento esportivo de rendimento, simplesmente por amor, já que não se tem o devido reconhecimento financeiro nem profissional. Sendo que a maioria dos atletas encerram suas trajetórias cheios de lesões, sobretudo tendo que iniciar uma outra profissão. Muitos não tiveram como conciliar os estudos com o esporte. Portanto, a dificuldade em se ingressar no mercado de trabalho, ainda é maior. Os atletas no Brasil são heróis solitários. Apesar de fazerem o espetáculo, não conseguem viver dignamente no ramo que escolheram como profissão. Veja o exemplo da Copa do Mundo de 1970. Em que situação ficaram os jogadores? A Jade [Barbosa] da ginástica, vendendo camisetas para angariar recursos... o César Cielo evoluiu somente com o suporte da família, o "pai trocínio". Hoje, a minha luta também é neste sentido! Apesar de eu estar muito restrita à Lei de Incentivo ao Esporte.

SempreVasco - Diga-nos o que representou a sua passagem pelo Vasco na sua carreira.

Fernanda Monturil - Representou bastante, como a disponibilidade de uma estrutura profissional para nos acolher, um nome forte, uma família. O Vasco era nossa segunda casa. O karatê de uma forma geral, perdeu muito, pois era representado por um dos clubes de ponta do país. Sobretudo o próprio Vasco, cujo escudo divulgávamos e carregávamos no peito com amor e orgulho tanto no Brasil como no exterior.

SempreVasco - Você me disse que após a sua passagem pelo clube tornou-se uma apaixonada torcedora do Vasco. Você acompanha o futebol vascaíno?

Fernanda Monturil - Constantemente, e ando bastante triste ultimamente. Também assisti, no Maracanã, a final da Taça Guanabara 2010, junto ao Fernandão, responsável pelo patrocínio da Eletrobrás. Antigamente, eu achava que o futebol tirava o investimento em outras modalidades esportivas; hoje, estou certa que se não fosse nossa cultura futebolística, estaríamos ainda mais atrasados. O descaso com o esporte no Brasil é enorme. Ou seja, o futebol impulsiona o nosso esporte.

SempreVasco - De qual título você mais se orgulha? E qual foi o mais difícil?

Fernanda Monturil - Eu me orgulho de ter conquistado o sétimo lugar no Mundial Universitário, quando ainda era faixa verde, disputando com os melhores atletas do mundo. Da conquista do Bi-Campeonato Brasileiro Universitário 1998 e 1999. Do meu primeiro título Sul-Americano também em 1999. Ao todo, foram 07, 08 Brasileiros. E também da minha primeira participação em Panamericanos, em 2001, quando o Brasil não conquistou quase nenhuma medalha, eu fiquei em 4º Lugar na minha estréia, justamente na categoria Open (Absoluto), tida como a mais difícil. Com o agravante de que lutei sozinha, sem técnico! Sobretudo me orgulho de ter conseguido me manter no esporte, apesar do karatê não oferecer condições para dedicação exclusiva. Considero todos esses resultados como Ouro, pois trabalhava, estudava, era dona de casa, minha empresária, além de não ter apoio terapêutico, nem familiar. Com o meu ingresso na Seleção Brasileira de karatê, a equipe feminina se tornou mais vaidosa, fato de que me orgulho também, apesar das adversidades que enfrentei. Na verdade, eu introduzi no karatê a necessidade de divulgação para conquista e manutenção do patrocínio esportivo. A importância de nos profissionalizarmos mais.

SempreVasco - Falando em vaiade, você sempre foi considerada a musa do Vasco e até mesmo do esporte nacional...

Fernanda Monturil - Isto mesmo! E também me orgulho disto. Ademais nas lutas, onde existe bastante preconceito. Foi um reconhecimento fantástico. Em contrapartida, procurava passar a melhor imagem possível, apesar de lutadora feminina. A bela e a fera! Mas sobretudo uma imagem de ética, respeito e lealdade, características intrínsecas às artes marciais. (Risos) Pena que a nova diretoria do clube não tenha valorizado nem a minha imagem, nem a equipe campeã do Vasco! Até hoje, tenho o reconhecimento e o carinho da mídia carioca. Sendo que as ações promocionais devem partir ou mesmo serem aceitas pelo clube e/ou patrocinador.

SempreVasco - Era possível fazer amizade com as karatecas nos torneios de karatê?

Fernanda Monturil - Olha, eu era uma das mais invejadas e portanto, muitas vezes excluída. (Risos) Minhas adversárias sempre gostaram de me atingir no rosto, especialmente na boca e olhos. O ciúme e a inveja foi possivelmente porque eu quebrei alguns paradigmas, em especial quanto à visibilidade e patrocínios. Era bastante complicado pra mim atuar sozinha no meio, especialmente muito masculino. E com alguns vícios negativos. Sempre fui uma personalidade polêmica, principalmente por ser muito autêntica e determinada.

SempreVasco - Quem são seus ídolos no karatê?

Fernanda Monturil - Maximiliano Pagano (SP), Maria Cecília Maia (Ciça/RJ), Juarez Silva (RJ) e Lyoto Machida (UFC/MMA). Internacionais: Alex Biamonti (FRA), Stephano Maniscalco (ITA), Laurence Fisher (FRA) e Nathalie Leroy (FRA).

SempreVasco – Diga-nos informações sobre você. Qual estilo você pratica? Qual a sua categoria?

Fernanda Monturil - Meu estilo é o Shotokan, o mesmo do Machida karatê. Sou discípula do Machida Sensei, pai do Lyoto. Iniciei em 1998 na categoria Acima de 60 kg. Em 2000, mudei para o peso médio (abaixo de 60 kg). Contudo, sempre fui escolhida para disputar o Open (Absoluto), em que não há categoria de peso, categoria onde disputam os melhores lutadores/karatecas. Cheguei a disputar o Open no Japão em 2004 com 93 outras lutadoras, e fiquei em 9º Lugar.

SempreVasco – E o que a motivou a começar a praticar karatê?

Fernanda Monturil - Foi depois que o meu pai desapareceu em fevereiro de 1996. Iniciei o karatê em maio do mesmo ano, dedicando-me com afinco, já com 24 anos. Aos 26, eu já integrava a Seleção Brasileira, mesmo sendo faixa colorida, por mérito. Sagrei-me Campeão Brasileira Universitária e Vice-Campeã Brasileira, disputando a final com a Ciça. Tinha talento, até então adormecido. Coloquei praticamente todas as minhas forças na busca e prática desta arte. Eu, uma exceção, considerando que a grande parte dos praticantes não chega a conquistar este lugar na alta performance. A maioria pratica desde criança... por uma fatalidade, descobri o Caminho que mudou completamente a minha vida, minha profissão.

SempreVasco - Comente um pouco sobre a sua rivalidade com a Ciça, uma rivalidade 100% vascaína...

Fernanda Monturil - No início, éramos rivais. Depois, nos tornamos grandes companheiras de equipe. Respeito muito a Ciça, que tem uma história de vida fantástica, além de ter conquistado os títulos mais importantes pro país nesta modalidade. Quando ingressei na equipe do Vasco, subi de categoria, assim não precisaríamos disputar internamente. Ao contrário, aumentávamos as chances de medalhas.

SempreVasco – Quais são os seus projetos atuais e para o futuro? Você ainda participa de algumas competições?

Fernanda Monturil - Eu digo, que estou fortalecendo meu espírito! Buscando a essência do karatê. Estou focada na genuína doutrina das artes marciais e tudo o que ela nos oferece. Atualmente, estou afastada das competições por estar tratando sérias lesões de coluna, no entanto participando de clínicas de karatê e desenvolvendo mais a luta imaginária – kata. Sempre tive o objetivo de competir no Máster de Kata, com a finalidade única de confratenizar e colocar meu aprendizado em prática. E não visando glória e/ou retorno financeiro. Se vier, que seja como consequência de uma vida dedicada ao estudo da arte e sua árdua prática. Estou neste caminho, me aprimorando e fortalecendo, para que eu possa resurgir com nova roupagem. (Risos) Como as borboletas. Afinal, somos como as estações do ano. Até os ursos hibernam no inverno, caso contrário, quando a primavera chegar, estariam cansados demais pra aproveitar. Karatê-Dô - Caminho das Mãos Vazias; Dô – Caminho; Dojô - Lugar do Caminho; Caminho: Retidão, busca do aprimoramento espiritual.

SempreVasco – O Vasco em uma palavra.

Fernanda Monturil – Sentimento.

SempreVasco – Deixe uma mensagem final para os fãs de karatê e também os seus fãs que acompanham o SempreVasco.com.

Fernanda Monturil – Que acima de tudo, busquem a evolução com a prática esportiva, e não busquem apenas conquistas efêmeras, pois isto logo passa. Restam os ensinamentos, os verdadeiros amigos que fizemos, e o exemplo que deixamos. Cada um de nós escreve uma parte da história desta modalidade esportiva, por isto é essencial ter consciência e responsabilidade.


Ex-karateca do Vasco Fernanda Monturil


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Fonte: Sempre Vasco (texto), Reprodução internet (fotos)



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