Assista à íntegra de Palmeiras 3 x 4 Vasco, final da Copa Mercosul de 2000
Quinta-feira, 16/04/2020 - 14:35
A verdade é infantil

Num botequim de esquina tijucana, em plena madrugada, um menino de não mais do que três anos acenava duas bandeirolas cruzmaltinas com um sorriso no rosto, olhando para mim. Do outro lado do boteco, uma menina, que não aparentava ter mais de 5 anos, vestia uma camisa vascaína que lhe caía até os pés, compondo um cenário ao mesmo tempo terno e cômico. E eu ali, com um chopp na mão, cantando Casaca e vendo a verdade saracotear por ali, dando berros para os que deixaram de acreditar ou para aqueles que nunca entenderam o significado da grandeza do Vasco.

Aquelas crianças e outras tantas não sabem, não compreendem e, provavelmente, acham muito chato o papo de liminares, recursos, manobras políticas, críticas da imprensa e outras picuinhas menores. Elas apenas sorriem com um gol de Romário, cantarolam musiquinhas, esperneiam com gols dos adversários, adoram jogar papel picado na cabeça de adultos sérios e têm como passatempo predileto tremular bandeiras. Gostam de futebol da forma mais pura. Uma forma que desconhece desmandos, falcatruas, silêncios seculares tipográficos e só entende o gol. Nada mais do que o gol.

A verdade é infantil. Está lá, estatelada para quem quiser olhar. Uma verdade que desbota as tintas de tantos que pintaram o quadro final da trupe vascaína. Tantos pintaram e continuarão pintando, pois não sabem o que é a felicidade infantil de ver um Juninho Paulista correndo a 100 km por hora, extravasando, gritando palavrões, para comemorar um gol. Não sabem o que é a alegria de um menino como Jorginho Paulista comemorando no gramado do Parque Antarctica. Desconhecem os figurantes Gato, Severino, Santana e artesãos dos bastidores que dão suor pelo clube há dezenas de anos. São tolos em pensar que o Vasco se refestela em vilanias, é o mais odiado pelas torcidas adversárias e outras bobagens do mesmo quilate. As crianças podem responder o quanto vale uma defesa de Hélton, uma magia de um Juninho, dois Juninhos, um toque errado genial de Romário e um bom sorriso do velho Mauro Galvão. Descobrirão uma fenomenal fonte de verdade. Se as crianças aí estão não há com o que se preocupar, elas mostrarão no futuro a grandeza desse clube tão apedrejado e escorraçado.

As pedras foram jogadas e tal como craques, os jogadores fizeram embaixadinha com elas, viraram um jogo rodrigueano e compensaram dores por tanto tempo acumuladas. Os vascaínos choravam perdas duras, inestimáveis e só um feito como o de 20 de dezembro de 2000 faz deitar em berço esplêndido todo um arsenal de depressões, culpas, angústias e neuroses acariciadas por todo um ano. Uma virada de amor, como diz o cântico, que aplaca todas as feridas de uma só vez e acalma corações baleados que manquitolavam por aí sem rumo. Uma vitória como nunca houve, nunca ouvi, nunca vi.

Rafael Moreira Fabro



Fonte: Youtube Casaca