Para a CBF, Werley estava cerca de 20 cm à frente de zagueiro corintiano em gol anulado pelo VAR
Quarta-feira, 09/10/2019 - 13:56
Você sabe o que é paralaxe? Esse termo dos universos da física e da astronomia foi introduzido no vocabulário da arbitragem com a chegada do VAR, principalmente quando o assunto é marcação de impedimento.

— É para que entendêssemos que nem sempre a visão a olho nu corresponde à realidade — disse o árbitro Ricardo Marques Ribeiro (Fifa-MG), referindo-se ao que ouviu nos treinamentos.

Em suma, paralaxe é o aparente deslocamento de um objeto quando é visto por dois observadores em lugares distintos. Ou seja, a impressão dada pela TV pode não ser o que aconteceu, de fato, no campo.

Pensando em lances milimétricos, uma ferramenta tecnológica é responsável por compensar a diferença de perspectiva e balizar a decisão do apito. O grande diferencial em relação ao velho tira-teima é a possibilidade de traçar linhas verticais, estabelecendo no chão a real posição do jogador. Tudo para dizer se há impedimento ou não e justificar o investimento de R$ 50 mil por jogo no árbitro de vídeo.

A dúvida mais recente foi referente ao gol de Bruno Henrique, do Flamengo, na vitória de domingo sobre a Chapecoense. A olho nu, não dava para tirar conclusões, mas entre linhas azuis e vermelhas, o software "azulou". Ou seja, não havia impedimento.

Pelo uso do sistema, o Vasco teve anulado um gol contra o Corinthians, no sábado, e reclamou. Na ocasião, prevaleceu o vermelho: o atacante estava à frente. O árbitro de campo, aliás, era Ricardo Marques Ribeiro.

Para a CBF, não há o que se questionar. Presidente da comissão de arbitragem, Leonardo Gaciba assegura que a tecnologia, neste ponto, "é 100% precisa".

Produto inglês

A ferramenta foi desenvolvida pela empresa que presta o serviço de VAR no Brasil, a inglesa Hawk-Eye. A companhia é parceira da Fifa na Copa do Mundo e também presta serviço à Conmebol na Libertadores. No Carioca, o software do impedimento ainda não estava tão "azeitado" quanto no Brasileirão.

— Eles sincronizam as câmeras e fazem a calibração das linhas. Aí você tem as linhas horizontais ajustadas ao campo. Quando tem uma inclinação de um jogador, usam as linhas verticais — explica Sérgio Corrêa, líder do projeto VAR no Brasil.

Os árbitros foram treinados para entender melhor tanto a paralaxe quanto os princípios que norteiam o funcionamento do software. Seja no campo ou na cabine, há confiança nos resultados da ferramenta.

— Tenho o mesmo pensamento que o Gaciba. A ferramenta é 100% confiável, já foi testada várias vezes. É o que tem de mais moderno em tecnologia para traçar as linhas de impedimento. É algo novo para todos. Às vezes há uma dificuldade natural por ser algo que não estávamos acostumados a trabalhar — comentou Ricardo Marques Ribeiro.

Braço não conta

Leonardo Gaciba tem feito um ciclo de palestras nos clubes para explicar o funcionamento do VAR em geral. O software faz parte disso. O questionamento do Vasco após o jogo contra o Corinthians diz respeito à demarcação do ponto de referência no jogador que fez o gol (o zagueiro Werley).

O técnico Vanderlei Luxemburgo reclamou porque, segundo ele, a linha para medição passava sobre o braço de Werley. E essa parte do corpo não pode ser considerada para fins de impedimento, já que não se pode fazer gol com ela.

Só que Luxemburgo, aparentemente, foi traído pela paralaxe. E pelas nuances do VAR. Segundo as contas da CBF, há cerca de 20 cm de diferença entre Werley e o penúltimo defensor do Corinthians, o zagueiro Manoel.

Quanto à marcação da referência no jogador, a responsabilidade final de indicar o local exato não é do operador do sistema.

— A gente conhece as linhas. O operador obedece aos comandos do VAR. Ele não sugere nenhuma situação. É o árbitro de vídeo quem pede "para a esquerda" ou "para a direita" — explica Ricardo Marques.

Entre os problemas do VAR, uma questão a ser resolvida é o tempo que se gasta nas checagens de impedimento por causa do uso do software. Mas a aposta da arbitragem é que a engrenagem funcionará melhor no futuro.

ENTENDA O TIRA-TEIMA DO VAR

Como a arbitragem verifica se há impedimento

CORINTHIANS X VASCO

Após cruzamento de Danilo Barcelos, o zagueiro Werley, do Vasco, é flagrado um pouco à frente do penúltimo defensor do Corinthians, o zagueiro Manoel.

O gol foi anulado – seria o 1 a 0 na Arena Corinthians. Na checagem do VAR, usando a medição do software, viu-se que o jogador vascaíno estava adiantado.

O programa da Hawk-Eye, empresa inglesa que presta o serviço do VAR no Brasil, mede a posição do atacante em relação ao penúltimo defensor.

Para o atacante, é atribuída uma linha vermelha. Para o defensor, azul

Nos casos em que há uma projeção do corpo – para frente ou para trás – o programa é capaz de traçar uma linha para apontar a posição vertical dos jogadores.

A linha amarela marca a posição do pé do penúltimo defensor

A linha vertical vermelha usa o ponto mais adiantado de Werley (neste caso, o ombro). Projeta a referência no solo. Na comparação com o pé de Manoel, verifica-se o impedimento



Fonte: O Globo Online