Alexandre Gallo lembra quando jogadores do Botafogo com conjuntivite assustaram vascaínos em 1999

Domingo, 19/02/2017 - 18:37
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Hoje treinador, Alexandre Gallo foi um volante com passagens por grandes clubes entre 1986, quando iniciou a carreira no Botafogo-SP, até 2001, quando pendurou as chuteiras pelo Corinthians. Nessas quase duas décadas como jogador, atuou ao lado de muitos craques, marcou alguns dos maiores nomes dos anos 90 e viveu grandes histórias.

Uma de suas favoritas aconteceu em 1999, quando ele estava atuando pelo Botafogo. Antes de um clássico contra o forte Vasco de Carlos Germano, Mauro Galvão, Donizete Pantera, Juninho Pernambucano e outros craques, Gallo e outros seis colegas pegaram conjuntivite, mas resolveram ir a campo mesmo assim.

Contra o poderoso ataque rival, acabaram usando a doença infecciosa a seu favor.

"Estávamos fazendo marcação individual no time deles e começamos a passar a mão nos olhos e passar na cara deles. Daí eles ficaram morrendo de medo de pegar conjuntivite e amoleceram na partida (risos)", conta o ex-jogador, em entrevista ao ESPN.com.br.

"Foi um subterfúgio, a gente nem podia mais transmitir (a doença), mas eles ficaram com muito medo (risos). Aí ficou mais fácil fazer a marcação", brinca.

Apesar da rixa entre os times, a história bizarra acabou em gargalhadas no meio dos boleiros.

"No segundo semestre de 1999, eu fui trocado pelo Botafogo com o Valdir Bigode e fui para o Atlético-MG. Pouco depois, o Atlético contratou também o (atacante) Guilherme, que jogou pelo Vasco no jogo da conjuntivite. Nós ficamos muito amigos e cansamos de dar risada da história desse jogo (risos)", diverte-se Gallo.

Pela equipe de Belo Horizonte, o volante conquistou dois Mineiros: 1999 e 2000.

O filho do príncipe

Um dos times que Gallo defendeu por mais tempo foi o Santos, que o contratou em 1992 do Vitória. Ele vestiu a camisa alvinegra até 1999, vivendo grandes momentos, como a campanha do vice do Brasileirão de 1995, perdendo a final para o Botafogo.

"Nesse Brasileirão, vencemos aquele timaço do Palmeiras por 1 a 0, gol do Vágner, e foi um dos jogos mais difíceis da minha carreira, pois o time deles tinha muitos craques: Cafu, Antônio Carlos, Rivaldo, Edílson, Muller... Era uma equipe muito melhor do que a nossa, mas aquela vitória sobre eles nos deu um impulso muito grande na reta final", lembra.

A goleada sobre o Fluminense na semifinal também ficará para sempre na memória.

"Aquele 5 a 2 em plena semifinal, depois de ter perdido por 4 a 1 na ida, foi o jogo mais emocionante da minha carreira, e também um dos mais incríveis da história do Santos. Todos os torcedores que viveram nunca irão esquecer, assim como nós, que jogamos naquele dia. São coisas que não acontecem sempre, por isso é tão especial", emociona-se.

Nessa época, Gallo tremia só de pensar em marcar o garoto Denner, da Portuguesa.

"Ele foi o mais difícil que marquei na carreira. Era completamente imprevisível, genial. A velocidade dele era absurda, saía para os dois lados e finalizava bem com a direita e a esquerda. Mesmo sendo baixinho, ele não tinha medo de nada e ia pra cima. Eu marquei vários craques, como Rivaldo, Edílson, Neto, Marcelinho, mas o Denner foi o mais complicado", relembra o ex-jogador.

Pelo "Peixe", o ex-volante também viveu diversos momentos cômicos, principalmente ao lado do ex-goleiro Edinho, filho de Pelé, que jogou um longo período pelo Santos.

"Uma vez estávamos jogando em Limeira contra o Corinthians. O alambrado era muito perto do gol, e eu marcava sempre a bola no primeiro pau. Aí tinha um bêbado que ficava toda hora gritando pra provocar o Edinho: 'Filho do príncipe, ô filho do príncipe, olha pra mim!'. Depois de uns quatro escanteios, o Edinho já não aguentava mais (risos)", relata.

"Aí ele virou puto pra trás e falou: 'É filho do Rei!'. Todo mundo caiu na risada, até os caras do Corinthians (risos). Ele quis ajudar o cara que estava totalmente embriagado! Imagina isso num clássico, todo mundo com a concentração lá em cima, aquela tensão, e de repente acontece isso (risos). É normal, às vezes um torcedor enche tanto o saco que mexe com a gente mesmo dentro de campo, já aconteceu comigo também", conta Gallo.

"Depois disso, é claro que o apelido do Edinho virou 'Filho do príncipe'", gargalha.

Campeão no São Paulo em cima do Corinthians

Em 1997, Gallo foi contratado pelo São Paulo, após passagens por Portuguesa e Guarani. No ano seguinte, viu um antigo amigo da base do Botafogo-SP chegar para reforçar a equipe do Morumbi: ninguém menos do que Raí, um dos maiores ídolos do time.

"Isso me marcou bastante. Fiz toda a base e subi para o profissional com o Raí no Botafogo de Ribeirão, fizemos muita amizade. Quando soubemos que ele viria para o São Paulo, foi uma bomba na época", recorda o ex-atleta.

Raí foi contratado antes da segunda partida da final do Campeonato Paulista de 1998. No mesmo dia em que pousou no Brasil, vindo do Paris Saint-Germain, fez um dos gols e ainda deu uma assistência na vitória por 3 a 1 sobre o "Timão", sendo campeão estadual. Naquele dia, ele entrou justamente na vaga de Gallo.

"Eu havia jogado bem durante todo o Paulistão, mas aí perdemos o primeiro jogo da final por 2 a 1 para o Corinthians. Nosso meio-campo era eu, Alexandre, Fabiano e Carlos Miguel. Na partida de volta, a gente sabia que ia precisar ser mais ofensivo pra vencer o campeonato. Por isso, o Raí entrou no meu lugar, de forma correta e coerente", explica.

"Ficamos com um time muito forte, e eu entrei no segundo tempo para 'fechar a casinha' quando a gente já tinha o resultado a nosso favor. A chegada do Raí deu uma energia positiva, pois ele chegou com tanta vontade de jogar que nos incendiou. Acho que o Corinthians não estava esperando por essa motivação extra", admite Gallo.

O ex-volante nega ter qualquer ressentimento por ter ido para a reserva nesse dia.

"Não fiquei chateado, pelo contrário! Todos, inclusive eu, queriam que ele jogasse. Eu já tinha esssa consciência de pensar no grupo antes de mim. Com o Raí, além do ganho técnico, a gente sabia que isso iria inflamar a torcida e mexer com a confiança do Corinthians", ressalta.

"Foi uma partida muito nervosa, mas em que o França jogou demais, fez dois gols e toda a diferença ao lado do Raí. A gente tinha certeza que iria ganhar. O mais importante foi que tudo deu certo no final. Esse título do Paulistão foi muito importante na minha carreira", cita Gallo, que foi para o Botafogo no ano seguinte.

De jogador a treinador

Gallo resolveu encerrar a carreira em 2001, no Corinthians, pouco após ser campeão paulista no mesmo ano pela equipe do Parque São Jorge, justamente em cima do Botafogo de Ribeirão que o revelou. Hoje, se diz satisfeito com sua passagem como atleta.

"Eu fiz o que tinha que fazer na carreira. Na minha posição, havia grandes jogadores nos anos 90, mas mesmo assim consegui me destacar. Entre 1995 e 1999, decidi três Campeonatos Brasileiros e quatro Estaduais, que naquela época eram muito fortes, além de uma final de Rio-São Paulo. Gostaria de ter vencido um Brasileirão como jogador, acho que merecia, mas infelizmente não deu. Joguei em clubes que não eram considerados favoritos nas finais, mas cheguei muito perto de ser campeão várias vezes", conta.

"Também joguei na seleção das Américas de 1995, ao lado de Romário, Palhinha e Jamelli, contra a seleção da Europa. Foi a única seleção que joguei além da seleção paulista. Tentei sempre fazer o melhor dentro das minhas condições, mas foi uma década de muitos craques. Claro que queria ter defendido a seleção, que é o sonho de todo jogador, mas parei de jogar com a consciência de que sempre fiz meu melhor em campo", discursa.

Logo após aposentar, começou a trabalhar como auxiliar-técnico de Carlos Alberto Parreira no próprio Corinthians, em 2002. Dois anos depois, começou a própria carreira de treinador, assumindo o comando do Villa Nova, de Minas Gerais.

"Desde quando ainda jogava eu vinha me preparando para virar técnico. Anotava técnicas de treinamento e comportamento dos treinadores em um caderno. Encerrei a carreira já sabendo o que queria fazer. Fui auxiliar de vários treinadores antes de começar minha própria carreira", salienta.

Ao longo dos anos, comandou grandes times, como Santos, Atlético-MG e Internacional, entre muitos outros, e conquistou títulos como o Pernambucano de 2007, pelo Sport, o Catarinense de 2008, pelo Figueirense, e a Recopa Sul-Americana de 2007, pelo Inter.

Atualmente, está sem clube, depois de passar por Ponte Preta e Náutico em 2016.

Títulos e frustração nas seleções brasileiras de base

Em 2013, Alexandre Gallo assumiu o comando das seleções brasileira de base. Ficou dois anos no cargo, conquistando duas vezes o Torneio de Toulon e uma vez o Torneio Internacional de Cotif, duas das mais tradicionais competições de futebol de base.

Seu maior orgulho desse período, porém, foi ter "resgatado" vários atletas de ponta que o Brasil poderia ter perdido.

"Meus anos na CBF foram muito produtivos, de muito aprendizado. Eu tentei fazer a profissionalização das seleções de base, e contratamos profissionais específicos para cada área. Fizemos um levantamento de todos os jogadores brasileiros de base que jogavam fora e poderíamos perder para outras seleções, como Rafinha Alcântara, Andreas Pereira e Felipe Gedoz, e os resgatamos", lembra Gallo.

"Visitei muitos clubes para mostrar o que queríamos dos atletas na seleção e mapeamos as principais competições do Brasil e fora. Foram muitas coisas boas nessa época. De 74 jogos, conquistamos 54 vitórias, empatamos 18 e perdemos só cinco partidas, além de conquistamos títulos importantes em categoria de base", comemora o treinador.

O desempenho ruim no Sul-Americano sub-20 de 2015, no qual o Brasil terminou na 4ª posição, porém, acabou lhe custando o cargo. Por isso, ele se diz "frustado" por ter perdido a oportunidade de comandar a seleção nos Jogos Olímpicos do Rio 2016.

"A seleção foi uma grande experiência para mim. Gostei muito de trabalhar com base, algo inédito para mim. Não tenho nenhum arrependimento desse tempo, mas admito que fiquei frustado por não ter podido finalizar meu trabalho na Olimpíada. Sabia que o time era muito bom e que as chances de ganhar o ouro eram boas", finaliza o técnico.

De fato, o Brasil ganhou a tão sonhada medalha, mas com Rogério Micale no comando.



Fonte: ESPN.com.br